“Vamos colocar uma refinaria aqui, construir infantaria, veículos leves. Opa, esqueci o reator”, essa frase poderia retratar Command & Conquer, mas falo de Forged Battalion, em acesso antecipado no Steam. A desenvolvedora Petroglyph Games aposta em variar a fórmula que é tão enraizada em seus games; a questão que me vem à mente é: até que ponto uma alteração severa da fórmula pode renová-la?
“Prometendo” deixar de lado a nostalgia abraçada pela série 8-bit Armies/Hordes/ Invaders, fico impressionado em ver como o ritmo de Forged Battalion ainda se assemelha ao de Command & Conquer. O jogador começa uma partida, coleta recursos, expande a sua base e destrói o inimigo. É “tradicional” nas estruturas disponíveis para construção e até na trilha sonora – mais uma vez encabeçada por Frank Klepacki, que há anos trabalha em conjunto com a desenvolvedora.
Para quem não conhece ou não jogou a série Command & Conquer, aqui vai um resumo básico de uma partida: Dois ou mais jogadores – tipicamente posicionados em lados opostos do mapa – devem aniquilar a base um do outro, sendo o primeiro a fazer isso declarado como vencedor. O game que colocou a Westwood no mapa (Tiberian Dawn) tinha uma excelente curva de aprendizado e facilmente “viciava”. Ora, nada melhor do que preparar um exército e vê-lo destruir o seu oponente graças à sua perspicácia em escolher as unidades certas, ter defesas e uma composição equilibrada.
Esse formato foi por um bom tempo mais popular e acessível do que um Starcraft – por assim dizer – pois a barreira de entrada (conhecimento de unidades) era bem menor. Juntava amigos, iniciava uma partida e bola para a frente. Mas quando você vê uma franquia – mesmo que seja um sucessor espiritual – fazer as mesmas coisas, fica difícil não se sentir decepcionado. Forged Battalion não tenta esconder o fato de que ele é basicamente um “8-Bit Armies”, mas com uma camada de maquiagem extra.
Ainda assim, mesmo maquiado, ele é o jogo mais “inovador” da empresa desde o finado End of Nations. Ao invés de uma única base, a empresa implementou “outposts” – zonas capturáveis que permitem a construção de novos edifícios – o que permite maior controle sobre zonas do mapa, personalização de unidades e uma árvore de tecnologia “permanente”. Lamentavelmente, tudo que a Petroglyph faz parece vir com um imenso viés. No caso aqui são os novos sistemas, que, pelo andar da carruagem, mostram que as vezes a desenvolvedora adiciona ideias sem realmente saber o que fazer com elas.
Uma das maiores heranças de Command & Conquer que é sentida em peso no Forged Battalion é a facilidade da coleta de recursos. Diria que a Petroglyph, desde a série 8-bit, tem tornado isso mais fácil ainda. Com uma ou duas colheitadeiras o jogador já tem recursos de sobra para montar um exército forte o suficiente para atacar o oponente. Agora com a inclusão de outposts, tanto ele quanto o oponente têm ainda mais recursos de sobra. Adicionalmente, as colheitadeiras de Forged Battalion são tão duráveis que focar unidades para destruí-las chega a ser um desperdício; demora menos tempo destruir reatores – que desarmam as defesas e a manufatura de novas unidades – do que elas. Não preciso dizer que isso causa um efeito em cadeia terrível, não é?
Uma economia onde recursos são abundantes e a obtenção dos mesmos ocorre de maneira rápida significa que não é preciso se preocupar em estar financeiramente limitado, portanto criar novas unidades não era mais questão de “quanto custa”, mas mais de “quanto tempo leva pra produzir”. Dez minutos de partida e eu nadava em unidades, as jogava contra a base inimiga como se fossem bolas de papel.
Existem inúmeras maneiras de prevenir que isso aconteça – seja reduzindo a taxa de créditos recebida em cada “ciclo”da colheitadeira, ou aumentando a fragilidade dessas unidades, ou aumentando o custo geral das outras unidades. O sistema incluído que supostamente deveria frear a economia é o custo das modificações de unidades obtidas através a árvore de tecnologia. Na versão 0.133, usada para a produção deste texto, isso não poderia estar mais longe da verdade.
A árvore de tecnologia atua como um “motivador” para que o jogador invista um pouco mais tempo em Forged Battalion. Ao final de cada partida o jogador recebe uma quantidade “x” de pontos de pesquisa que então podem ser gastos em tecnologias como bateria antitanque para veículos leves ou trilhos que impedem que o terreno desacelere as unidades. Ligado a isso está um “criador de facções”, onde é possível decidir que composição deve ser usada.
Essas melhorias, composições, criador de facções deveriam ser importantes; elas existem para alterar o rumo de uma batalha ou fazer com que alguém espere uma variação de unidades e se prepare para isso. O problema é que, salvo a adição de trilhos em unidades leves (como jipes), todas as outras adições são baratas e rasas demais para causar algum impacto.
Por mais que eu critique Dawn of War III pelo sistema de desbloqueio de doutrinas – melhorias aplicadas a unidades durante uma partida – elas traziam impacto. Uma das minhas favoritas, por exemplo, permitia com que os Tactical Marines (unidade mais básica dos Space Marines) tivessem o dobro de movimentação fora do combate. Com isso, eu era capaz de controlar melhor o mapa e fazer a composição do meu exército funcionar melhor contra Orkz ou Eldars. Outros exemplos que poderia dar sobre árvores de tecnologia e melhorias incluem a série Homeworld – cujas batalhas fazem o jogador realmente refletir sobre como e quando deve investir na pesquisa de uma nova unidade – e Sins of a Solar Empire, ainda o meu “ponto de referência”. A junção de 4X com estratégia em tempo real criada pela Ironclad Games é excelente principalmente por conta da sua árvore de tecnologias; não tira o foco do combate e deixa o jogador ajustar a direção do seu império de acordo com as ações dos outros jogadores. Soa simples, mas é isso que uma árvore de tecnologia precisa ter: que as decisões tenham mais significância.
De pouco adianta liberar uma arma antitanque ou química se eu não consigo entender o efeito que ela causa. Armadura? Só para deixar a unidade mais pesada mesmo. Aumentar o custo de $400 para $450 em um jogo com um fluxo de caixa quase constante (devido à facilidade de obtenção de materiais) é, no mínimo, risível. Se não fosse pelas unidades com mísseis eu nem mesmo teria me importado com o criador de facções e a árvore de tecnologia. Mais de duas unidades diferentes (uma com mísseis e outra com lança-chamas, por exemplo) e o combate de Forged Battalion rapidamente se torna um caos. São tantas cores vindas de disparos de canhões que ao invés de gerar algum reforço positivo por parte do jogador, afeta profundamente a legibilidade e não ajuda a mitigar o fato que as batalhas tendem a acabar do mesmo modo que acabavam na série 8-bit: vence quem tem mais unidades.
E ainda assim escrevo esse texto após terminar minha quinquagésima partida. Por que? Porque Forged Battalion para mim é “comfort food”, é o lanchinho que eu pego na sexta a noite quando não planejo comer nada mais elaborado. Eu já estou acostumado com a estrutura, já sei o que e como devo fazer; as novidades? Pouco influenciaram a batalha.
Certamente é um jogo divertido, mas dizer que um jogo de estratégia “é divertido”, ainda mais quando se fala da Petroglyph, não cola mais. Eu posso comentar o mesmo sobre Grey Goo, 8-Bit Armies, certamente metade do catálogo. Divertido é aceitar que a desenvolvedora optou pelo menor denominador comum, pois se um jogo não atinge a proposta de diversão (sendo esta a originalmente planejada), algo houve em seu desenvolvimento.
O que eu espero da Petroglyph é que ela entenda como renovar a fórmula, que ela atraia um novo público e pare de se escorar no saudosismo e nostalgia; mesmo que isso não seja o intuito aqui, é o resultado atual. Isso não significa que Forged Battalion não tenha os instrumentos (e o potencial) para atingir tal objetivo, e minha expectativa é que tanto a legibilidade de unidades quanto a árvore de tecnologias sejam de fato aprimoradas no futuro. Vai continuar a ser meu lanchinho? Vai, mas não esperava comê-lo de forma tão indiferente.