Quem pegou o começo da explosão indie de jogos de estratégia se lembra muito bem de Frozen Synapse, o jogo de estratégia em turnos simultâneos da Mode7 Games. Sua sequência, ainda que imperfeita, é fantástica. Há mais de três anos que eu venho buscando um jogo que me dê o mesmo gosto de resolver missões quebra-cabeça, de sentir a tensão de saber se um plano vai dar certo ou não. No Plan B (Steam) da GFX47 – encabeçada por Sébastien Dubois – tem grandes chances de preencher esta lacuna.
Esteticamente o jogo de Sébastien Dubois, mais conhecido pelo seu trabalho no pequeno porém impressionante Gladiabots, pode ter apenas como principal paralelo o uso de armas e táticas; posso até dizer que ele está mais para Door Kickers (Killhouse Games) do que Frozen Synapse. Mas há um componente essencial que separa No Plan B de outros jogos do gênero: a proposital falta de controle após um plano ser posto em ação.
“Então você caiu de amores por ele à primeira vista?”. Quem dera; a minha relutância para apreciar o design de No Plan B foi tão grande que eu quase desisti de escrever esse artigo. Começava um parágrafo, montava um rascunho, apagava tudo e recomeçava da estaca zero.
Esse processo não é muito diferente do que acontece em cada missão de No Plan B. Após escolher uma das quatro facções disponíveis (SWAT, FBI, ladrões ou gangues), você tem a opção de começar uma campanha com elementos de roguelite, jogar missões separadas, desafios diários, missões feitas pela comunidade, e um gerador de missões. Haja conteúdo para um jogo que está em acesso antecipado!
Ansioso para ver do que o jogo de fato se tratava, cliquei em “SWAT” sem pensar duas vezes e iniciei a campanha. Um tutorial curto me deu o conceito básico da “linha do tempo” que No Plan B usa e me jogou na campanha com um tapa nas costas e um grande “boa sorte camarada, você vai precisar”. Bem, ele não falou essas palavras exatas, mas deveria. Eu precisava de muita, mas muita sorte mesmo para avançar além da primeira missão.
O truque de No Plan B — e o que o faz tão especial aos meus olhos — é o fato de que ele transforma toda missão em uma pequena caixinha de surpresas. Você seleciona quantos personagens devem participar dela, seu armamento, prepara o plano, o coloca em ação e falha miseravelmente. Hora de recomeçar a missão, certo? Pois bem, agora o posicionamento de todos os inimigos foi alterado e o plano que você tinha feito pode não ser mais útil.
Foi bem nessa hora que eu coloquei a mão na cabeça, olhei para as paredes, para o meu teclado, para o desejo de apertar Alt+F4 e soltar um “Ah mas esse desenvolvedor está de sacanagem comigo, só pode”. Essa reação espontânea, porém, diz mais sobre a minha falta de paciência de aprender os detalhes do jogo do que uma falha do design em si. Sim, eu apertei alt+F4 e fui dar uma volta.
Quando voltei com a cabeça menos quente (não que eu seja uma pessoa estressada; depois de Dark Souls e NioH 1 e 2, eu raramente me irrito com jogos) foi que eu comecei a entender o que No Plan B queria me falar. Não era sobre “recomeçar” a missão do zero, mas entender onde falhou; é sobre pegar um plano que não deu certo, revisar possíveis pontos cegos, calcular a “probabilidade” da presença de inimigos e então redesenhar no mapa a movimentação e posicionamento das unidades.
Também tenho parte de culpa nesse processo, pois como fui apressadinho, não notei que a SWAT tem atributos diferentes do FBI, ou que o peso e o tamanho da arma influencia na velocidade de cada unidade. Isso sem contar todo um sistema de atributos passivos que são desbloqueados e permitem que você especialize cada unidade. Abro até espaço para agradecer pelo jogo não se prender tanto a certos estereótipos, me deixando jogar com ladrões. Afinal, tem dias que você acorda escolhendo “violência” e nada melhor para desestressar do que roubar um banco. Digo, melhor do que acessar redes sociais como o Twitter. (Alô ABIN, eu não tenho planos para roubar um banco, OK?)
Agora com a faca e o queijo na mão, já estava pronto para falhar ainda mais em No Plan B. A minha primeira verdadeira missão era resgatar um refém que estava localizado no meio de um prédio. “Ok, eu vou evitar de usar explosivos, e usar armas de baixo calibre para entrar e sair o mais rápido possível”. Calculei a rota, botei cada unidade para executar um tipo de ação — como uma unidade abrir a porta e jogar uma granada de efeito moral enquanto a outra avançava — e vi meu plano….. Desabar. Os inimigos estavam armados com rifles apontados para a porta de entrada, e a granada que eu joguei sequer fez coceira neles.
Mesmo com a derrota na missão, mesmo sabendo que eu tinha entendido as mecânicas do jogo, ter a sensação de “impotência” em ver as minhas unidades serem massacradas foi igualmente agoniante e intenso, uma sensação que eu não sentia desde Frozen Synapse. É muito nessa sensação que No Plan B se sustenta, e se sustenta muito bem.
Toda missão subsequente era um misto de “Será que vai dar certo?” ou “Essa rota parece segura, mas eu tenho um ponto cego aqui devido a estes barris. Devo usar uma granada? Mas elas são limitadas; e se eu só colocar uma das unidades mais para perto?”. Era dar “play” no plano, segurar a respiração, e contar os segundos até que ele tivesse sido executado por completo. Eu me derretia na cadeira com um imenso alívio, minha respiração voltava para o seu ritmo normal e o meu batimento cardíaco não mais parecia que eu acabara de correr uma maratona.
Como um jogo em acesso antecipado, é claro que existem muitas rebarbas ainda a serem reparadas, e à medida que eu continuava as minhas missões e exploração do modo, mais elas apareciam. Muitas delas são fáceis de ignorar, como a interface que requer polimento, ou alguns ícones que poderiam ser melhor dispostos na tela — elementos de desenvolvimento de jogos que evoluem com o tempo. Digo isso como alguém que já viu jogos em fase de protótipo até a sua versão final. Todavia, há um elemento crucial que eu torço muito para que Sébastien Dubois melhore o quanto antes: o sistema de linha do tempo para planejamento das ações.
Se havia uma lição que No Plan B deveria tirar de Frozen Synapse 1 e 2, ou outros jogos de estratégia, é adicionar e remover granularidade onde é necessário. Na atual versão, a linha do tempo para planejamento de ações é desnecessariamente complicada.
Digamos que eu quero movimentar a unidade “A” e “B” — que estão em posições diferentes — para uma porta e depois fazer com que elas entrem simultaneamente. Ao invés de ter um botão que “facilite” essa sincronização, eu tenho que clicar na linha que é criada pela unidade “A”, depois selecionar a unidade “B” e aí movimentar só a unidade “B”. Já deu para perceber a confusão mental que isso causa, certo? Expanda o problema para uma missão com 7 ou mais unidades e o resultado é que eu perdi mais tempo tentando alinhar todas as tropas do que pensando no plano em si.
Tudo bem que em certos pontos até Frozen Synapse era um pouco “complicado” demais para o seu próprio bem, como a possibilidade de fazer a sua unidade permanecer em um ponto do mapa por 0,2s. No Plan B não precisa desse grau de complexidade, mas só uma linha do tempo separada para cada unidade ou controles mais intuitivos já seriam um imenso avanço, não só no processo de aprendizado, como em gastar menos tempo lutando contra a interface e sim contra os inimigos. Em teoria segurar “Ctrl” simplificaria o processo de sincronização de movimento, mas a versão de preview enviada pela desenvolvedora continha um problema no uso. É bem provável que ele seja corrigido o quanto antes.
Conhecendo o trabalho de Sébastien Dubois e como ele levou Gladiabots de um mero “joguinho de criar regras para robôs lutarem entre si”, até ele se transformar em um monstro com uma comunidade competitiva, não tenho a menor sombra de dúvidas que No Plan B vai seguir o mesmo caminho. É bem provável que a maioria desses inconvenientes venham a ser resolvidos cedo ou tarde.
Vira e mexe alguém vem me perguntar “Ei Lucas, você conhece algum jogo no estilo SWAT 4, um jogo tático ou algo do tipo? Eu vejo alguns por aí mas muitos parecem repetitivos ou enjoativos”. Agora eu tenho uma resposta definitiva: Vai de No Plan B que não tem erro. Pode não ser em primeira pessoa e nem ter o estilo de “clássicos” do passado, mas se é adrenalina, ficar com o coração na boca e sentir o alívio dos músculos relaxando após o final de cada missão, ele vai atender e muito às suas expectativas.
Já no que diz respeito a mim, tenho planos para criar missões para ele (quando eu tiver tempo de respirar), de competir na tabela de lideranças — a eterna fraqueza —, ou de gerar uma missão aleatória quando eu estiver com vontade de uma pitada de estratégia mas sem a necessidade de um investimento de horas como um 4X ou um jogo de estratégia em turnos cuja partida acaba depois de três meses. Tenham certeza de que verão muito mais artigos sobre No Plan B aqui no site.