“Como eu detesto tempestades de areia” não era uma frase que eu esperava um dia colocar no meu “dicionário de termos de Total War”. Veteranos vão lembrar das malditas tempestades de “Rome” e “Rome II”, mas foi só quando joguei os 50 turnos iniciais de “Total War: Pharaoh” — previsto para sair em 11 de outubro via Steam e Epic Games Store — que notei o impacto de quase uma década praticamente sem variações climáticas na franquia.
Eu, assim como muitos fãs, fiquei com o pé atrás quando a Creative Assembly anunciou “Pharaoh”. Um retorno para a era “clássica” de Total War e foco no colapso da Idade do Bronze? Seria bom demais para ser verdade? Sim e não. Já antecipo que “Total War: Pharaoh” não é um retorno completo ao estilo de jogo que a desenvolvedora criou até o advento de “Total War: Three Kingdoms” e “Total War: Warhammer”, mas também não é um conjunto de ideias copiadas de “Total War: Troy”.
Uma das principais distinções que precisa ser feita é que, no fim do dia, “Total War: Pharaoh” é um jogo com personagens centrais e não generais aleatórios e famílias. A Creative Assembly abraçou esse estilo de campanha para oferecer uma estrutura narrativa mais refinada. Por outro lado, essa estrutura é muito mais maleável de acordo com cada jogador.
Antes mesmo de dar os meus passos iniciais no Egito antigo, “Total War: Pharaoh” me apresentou o que posso apenas descrever como o melhor conjunto de opções de personalização de campanha já feito pela Creative Assembly.
Nada de apenas opções de dificuldade para a batalha ou o mapa geral; o que você encontra aqui é uma página inteira que você pode ajustar — da quantidade de reforços das tropas inimigas até como a diplomacia deve ser conduzida, com a presença de agentes ou não em territórios inimigos. Anos atrás, o ajuste desses valores dependeria da comunidade de mods (e sou imensamente grato pelo esforço que eles fazem), mas agora qualquer um que for jogar “Total War: Pharaoh” vai poder fazer isso sem dores de cabeça. Eu, obviamente, escolhi sofrer e coloquei todas as opções entre “difícil” e “muito difícil”.
Foi então que a campanha começou com o seu típico trailer inicial, um panorama das principais facções ao redor de Ramsés, e o principal objetivo de “Total War: Pharaoh”: se tornar o faraó do Egito e tentar sobreviver ao colapso da Idade do Bronze.
De cara eu notei um dos meus elementos favoritos de “Total War: Troy” fazendo um excelentíssimo retorno — o sistema de múltiplos recursos ao invés de apenas usar “ouro”. Não só faz sentido para o período, mas ele vira um componente essencial para “Total War: Pharaoh”. Ao invés da abundância de “Troy”, a Creative Assembly tomou bastante cuidado em espalhar os recursos para não fazer com que uma facção tenha controle completo da produção de uma matéria-prima específica, e para assim fazer com que o jogador se movimente o quanto antes para conquistar fontes de produção.
Ramsés é um dos personagens mais “padrão”, por assim dizer, em termos de complexidade. O seu exército e posição iniciais são favoráveis para garantir alimentos e crescimento populacional e, dado a sua família, poder conquistar uma posição na corte.
O sistema de corte de “Total War: Pharaoh” é uma resposta quase direta à ausência de famílias de jogos antigos, mas com um toque ainda voltado para a “narrativa”. A cada turno você pode realizar no mínimo uma ou duas ações que variam dependendo de com que personagem você interage. É possível, por exemplo, pedir tropas especializadas caso tenha nutrido a sua amizade com um dos grandes “generais” do Faraó. Mas você pode usar esses mesmos pontos para persuadi-lo e se unir a sua trama de remover um outro membro da corte e tomar a sua posição.
Ramsés infelizmente não é o melhor diplomata, mas sua influência foi suficiente para garantir que eu ascendesse no panorama político da era e virasse o principal sacerdote da corte. Não me pergunte como Ramsés é bom nisso, apenas aceite. O que eu sabia é que isso dava para mim mais pontos de devoção, que eu poderia usar em um dos deuses do Egito para garantir diferentes tipos de bônus.
Eu já sei, alguns já pensaram no sistema de devoção de “Total War: Troy” e se perguntaram qual é a grande diferença para “Pharaoh”. De início, os bônus foram melhor distribuídos e nenhuma divindade é melhor do que outra, tudo depende do seu estilo de jogo. O segundo ponto crucial é que seus templos agora não ocupam mais um espaço nas cidades, mas sim são áreas separadas do mapa — uma oportunidade perfeita para atacar e saquear templos inimigos. E, acredite, você vai querer fazer isso o quanto antes.
O colapso da Idade do Bronze não é chamado assim à toa. “Total War: Pharaoh” traz um senso de urgência palpável. Eu vejo uma Creative Assembly que aprendeu muito com os eventos de “Three Kingdoms”, em como fazer o jogador explorar o mapa e inevitavelmente ter que lidar com as principais decisões da campanha ao invés de ficar na sua zona de conforto.
Se lembra quando eu disse acima sobre a distribuição de matérias-primas? Pois bem, se você quer garantir um fluxo positivo de mármore, é bom você fazer as pazes com os hititas. Eu até tentei, mas fui pego por um “pequeno” problema: eles odeiam Ramsés e os Egípcios no geral.
Na outra margem do Nilo estavam as principais facções sedentas para se tornarem o próximo faraó. Exércitos formidáveis, cidades gigantescas e bem protegidas, uma barreira quase impenetrável.
Sem ter muito para onde correr, tomei a pior decisão possível: iniciar a guerra civil o quanto antes e atacar alguns dos centros dos Hititas para expandir meu território e obter mais matéria-prima. Uma solução bruta? Sim, e que funcionou… em partes.
Lutando no território conhecido e desconhecido de “Total War: Pharaoh”
Umas das maiores e melhores alterações que “Total War: Pharaoh” faz na fórmula histórica de “Total War” está nas batalhas em tempo real. O jogo não só conta com o retorno das formações clássicas, como introduz novos tipos de formações e refina os diferentes tipos de terrenos que foram apresentados em “Total War: Troy”.
A grande maioria das unidades teve a sua movimentação reduzida drasticamente e o impacto do terreno está mais visível do que nunca. Você não vai querer que as suas tropas de combate corpo-a-corpo corram por dunas se quer que elas ainda estejam “prontas para o combate”. Na melhor das hipóteses, elas vão ser trucidadas pelo inimigo ou fugir.
Outra vez, é um dos sistemas que eu tinha dado como “garantido”, mas que com “Total War: Pharaoh” é que eu vejo o quão evoluído ele está. Muitas batalhas de “Rome: Total War” se passaram no deserto, mas nenhuma delas — a não ser que eu estivesse usando um mod — tiveram o impacto nas unidades como em “Pharaoh”.
A Creative Assembly se desdobrou para fazer o campo de batalha se tornar algo mais “vivo”, um segundo exemplo sendo as variações climáticas que podem ocorrer durante a batalha.
Quando disse que odiava tempestades de areia no começo do texto, não me referia apenas ao fato de começar uma batalha no meio dela, mas de que uma pode gradativamente surgir no mapa e afetar as suas unidades e as unidades do oponente. A precisão de qualquer tropa munida de projéteis vai sofrer penalidades ferrenhas e fazer com que você mude de táticas o quanto antes para não perder uma batalha.
Outra mecânica bastante mencionada pela Creative Assembly é a maior presença de incêndios causado por ventos. Tais situações tendem a ocorrer durante batalhas de cerco, mas apontam um incrível avanço em comparação com sistemas de “Total War: Attila” e “Thrones of Britannia”. Acabou aquela história de “pontos fixos” para começar a pegar fogo, uma flecha em um dia quente com vento e mato seco é o que basta para se alastrar e me fazer recuar as unidades.
A minha única crítica em relação ao sistema no momento é que ele é melhor visto em batalhas mais longas. Não espere que “Total War: Pharaoh” mude o clima “da noite para o dia” só porque você está em confronto contra meras 1000 tropas no mapa. O impacto dele que importa, e até onde vi, está cumprindo o seu trabalho.
Mas tanto o clima quanto o terreno possuem um efeito dominó importantíssimo para uma terceira adição de “Total War: Pharaoh”: o sistema de armadura. Não importa você ter tropas de elite protegendo os flancos ou até a linha de frente se você espera que elas façam boa parte do trabalho e derrotem o inimigo.
As armaduras irão despedaçar à medida que o combate avança e cedo ou tarde você vai precisar usar bigas ou outras forças de alto impacto para quebrar os flancos dos inimigos. Quando elas não estão disponíveis, unidades leves tendem a cumprir a tarefa de forma aceitável (com mais da metade delas morrendo, mas tudo bem).
Eu abro um parênteses aqui para citar que “Total War: Pharaoh” é, na minha visão, a melhor representação do combate da Idade de Bronze desde o fantástico jogo em turnos “Field of Glory II”. Não estou levando em conta as dezenas de mods disponíveis para ambos os jogos, mas o uso de flanco, bigas, lanças e tantos outros componentes que “representam” o período de forma “histórica”. Isto é, considerando os poucos registros que temos dele.
Acima de tudo, eu me diverti muito em cada batalha que travei em “Total War: Pharaoh”. Os elementos táticos estão lá, a cadência mais lenta me agrada imensamente e o fato de que um rio raso pode ser a diferença entre atacar os flancos do seu inimigo e ficar “preso” e possivelmente perder a batalha é fantástico.
Se preparando para o desastre: Povos do Mar
Como mencionei antes, a corrida para o trono de Faraó é só uma das facetas de “Total War: Pharaoh”. A esta altura eu já estava na metade dos 50 turnos e sequer tinha “legitimidade” — uma moeda que você obtém via diplomacia / alianças ou conquistando territórios-chave — para usurpar o trono, ou tropas suficientes para atacar a capital. Foi então que eles apareceram, os terríveis Povos do Mar.
Ainda há muita discussão na comunidade de historiadores acerca de quem foram os Povos do Mar. Seriam eles uma confederação vinda de Anatólia? Um conjunto de facções que se uniram para atacar partes do Egito e do Mediterrâneo? “Total War: Pharaoh” não está aqui para te dar essa resposta, mas para lembrá-lo de que eles são uma gigantesca ameaça.
Não tardou para o primeiro barco aparecer na minha costa e praticamente destruir um dos meus principais centros de produção de bronze. Ramsés estava apertado que nem um sanduíche, com uma Guerra Civil de um lado, Hititas de outro, e agora os Povos do Mar saqueando as províncias.
Eu entrei em desespero, não sabia para onde correr. “Devo apostar e atacar a capital com todas as minhas tropas? É uma jogada arriscadíssima que não pode repercutir tão bem”, pensei comigo mesmo. Acabei separando os meus exércitos ainda mais até conseguir desestabilizar outros aliados do Faraó enquanto protegia os meus centros de suprimento dos Povos do Mar.
Foi uma jogada certeira. No final dos 50 turnos eu havia me tornado o Faraó e tinha acesso a uma nova gama de decisões administrativas e agora podia, com sorte, sobreviver às constantes invasões dos Povos do Mar, que só aumentavam com o passar de cada turno.
50 turnos podem não parecer muito no escopo geral da franquia Total War, mas para “Total War: Pharaoh”, a quantidade de decisões cruciais que precisei fazer em cada um deles me faziam sentir que eles duravam uma eternidade.
Também sei que — dado a outras duas campanhas que fiz em paralelo — se eu tivesse reduzido a dificuldade e diminuído os reforços dos inimigos ou até a frequência de invasões dos Povos do Mar no painel de configurações da minha campanha principal teria me tornado Faraó em menos tempo. Mas como já falei, se tornar Faraó é só um dos passos da campanha; sobreviver ao colapso que é a parte difícil.
As expectativas estão mornas para “Total War: Pharaoh”, e eu entendo a hesitação de grande parte da comunidade. O que posso dizer da minha parte é que, se os 50 turnos iniciais foram tão empolgantes como Ramsés, eu mal posso esperar para ver o que pode acontecer nos próximos 50 — tanto com esse personagem como as outras facções que vão estar presentes na versão final.
Será que um dia a Creative Assembly irá de fato abraçar o estilo “clássico” pré-Three Kingdoms? Não sei, mas se “Total War: Pharaoh” é o mais próximo que iremos chegar, eu vou dizer que estou por ora contente com esse “meio termo”.
Estou entusiasmado para ver quais são as outras mecânicas que não pude experimentar nessas curtas primeiras impressões, ver mais detalhes das diferentes configurações de exércitos e perder horas no modo de batalha personalizada. E que venha 11 de outubro, meu PC já está mais do que preparado! Só preciso me lembrar de não tomar café antes de começar a jogá-lo para não falecer de tanta ansiedade que sinto ao avançar de turno.