“Não mude o que não está quebrado”, ruge aquele que tem medo do futuro, de mudanças, de novidades. Se Panzer Corps tivesse um corpo, essa seria a sua principal fala. O neto de Panzer General foi, por muitos anos, similar em conceito e execução ao seu avô, considerado por mim um dos pilares dos jogos de estratégia dos anos 90. Panzer Corps 2, seu bisneto cujo lançamento está previsto para 19 de março quer mudar, nem que seja um pouco, o rumo da franquia.
Antes de serem jogos de estratégia, tanto Panzer Corps como Panzer General (e em partes o seu parente distante, Fantasy General) eram excelentes puzzles. Suas peças, quase sempre no papel de atacantes, dependiam da audácia e perspicácia do jogador para alcançar uma vitória majoritária — o que significa completar o cenário na menor quantidade de turnos. Os cautelosos tinham de se contentar com uma vitória minoritária ou saírem de mãos abanando por não terem sido “ágeis” o suficiente.
Panzer Corps 2, tal qual Fantasy General II, enxuga esse sistema para um único ponto: você vencerá o cenário independente de acontecer em 6 ou 10 turnos. Isso garante não só maior maleabilidade por parte do jogador, mas espaço para a Slitherine refinar o aspecto mais fraco da franquia: a IA.
Tome por exemplo a invasão da Polônia em Panzer Corps, vista abaixo. Nela você tinha 17 turnos para conquistar todas as cidades e ter uma vitória minoritária. As tropas oponentes eram como estátuas em seu caminho. Era questão de bater contra a parede, tentar as táticas mais absurdas, até conseguir decifrar o melhor método – a solução do quebra-cabeça – para alcançar o que o cenário te pedia.
Contraste a mesma invasão do ponto de vista de Panzer Corps 2. Menos unidades no mapa, menos objetivos e turnos (15), mas muito mais arriscada. Seus veículos agora precisam de mais mantimentos para se manterem viáveis no campo de batalha, portanto tomar pontos de suprimento do inimigo se torna um objetivo secundário importante. As tropas inimigas não são mais estátuas; elas vão para cima de você caso haja uma abertura e recuam se veem a necessidade disso. Suei muito mais na dificuldade mais alta de Panzer Corps 2 para completar uma mera campanha do que a maioria dos cenários que Panzer Corps me ofereceu nos últimos 9 anos.
A mesma situação se desenrolou no mapa da Líbia – o primeiro da campanha da África do Norte e talvez um dos poucos que teve a sua estrutura mantida do primeiro Panzer Corps. Tomar a cidade de Benghazi foi a parte mais fácil, mas atravessar o deserto com a constante preocupação de ter suprimentos suficientes para não ser aniquilado pelas tropas aliadas foi, no mínimo, estressante. Turno após turno olhava para os meus tanques e pensava “será que dessa vez não fui longe demais?”. A resposta veio no sétimo turno, quando três dos meus tanques foram aniquilados em uma emboscada preparada pela IA, que se aproveitou do terreno elevado (outra nova mecânica de Panzer Corps 2) e da minha ansiedade em dominar o mapa sem dar a devida atenção aos suprimentos.
Revendo a partida, notei o quão estúpido fui e como eu poderia ter mitigado o problema de suprimentos com o novo sistema de perks de Panzer Corps 2. Chupinhado do que até então era o carro-chefe dos jogos de estratégia em turnos do catálogo da Slitherine – Order of Battle World War 2 – você agora pode escolher entre traços positivos ou negativos para o seu comandante de acordo com o estilo que prefere.
No caso da campanha da Líbia, optei por ter soldados mais resilientes em troca de não ter como reforçar ou enviar novas unidades para o campo de batalha. Um erro que está mais do que claro agora que eu escrevo esse artigo; devia ter pensado nos suprimentos em primeiro lugar. De qualquer forma, a variedade de traços é imensa e o sistema é feito para se adaptar tanto para veteranos como para novatos.
Esse pode ser o maior charme e atrativo de Panzer Corps 2. Se você é um daqueles puristas que não gosta da ideia de traços, ignore-a ou vá além, crie uma dificuldade personalizada que atenda a suas necessidades. Tantas variantes mostram que a Slitherine está mais do que disposta a fisgar uma nova audiência, aquela que não cresceu com memórias da SSI (antiga desenvolvedora de Panzer General), ainda assim mantendo o conceito base da franquia intacto.
Pois, como falei no começo do texto, ele ainda é e deve permanecer por um bom tempo como um dos pilares e exemplos de jogos de estratégia em turnos. Este aspecto mudou pouco; se você jogou Panzer General, Order of Battle ou o primeiro Panzer Corps, a curva de aprendizagem de combate vai ser irrisória.
A regra básica é a mesma aplicada em Panzer General / Corps: Unidade X tem valor de ataque Y que é modificado pelo tipo de terreno em que ela se encontra. Mais simples que isso, impossível. O que importa é que funciona e as adições de Panzer Corps 2 – como uso de trincheiras, bônus de reconhecimento, encercamento e precisão — aprofundam ainda mais os confrontos sem te deixar confuso. Não entrarei em detalhes sobre tais mecânicas pois a versão que joguei não estava finalizada, e muita água pode rolar até seu lançamento em 19 de março.
Todavia, abro espaço para parabenizar a equipe que trabalhou na estética e visual de Panzer Corps 2, pelo incrível trabalho de ser capaz de representar diferentes terrenos visualmente sem que um jogador tenha que navegar por uma dezena de menus. Isso sem contar a grande assimetria que existe entre as tropas do Eixo e as Aliadas, seja em soldados, tanques, artilharia ou aviões. Coisas que certos jogos (não é mesmo Wargroove?) deveriam aprender.
Para alguém que estava com 30 pés atrás em relação a tantas mudanças para Panzer Corps 2, da mudança de estilo visual às novas funcionalidades que poderiam ser só enfeites, fico feliz e aliviado de ver que ele se encaminha para um futuro brilhante. Queria ter tido mais tempo de testar todos os cenários, mas seria impossível. Para você ter uma ideia, só a campanha da de 1939 consiste em mais de 30 cenários e todas as campanhas que vão até 1943, 81. Isso sem contar o gerador de missões aleatórias e o editor de mapas, ao qual não obtive acesso durante a versão de preview.
Pois é, “não mude o que não está quebrado”, e a Slitherine cautelosamente não o fez. O que ela fez foi enriquecer mais ainda um jogo que precisava tanto de atenção e de uma bela repaginada em todas as frentes. Ainda é aquele arroz com feijão? Claro que é, existem jogos de estratégia em turnos muito mais complexos por aí, mas tem dia que você só que um arroz e feijão, quem sabe acompanhado de uma farofinha. Nisso, Panzer Corps 2 dá todos os indícios de continuar no topo.
Ao que tudo indica, Panzer Corps 2 será pelos próximos anos o novo carro chefe da Slitherine. Com expansões a fio, novos mapas e cenários, assim como ocorreu com Panzer Corps 1 e seus DLCs (Allied Forces, Afrika Corps, dentre tantos). Se for para ser assim, mal posso esperar para pôr as minhas mãos na versão final e descobrir o que vem por aí.