Está preparado para uma enorme salada de frutas? Então aqui vão os ingredientes: Um pouco de Settlers of Catan, um pouco de Civilization, uma pitada de Banished e um estilo Age of Empires. Ficou gostoso? Até que ficou, ao menos no caso de Northgard, o game de estratégia da Shiro Studios disponível no acesso antecipado do Steam por R$36,99.
Eu não estava convencido que a ideia de Northgard seria boa, um cruzamento de muitos estilos relativamente conflitantes — ainda que todos tenham como base estratégia —, cuja proposta vai de sobrevivência a expansão. Com mapas gerados semi-aleatoriamente, o jogador controla um clã Viking que deve estabelecer uma vila, coletar recursos e expandi-la.
Cada área é tratada como uma zona, que pode oferecer recursos como 20% a mais de coleta de madeira, animais para o abate ou ruínas que te darão ouro, madeira e fama. Tal inspiração, que dá o toque de Settlers of Catan em Northgard, é um dos elementos que fazem com que ele se destaque diante da concorrência.
Tais noções de coleta e expansão são comuns para quem já está acostumado com estratégia, mas que são ainda mais simplificadas no caso de Northgard. A coleta de recursos, por exemplo, é automatizada. Habitantes que não forem especializados em uma área — como caçadores, lenhadores ou guerreiros —, irão coletar comida das regiões controladas. “Ah, então o jogo é bem fácil”, apontei, arrogantemente enquanto ria das mecânicas. Mal sabia que eu ia engolir as minhas palavras minutos depois.
Northgard é sobre estabelecer um tênue equilíbrio entre diferentes elementos, forças, antes que o pior aconteça. Sendo o pior, até então, neve e invasão de Draugrs. Constantemente põe em cheque as noções do jogador de segurança. “Seria a quantidade de alimentos suficiente para durar até o inverno? ”, “Em caso de um ataque, você tem madeira suficiente para reparar as construções e produzir novas? ”. As mesmas questões mostram também a faceta não tão agradável do game.
Por dar tanta atenção a particularidades, não há no momento uma grande interação no mapa em si. Ele funciona como uma representação visual, mas raros são os momentos onde o que você coordena ali não possa ser traduzido em sliders ou números. Atribuí X fazendeiros para a fazenda Y, agora não preciso mais encostar nela até o momento de coletar recursos suficientes para subi-la para o próximo nível.
Cria-se um vão entre uma ação e outra tão grande que se torna fácil se desprender do que acontece. Não há como avançar em um ritmo dinâmico, pois os scouts — usados para desvendar novas regiões do mapa como em um jogo de tabuleiro —, são pouco ágeis. Nessas horas é bom ter um chá, café, a bebida preferida do lado.
Quando chega a hora de tomar decisões importantes, como definir qual dos quatro tipos de vitória — tecnológica, militar, mercantilista, de prestígio — é que Northgard volta a ficar interessante. O trajeto para alcança-las ainda é tortuoso e inconsistente, mas dá uma boa base para desenvolver estratégias e táticas.
Parte do problema está ligado a inteligência artificial, longe de finalizada, e ainda a falta de um modo história e partidas multiplayer. Ainda assim, são criados curiosos cenários para certas vitórias, como a militar que foi a mais usada por mim. Eu poderia atacar meu oponente justamente após o termino do inverno, pois sabia que seus recursos estariam escassos, entretanto, os meus recursos poderiam não garantir uma vitória definitiva sobre ele.
A vitória tecnológica precisa de Lorestones, pedras que geram pontos de “Lore” e garantem bônus a áreas como construção e coleta de alimentos. Isto requer que toda a estratégia expansiva seja remanejada para dominar as áreas com tais pedras o quanto antes sem que a cadeia logística seja esquecida.
O que ele também carece é uma estrutura mais condensada para quem gosta de jogar na defensiva, lentamente estocar recursos e decidir invadir no momento certo. Existem fatores suficientes, como o próprio inverno e a limitação de construções por zona, que previnam com que um jogador seja capaz de se autossustentar por um longo período de tempo. Ao mesmo tempo, não existem funções que compensem por esta carência, como o uso de estruturas defensivas mais robustas, por exemplo.
A próxima parada para a Shiro Games, ou assim espero, é converter a parte da teorização de estratégias e torna-las mais visíveis. Fazer com que a interação jogador X mapa seja mais atraente do que ver “personagens fazendo coisas”. Afinal, por mais que tenha demonstrado possíveis cenários, raramente você tem a sensação de impacto na tela. Compreensível para um 4X ou um Grand Strategy, inadmissível para estratégia em tempo real.
Prendo a respiração e mantenho as minhas esperanças, pois de todos os jogos de estratégia que joguei em Early Access desde meados de 2016, Northgard é o que mais aparenta ter uma direção concreta. Um modo história está por vir, novas facções estão nos planos e as mecânicas já dão espaço para experimentação e teorização. Levando em conta o trabalho espetacular da desenvolvedora em Evoland e Evoland II, cruzo os meus dedos para que Northgard seja mais um sucesso.