Dependendo da sua idade, você pode conhecer Dirt como o jogo que ressuscitou a franquia Colin McRae, o jogo que finalmente encontrou um meio termo entre arcade e simulação, ou um jogo sem sal que tentou de tudo para ter uma identidade (DiRT 4). Pelo menos eu não posso reclamar de falta de identidade em DIRT 5 (Steam / PlayStation 4 / Xbox One). Aliás, ele tem identidade até demais, em detrimento de outros aspectos.
Esse tem sido o modus operandi da Codemasters desde o lançamento do “reboot” de GRID, na base do 8 ou 80. Ora você tem algo especial como o incrível tratamento da franquia F1, ora você tem Project Cars 3 e a tentativa de capitalizar em uma audiência cuja necessidade já está sendo sanada por outros jogos. E, por mais que eu tente, eu não consigo tirar da minha cabeça a ideia de que DIRT 5 segue o mesmo caminho.
Antes de mais nada vamos estabelecer um parâmetro: DIRT 5 não é um jogo de Rally, é um jogo onde você dirige carros em terrenos acidentados mas cujas origens já foram esquecidas faz tempo. É sobre festejar, celebrar o lamaçal que “pinta” os seus carros após uma corrida, ver fogos de artifício, ficar “impressionado” com os “novos visuais da próxima geração” e ouvir Nolan North e Troy Baker improvisarem um podcast e fazer piadas — algo que recomendo desligar assim que possível.
Eu até admiro o clima de festa, ainda mais que Codemasters não estabelece a terrível “narrativa” de que você é um super piloto e que todos te amam. Isto já corta grande parte dos terríveis diálogos presentes em The Crew 2, Forza Horizon 2, 3, e 4. A equipe prefere ser direta: “Ei, ganhe algumas partidas, chegue em primeiro lugar, fique em primeira posição, mas acima de tudo se divirta!”. O que é uma mensagem bem saudável, por assim dizer, para um gênero conhecido por sua competitividade dentro e fora da pista.
Entretanto, toda vez que eu começava uma corrida, uma pergunta vinha na minha cabeça: “Por que eu estou jogando DIRT 5 ao invés de Forza Horizon 4?”. Tudo bem, eu não sou um mega fã de jogos open world de corrida, mas na melhor das hipóteses DIRT 5 não é nada mais do que um recorte das corridas offroad que são oferecidas pelo jogo da PlayGround games.
Os fogos de artifício, o clima descontraído, o estilo de pilotagem bem arcade, tudo está lá, compartimentalizado em um pacote. A diferença chave é que Forza Horizon 4 — como outros jogos Offroad que saíram nos últimos tempos — traz algum elemento emergente ou outro para dar “sabor” às corridas. No caso de Forza Horizon 4 eram os desvios inesperados, as corridas que cruzavam uma longa estrada e acabavam na beira da praia. As pistas de DIRT 5 simplesmente…. Existem.
Em DIRT 5, a maioria dos eventos tenta se destacar pelo apelo visual das mudanças climáticas bruscas — um dos atrativos da sequência — mas boa sorte tentando diferenciar um evento do outro, já que a maioria se resume a circuitos fechados com diferentes tipos de carro.
Grécia, China, Brasil, não importa o país quando os layouts das pistas são tão desanimadores quanto os que vi em DIRT 5. Coloquem a nevasca que quiserem, escrevam atrás da caixa ou na página de destaque da loja digital sobre as 70 rotas diferentes; a pista oval na Noruega vai continuar a ser oval e a rota na Grécia só vai apresentar mais ou menos chuva.
“Mas se divirta!”, grita DIRT 5 mais uma vez para mim. Eu tento, eu juro que eu tento, mas eu não sou capaz de ver além da explosão de cores e da campanha produzida para reter o jogador pela maior quantidade de tempo. Patrocinadores, dezenas de carros que – salvo raras exceções como os Porsches e carros exóticos – parecem dirigir como carrinhos de bate-bate indiferentes ao clima, dezenas de pequenos objetivos para manter seus olhos grudados na tela. “Venha, fique no nosso jogo, gaste tempo nele, vai ser bom!”. Interpreto mais como um “venha aqui preencher essas barras que não têm nenhum sentido para você”.
Completava uma corrida de Land Rush, via minha pontuação pessoal subir, meus patrocinadores subirem, e liberei duas skins para carros. Quais carros? Não deu tempo de descobrir pois fui cortado pelo irritante podcast me alertando que “eu bati demais em outros carros durante a corrida”. Pelo amor, me deixe quieto por um minuto!
Você não precisa me fazer sentir o suprassumo da pilotagem, tampouco dizer que o festival foi feito para mim, mas ao menos me faça sentir parte dele? Por que se não, qual a razão de toda essa festa? Ficar vendo fogos de artifício?
Há uma estranha desconexão entre o que DIRT 5 quer ser, e o que ele de fato é. É como um prato montado com diversos ingredientes mas sem uma direção concreta. Seja esta direção reaquecer a marca, trazer um estilo diferencial, cores e diversão, no final o resultado é um arroz com feijão.
E veja bem, não há nada de errado em comer um bom prato de arroz com feijão de vez em quando. Eu tenho uma série de franquias — incluindo o reboot de GRID, cuja disposição em ir direto ao ponto no modo carreira foi algo que achei muito bom — que são exatamente isso, mas suas propostas condizem.
DIRT 5 não consegue condizer com nada, seja no seu estilo de pilotagem — assustadoramente amador —, na sua patética IA, ou em como ele lida com seu sistema de progressão. Ele tenta se abraçar a essas tendências de mercado sem se questionar a que ponto elas podem ser inseridas na franquia sem que ela precise se reinventar.
Os poucos momentos em que ele tenta sair da “zona de conforto” ficam limitadas aos eventos de Gymkhana e o retorno do sistema de Playgrounds — onde você pode criar eventos de drift e compartilhar com a comunidade. Me lembra o finado DiRT Showdown, gostaria que a Codemasters continuasse esse spinoff.
Entretanto, meu interesse no modo playgrounds não vinha pelo o que DiRT 5 oferecia, mas pela minha mania de competição e de tentar atingir a maior pontuação possível. O modo playground só foi um meio. Se me dessem uma versão com carros que pudessem ser melhor personalizados para algo que fosse além dos aspectos visuais, ferramentas de edição mais competentes, eu pulava de cabeça sem pensar duas vezes.
Talvez o que mais me impressiona nessa zona toda é que DIRT 5 compete com jogos como WRC 9 e art of rally. Um deles sequer teve inovações e o outro — que já está na minha lista de jogos do ano — sabe bem que foco tomar. Indiretamente, como já apontei antes, ele soa mais como um recorte muito mal produzido das corridas offroad de Forza Horizon 4 ou outros jogos que trazem o mesmo tipo de conteúdo.
Como uma empresa do tamanho da Codemasters olhou para o que DIRT 5 oferecia e disse “ah sim, ‘conteúdo’, isso que vale a pena”? Jogaram todos os anos de experiência em jogos de corrida pela janela? Não é possível, pois temos F1 2020 como exemplo de que a empresa ainda é excelente no que faz. Quem dera eu ser um mosquitinho para decifrar o que aconteceu nos bastidores.
Agora que estou com cerca de cinco ou dez medalhas faltando para a conclusão do modo carreira, DIRT 5 virou um “paciência” para mim. Eu abro o jogo, faço uma corrida ou outra enquanto espero um email, o upload de um arquivo, a resposta de alguma coisa de trabalho. Ele não ganhou essa posição por ser desafiador ou por ter partidas rápidas, mas por me deixar tão entorpecido com a sua proposta que é melhor isso do que ficar atualizando as minhas redes sociais para ver mais desgraça.
Ao menos dá para dizer que de fato DIRT 5 traz o clima de festa, uma festa à qual você sequer foi convidado, que foi mal planejada, e a única coisa que deu certo foram os fogos de artifício. Bom, com essa pandemia você não deve passar o ano novo na praia ou em algum lugar cheio de gente, então pelo menos serve como um visualizador de fogos de artifício.
DIRT 5
Total - 6
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Coloque a identidade que quiser em DIRT 5 — o clima de festa, um podcast, a explosão de cores — isso não esconde o fato de que ele é um dos jogos de corrida mais sem direção de 2020. É belo de se ver pelos primeiros minutos, mas depois que a euforia das cores e das luzes for embora, resta apenas o entorpecimento de cada corrida monótona.