Deve haver alguma regra que estabelece que a cada cinco jogos baseados no universo Warhammer – seja ele o 4K ou o “clássico” – dois deles serão bons, um vai ser competente, e os outros dois moderadamente decepcionantes. Já me preocupei quando vi Warhammer: Chaosbane entrar nessa roleta. Ainda mais sendo um Action RPG, já que minha experiência com o último que tentou essa proeza (Inquisitor – Martyr) não foi lá das melhores. Por sorte, o meu tempo com a versão beta demonstrou que os meus medos eram infundados. Ou ao menos parte deles.
Adianto que se você está na espera do próximo Diablo, Path of Exile ou similares, pode tirar o cavalinho da chuva; Chaosbane não é isso. Ele é um action RPG cujo principal “gancho” vai ser atrair fãs de Warhammer, e não aqueles apaixonados por loot. Loot é algo que você pega para deixar o seu personagem ligeiramente mais poderoso, mas até onde vi, carece de sufixos (como +3 em energia, +2 em vida, etc) e atributos passivos. Neste aspecto Chaosbane está mais próximo de Wolves of Midgard do que de Grim Dawn.
Ou seja, o que carrega Chaosbane é a sua história. Sim, é clichê, é exagerada, o Chaos está “aprontando uma” mais uma vez, e só você – junto com um conselho de High Elves e Witch Hunters – pode pará-los. Jamais espero originalidade de um jogo de Warhammer; o que eu espero é que a desenvolvedora entenda o ritmo entre “exagero” e conversas mais “sérias” (até onde Warhammer permite, é claro). Nesse aspecto a Eko Software dá um show comparável ao trabalho da Tindalos Interactive com Battlefleet Gothic: Armada. O que ela não entende tão bem é como estruturar essa história fora das cinemáticas.
Ao invés de um mundo aberto, onde a exposição a novos elementos de narrativa tende a ocorrer com uma certa “naturalidade”, a Eko opta por um sistema de missões – com o primeiro capítulo se passando inteiramente nos esgotos da cidade. Espero que você goste muito, mas muito de esgotos, pois gastei quatro horas para completá-lo e vou enlouquecer a próxima vez que olhar para um rio de fezes por mais de cinco minutos.
Esse problema poderia ser mitigado se a estrutura das missões em si não fosse tão estática. As primeiras dez missões usam o mesmo layout de mapa, com a principal diferenciação sendo o posicionamento dos inimigos. Grim Dawn adota um estilo similar para desenvolver a sua história, mas a quantidade de conteúdo opcional, chefões, e áreas secundárias reduz o tédio.
Eu entendo que repetição é um aspecto inerente de action RPGs; cedo ou tarde você vai atingir uma barreira de dificuldade onde você precisa buscar um loot melhor para avançar, ou ultrapassar essa barreira só para continuar encontrando novas maneiras de se desafiar. Alguns raríssimos jogos se safam disso, como o primeiro Diablo, porém é preciso lembrar da época na qual ele foi criado — e qual o contexto em que ele se inseria. É um luxo a que Chaosbane não pode se permitir, ainda mais com uma estrutura que, até onde vi, coloca loot em segundo plano.
Todavia, debaixo dessa estrutura aparentemente repetitiva, a Eko Software traz consigo algumas boas ideias, principalmente no que diz respeito à árvore de habilidades. De início eu a vi como dolorosamente linear e superficial. O pulo do gato vem na alocação de habilidades. Diferente de Action RPGs como Diablo 3, onde você libera habilidades por nível e depois pode adaptar as suas táticas de acordo com a situação, Chaosbane coloca uma limitação mais rigorosa. Cada habilidade tem diferentes níveis e custos de “pontos de habilidade”; quanto mais forte, mais pontos custa. Ou seja, caso queira ter uma habilidade de poder alto – e consequentemente com um custo alto – talvez seja preciso remover uma ou mais habilidades da barra de habilidades.
Das duas classes disponíveis no beta, Empire Soldier e High Elf Mage, senti que o mago é o que mais se beneficia desse sistema. Com mobilidade como seu sobrenome, eu usava sua habilidade especial (um orbe elétrico) para causar dano à distância, enquanto magias que causavam dano por tempo eram a minha ferramenta principal para destruir as hordas de nurgles que teimavam em se jogar aos meus pés, como pequenos kamikazes.
Fico até feliz que tenha sido o mago o melhor a usar as habilidades, porque o Empire Soldier me demonstrou outro problema sério do beta de Chaosbane: a falta de impacto. Tenho muitas críticas sobre Diablo 3, mas se há uma coisa que a Blizzard sabe fazer muito bem é transpor a sensação de que você está “destruindo” seus inimigos; mesmo no nível 1 a sensação de poder é inigualável. Em Chaosbane? Meu Imperial Soldier batia em papel; essa é a única explicação plausível que eu encontro no momento.
Como o personagem tem suas skills voltadas para controle de área e atordoamento de inimigos – afinal, ele é um “tank” – eu tinha dificuldades de entender se eu havia de fato atordoado o monstro que estava na minha frente, se o golpe havia conectado. Era como se parte da informação se perdesse entre o ato de atacar e o ato do inimigo receber o golpe. Mas, novamente, é um beta; pode ser que as animações não estejam finalizadas e por isso há essa discrepância.
Outro ponto que sustenta essa teoria é que a Eko Software sabe muito bem quando dispor informações, mais especificamente em relação a quando os inimigos estão envenenados ou não. Novamente, eu só fui descobrir isso quando joguei com o mago e vi uma névoa verde se espalhar pelo chão. Olhei para a minha barra de vida e pensei “ferrou”, pois estava sem poções, e eu estava no último chefão do beta.
The Great Unclean, que nome maravilhoso. É ele que eu levo comigo como a minha melhor lembrança de Chaosbane. Um assustador monstro dos Nurgle, com diferentes fases e ataques, que não perde nada em design e mecânicas para os pesos pesados do gênero. Minha expectativa é que a Eko Software use esse chefão como um exemplo dos próximos capítulos de Chaosbane: desafiador, com mecânicas bem elaboradas, e capaz de demonstrar visualmente o poder dos seus ataques.
No fundo, eu torço mais por Chaosbane pelo conceito que ele propõe do que pelo que eu vi até agora – e também por estarmos em pleno 2019 e ainda não termos um action RPG de Warhammer que seja competente. Ainda tem muita água para rolar até junho, data prevista para o seu lançamento, e a parcela do que eu vi me deixou tanto entusiasmado quanto apreensivo.
Que os próximos capítulos de Chaosbane tenham mais variedade, que a Eko Software melhore o combate, e as animações. E por favor, eu imploro, sem mais esgotos.