Assumo que as minhas expectativas não estavam altas para Dusk (R$37,99, com o primeiro episódio já disponível) , um shooter que sinalizava todos os elementos inspirados por games dos anos 90 como Quake, Doom, etc. Você sabe como é né, homenagens e tal. Onze fases depois, a única certeza que tenho é que o desenvolvedor David Szymanski não presta uma homenagem, mas sim cria um jogo que entende como um arena shooter funciona.
Salvo a temática, muitos tendem a olhar para Doom e Quake e coloca-los sob o mesmo patamar. Ande, encontre chaves, segredos e lute contra seres bizarros em arenas. A diferença primordial, e que muitos desenvolvedores tendem a ignorar, é o quão claustrofóbico e inquietante Quake consegue ser. É dessa claustrofobia que DUSK se alimenta.
Existe uma peculiar percepção de que pelo conceito de “arena shooter” ou “old-school shooter” todas fases têm de ser segmentadas em momentos de calmaria e arenas repletas de inimigos. Não que o modelo seja errado, funcionou especialmente bem no “reboot” de Doom, se mantém atemporal em Serious Sam e é uma opção viável. Só não é a única. O efeito veio à tona principalmente com o aumento de shooters “roguelikes”, onde arenas e verticalidade são tão constantes que acabam por perder o impacto. Um design excepcional de fases sabe quando e como injetar tensão e quando é preciso reduzir o ritmo. É difícil atualmente encontrar um shooter que consegue exaltar a importância do uso de espaços abertos e fechados como Dusk. Szymanski faz parecer até um trabalho fácil.
As primeiras fases estabelecem a temática, a bizarra cidade de Dusk. Ocultismo, grupos de fanatismo. Uma mistura de “Viagem Maldita” com “A Colheita Maldita”, mas com o plot twist de que o protagonista não tem medo de nada. Não tarda até que os pântanos se transformem em minas, cidades abandonadas e igrejas que escondem um passado sombrio. Uma trilha sonora sombria acompanha o jogador por toda a jornada, sendo interrompida apenas para imensas explosões de metal com as excelentes músicas de Andrew Hulshult na melhor maneira de dizer “agora a coisa ficou séria”.
Na medida em que avançava nas fases, percebia como Dusk consegue reforçar a ideia de que o jogador tem as ferramentas necessárias para vencer, por assim dizer, e ao mesmo tempo o deixa profundamente vulnerável. Um cultista — um dos inimigos mais comuns do jogo — pode soar como algo fácil de ser resolvido com um bom tiro de espingarda na cara. Isto é, até você entrar em uma mina, descobrir que uma sala está repleta deles e ser obliterado em instantes.
Esta dinâmica de desenvolver momentos de tensão e reduzir imaginariamente a capacidade do jogador de solucionar uma situação é um dos elementos que muitos shooters que prestam “homenagens” tendem a esquecer. Por mais que eu adore STRAFE — mesmo com seus inúmeros problemas — é um jogo que constantemente coloca o jogador contra uma quantidade ridícula de inimigos justamente para o diminuir.
DUSK não tem medo de te enfiar em uma sala apertada repleta de monstros e também não hesita em abrir uma fase e te deixar atordoado e sem rumo por alguns instantes. Ghost Town é uma dessas, onde após sair de um bueiro, me encontrava em uma cidade abandonada, sem a menor ideia de onde seguir e instigando um pouco de exploração. Nesta mesma fase me peguei na luta entre a vida e a morte quando adentrei uma casa e fui recebido por uma saraivada de balas vinda de soldados e um espantalho com uma espingarda. É, eu sei, um espantalho com uma espingarda. Quase sem espaço para me movimentar, rapidamente recuei para uma área mais aberta, onde pude eliminá-los com certa facilidade.
O pequeno exemplo demonstra o quão variado pode ser o combate de Dusk, mesmo que ele funcione dentro das convenções mais tradicionais dos shooters clássicos. Atire, pule, encontre áreas secretas, use chaves ou runas para abrir portas e obtenha um ou outro powerup. Também apresenta o quanto você pode dimensionar o impacto do combate e da própria fase em si quando se entende os pontos fortes e fracos de um jogo.
E bom, Dusk não seria um shooter competente (até então) se não fosse pelo componente principal, as armas. Se você é daqueles que gostam de ver uma espingarda dizimar um inimigo em pedaços de carne indecifráveis, está no lugar certo. Ao menos no primeiro episódio elas não fogem do tradicional, com uma “saudável” variedade entre rifles, metralhadoras, espingardas de cano duplo ou a opção empunhar duas espingardas ou duas pistolas. Agora, o som é coisa de outro mundo. Mais uma vez Szymanski prova que entende que não é só o aspecto visual que tem de ser levado em conta, a eficácia e principalmente o impacto que essas armas causam são tão importantes quanto.
Nada grita “shooter clássico” na minha mente do que sair quicando pelo mapa ao usar bunny hopping (pular seguidamente para ganhar velocidade), rapidamente mirar em um inimigo, o ver desaparecer em uma nuvem de sangue, deslizar pelo chão, pegar munição e me esquivar de granadas, bolas de fogo e qualquer outro projétil que for jogado na minha direção. Acompanhado da trilha sonora mencionada anteriormente, é justamente o tipo de situação que me enche de adrenalina. No caso de Dusk, de esperança.
Depois de terminado as missões, aproveitei da excelente seleção de fases para testar diferentes armas (algumas não disponíveis nas fases), ver o quão rápido conseguia chegar até o final e tentar encontrar os segredos de todas as fases — uma tarefa mais complicada do que imaginava. Mesmo que não seja um speedrunner, saber que Dusk tem uma opção para criar timestamps, além de diversas artimanhas para cortar caminho pelas fases — como usar caixas para ganhar impulso e propositalmente pular segmentos inteiros — me deixa empolgado para possíveis aparições em eventos de speedrun, ainda mais sabendo dos inúmeros truques que a comunidade foi capaz de fazer para cortar tempo em Quake 2.
Se dependesse de mim — o que ainda bem que não é o caso se não já teria tomado decisões drásticas — já estaria com todos os episódios de Dusk em mãos. Assim como aconteceu com BattleTech, Dusk entra na lista de “jogos que estou demasiadamente entusiasmado”, coisa que não acontece com frequência. A ideia de que não apenas os outros dois episódios, mas também um modo multiplayer, três arenas de “Endless Mode” e ainda suporte a mods estão no pacote pintam um futuro excelente para Dusk.
De tempos em tempos eu me pego lutando para ficar motivado com novos shooters. A onda de “hero shooters” não me atraiu, o foco demasiado no competitivo me cansa e a busca por um shooter mais “old-school”, é constante na minha vida. No começo de 2017 me peguei com vontade de jogar um pouco de Tribes, gastar umas horas em Unreal Tournament 99 ou completar mais uma vez a campanha de Quake.
Eu não sei se isso sou eu me prendendo a nostalgia ou com saudade de um subgênero que agora se tornou quase de nicho. Se Dusk conseguir preencher este nicho, — ainda mais com a chance de termos um multiplayer simples, direto e com aquele clássico Deathmatch que eu amo tanto — já vai me fazer imensamente feliz. Por ora, vou rejogar as fases até enjoar.