“Lucas, pelo amor, não começa um texto falando de nostalgia de novo, por favor”. Veja bem cérebro, eu sei o que você quer me dizer, mas não há como não falar de nostalgia quando falo sobre Glitchpunk (Steam). Afinal, se eu não comentar que nostalgia é uma desgraça, acredito que o jogo da Rogue Lords iria seguir um caminho diferente do que tentar ser uma “homenagem” a GTA 2.
Antes que um de vocês venham com sete pedras na mão, deixa eu explicar. Eu não tenho problema algum com uma desenvolvedora tentar capturar a essência de uma era particular; inúmeras fizeram isso com excelente sucesso. Já tivemos – e continuamos a ter – a renascença dos jogos de 8-16 bit. Agora passamos pela reinterpretação da era PS1 vinda de desenvolvedores independentes. Uma hora ou outra uma homenagem a GTA 2 surgiria, e Glitchpunk nem é o primeiro a fazer isso.
Se eu fosse tratar apenas do quesito visual, a Rogue Lords já teria um ótimo jogo na mão. É parte GTA, com pitadas de cyberpunk e um universo que não liga nem um pouco para você; o que é pontuado muito bem na primeira missão, onde um dos líderes das três facções sequer se importa com o seu nome, contanto que você faça o trabalho. Ele transpira a mesma sensação de “liberdade” dos jogos de mundo aberto do final dos anos 90 / começo dos anos 00’s, onde a história tendia a ficar em segundo plano e você podia fazer o que quisesse.
E sejamos sinceros, GTA 1 e 2 não têm histórias nem personagens memoráveis; boa parte das missões seguem um conceito simples de “vá até tal lugar e entregue algo” ou “elimine X alvos”. O mesmo se repete em Glitchpunk e isso não é necessariamente algo ruim. O que no momento é ruim, e bota ruim nisso, é jogá-lo.
Ninguém começa a construir um prédio de cima para baixo, certo? Ainda que eu saiba que esse provavelmente não seja o caso de Glitchpunk, pois se fosse não teríamos sequer um elemento jogável, a maioria das ações – das mais simples como roubar um carro ou atacar um inimigo – são travadas. Não um travado no sentido intencional de uma decisão de design, mas uma falta de polimento devido ao jogo ainda estar em acesso antecipado, creio eu.
Isso não seria uma grande preocupação minha pois já vi dezenas de jogos serem refinados ao longo dos períodos de acesso antecipado, mas são poucos que saem em um estado tão… catastrófico quanto Glitchpunk. Os elementos básicos do jogo estão em um estado tão “cru” que completar as missões é menos uma questão de habilidade e precisão, e mais torcer para que os controles não entrem na sua frente ou alguma coisa aleatória aconteça que quebre todo o ritmo da missão.
Eu nem preciso ir muito longe na história – apesar de ter ido de qualquer forma para fins de escrever esse artigo – para apontar os pequenos erros que vão se somando ao longo de uma partida. Uma das gangues formada por “andróides” que se veem como o futuro da humanidade me pediu para entregar três pacotes em locais distintos mas sem que eu atraísse a atenção da polícia. Simples, certo?
Entrei no carro que me foi designado e parti para a primeira entrega; pacote entregue e zero problemas. Parti para o segundo local e do nada um grupo de carros começou a rodopiar na minha frente, com um deles atropelando um civil e um dos androides da gangue, já que eu estava sem saber ainda no território deles (não há marcações no mapa sobre cada território é controlado por qual gangue). Isso não só atraiu imediatamente a fúria da polícia, como me fez falhar a missão e ainda perder reputação com a gangue – algo que só seria resolvido se eu pagasse 1000 unidades de crédito para poder voltar a falar com eles. Mas sem problema, dinheiro é o que não falta em um jogo como Glitchpunk. Roube pessoas, mate-as, atropele-as e fuja da polícia – caso consiga.
Como um elemento extra – e aqui abro espaço para dizer que a Rogue Lords tem boas ideias em mente para o futuro de Glitchpunk – você pode até fazer com que outras pessoas façam “o trabalho sujo” para você. Um dos módulos que eu recebi bem no começo do jogo permite “hackear” civis e fazer com que eles entrem em estado de fúria e ataquem quem verem pela frente. Escolha um ponto bem movimentado da cidade, libere a fúria de uma pessoa aleatória e colete a recompensa depois. Foi a melhor maneira que eu encontrei para ganhar um dinheiro fácil. O que fazer com ele? Comprar armas é claro! E…. pagar as gangues que eu sem querer matei para continuar a avançar na história.
A Rogue Lords promete que Glitchpunk terá múltiplas opções de avançar a história, mas até onde eu vi isso está ausente na versão de acesso antecipado. Era fazer malabarismo com a sua reputação com as gangues, navegar pela cidade sem propósito além de causar caos, ou tentar completar as dezenas de desafios disponíveis.
Eu optei por continuar a história para obter mais equipamento. Estes equipamentos vão dos já mencionados módulos de hacking até roupas que diminuem o dano recebido por certos tipos de munição, aumentam seus pontos de vida ou foco, que não é mais do que a energia usada para hackear carros — para fazer com que superaqueçam ou percam o controle — ou outras pessoas. Eu recomendo que você faça isso o quanto antes, pois o seu personagem é extremamente frágil no começo e ainda não sei se essa é uma decisão consciente ou apenas mais um dos desequilíbrios da versão de acesso antecipado.
Agora que eu escrevo esse texto, eu fico impressionado com a paciência que eu tive com as missões iniciais de Glitchpunk. O exemplo que descrevi acima é uma gota em um oceano de decepção e repetição de missões até cansar. Quando eu não estava lutando com os controles do veículo — que me fazem presumir que as ruas do universo de Glitchpunk são pavimentadas com sabão —, eu lutava com a movimentação do personagem; as armas são imprecisas sem nenhuma necessidade e a minha vontade era de largar tudo e parar de jogar. Mas, ainda assim, segui em frente para ver a última carta na manga que a Rogue Lords tinha para mim: desafios.
Se você já jogou alguma dessas missões de desafio em jogos de mundo aberto como “elimine X alvos em um tempo determinado com uma arma específica” vai se sentir em casa em Glitchpunk; só que a casa ainda está desarrumada e precisa de uma boa reforma na parte interna.
O termo “desafio” já deixa claro que não seria algo fácil, mas não precisava ser tão frustrante como está na atual versão do jogo. Até eliminar dez alvos em uma pequena área deve ser considerado um feito incrível pois tudo pode dar errado. Os alvos podem desaparecer, os alvos podem simplesmente não morrer ou alguma coisa aleatória – como aconteceu na missão que descrevi – te impedir de completar o desafio. Houve desafio que eu dei três passos para encontrar meu alvo, fui atropelado, jogado de uma ponte e morri. Era para eu ter rido, mas estava frustrado demais para esboçar alguma emoção.
Quando comecei a jogar Glitchpunk, a minha intenção era de ao menos completar todo o conteúdo presente no acesso antecipado, mas os problemas se acumularam ao ponto de eu chegar na metade da segunda cidade e perder o fôlego. Não importa nem mesmo o quanto ele me remete a GTA 2, o quanto de “liberdade” está presente, e as diferentes formas como eu posso destruir tudo.
Eu gosto muito da ideia dos módulos de hacking, eu queria ter “brincado” mais com eles, ver como eles afetam o desenrolar das missões ou como eu poderia fazer com que um carro de polícia parasse de funcionar caso eu o “hackeasse”. Todavia, as chances de eu acertar um poste por conta dos controles terríveis, perder o controle do veículo e morrer à toa eram bem maiores.
Nem mesmo senti vontade de começar a causar um caos aleatório caso não fosse para ganhar dinheiro. O meu pensamento era: “Bem, se eu fizer isso, eu vou ter que lidar com a possibilidade de eu morrer, de ser destroçado por alguma gangue, de perder reputação à toa, ou das minhas armas serem inúteis pois eu não consigo acertar nem um alvo do tamanho de uma montanha com esse sistema de mira”. Se um jogo que tanto quer ser GTA 2 não gera essa vontade, eu não sei bem o que fazer nele além de apreciar o visual. E para isso eu tenho outras muitas opções.
O que eu tenho em mãos é um jogo que, salvo raros momentos, não consegue me cativar a continuar. A minha vontade mesmo era de abrir Shakedown Hawaii – outro que faz sua própria homenagem à franquia da Rockstar – e causar caos no modo “free roam”. Ele pode não ter os visuais de Glitchpunk e sei que é um pouco injusto comparar um jogo “completo” com um em acesso antecipado, mas ao menos nele eu sei que não vou passar por uma montanha de frustração.
É bem provável que eu faça isso mesmo, e recomendo o mesmo para você. Vou acompanhar de perto o desenvolvimento de Glitchpunk para ver quais serão os próximos passos da Rogue Lords, mas por ora ele vai para a geladeira.