“Pera, calma, é sério que você pode fazer isso?”, foi a minha reação após criar uma imensa armadilha com um galão de água e um cabo de eletricidade rompido e ver zumbis caírem na minha frente que nem moscas. Até então eu pensava que Dead Island 2 (Epic Games Store / Xbox / PlayStation) ia ser mais uma iteração de bater em zumbis até você ficar cansado ou, na melhor das hipóteses, um jogo divertido caso jogue com amigos. Caros leitores, eu estava muito errado.
O jogo, que teve seu desenvolvimento reiniciado mais vezes do que eu tendo que refazer uma build em um Action RPG, parece ter encontrado a desenvolvedora “perfeita” com a Deep Silver Dambuster, que vem trabalhando nesta versão desde meados de 2018. Ao menos é o que senti com as sete horas que eu joguei da build de preview.
Para quem está vindo de Dying Light e Dying Light 2 — basicamente sucessores espirituais da franquia, mas pelas mãos da Techland — vão tomar um baque. Dead Island 2 começa lento e continua lento por boa parte do tempo. Não é um jogo onde você detona hordas de zumbis como um exército de uma pessoa. Claro que ele te dá as ferramentas para destruir zumbis atrás de zumbis, mas a sua sobrevivência é tão importante quanto.
Após ver o seu avião cair, você pode escolher um de múltiplos personagens. Cada um tem sua peculiaridade e atributos específicos. Carla — com quem eu mais joguei — é capaz de usar armas pesadas como ninguém, e até mesmo acertá-las no chão para atordoar os zumbis, mas não tem a agilidade de outros personagens como Amy ou Bruno. Bloquear — e aprender como bloquear — ataques é uma característica essencial para sobreviver por mais de dois minutos em uma Los Angeles infestada de zumbis.
Assumo que eu não estava dando nada pelo jogo; mesmo depois de um recente trailer que foi divulgado pela Deep Silver, eu continuava a pensar “Ah, Dead Island 2 não vai ser tudo isso, vai ser mais do mesmo, o seu personagem vai ser mais um daqueles ‘imunes ao vírus’ e eles vão acabar incluindo algumas conveniências do que consideramos ‘AAA’ para enterrar de vez o meu interesse”.
A primeira hora de jogo, como disse acima, quase comprovou isso. Os inimigos vinham lentamente na minha direção, eu os despachava com certa facilidade e via sangue, órgãos e tudo o que você pudesse imaginar voando pela tela. Cortesia do novo sistema de dano localizado que de início parecia só um espetáculo técnico e uma amostra de como a Deep Silver Dambuster conseguiu “evoluir” o gore da franquia após todos esses anos. (Mais sobre isso em breve.)
Foi só depois de eu fazer algumas missões críticas da campanha principal que “Dead Island 2” finalmente se abriu para mim e falou “Pronto, se vira, faz o que bem entender”.
Devo salientar que “Dead Island 2” não é um jogo de mundo aberto como Dying Light 1 e 2, mas sim um jogo dividido em grandes áreas, ou melhor, playgrounds de destruição. Ele não segura a sua mão — e com isso quero dizer que ele não vai te indicar todos os itens que estão no mapa, ele não vai ficar te importunando para seguir a quest principal, nem se preocupar em apontar os locais com mais materiais para você melhorar ou consertar as suas armas.
Considerando o quanto a indústria tem se escorado nesse senso de direção e “ajudinha” para fazer com que o jogador não se sinta perdido, jogar “Dead Island 2” veio com um gigantesco ar de alívio. As áreas são grandes o suficiente para eu não me sentir perdido, mas ao mesmo tempo conseguem gerar um grau suficiente de curiosidade para me fazer parar no meio de uma rua de Bel-Air e me perguntar “Ok, se eu seguir reto eu vou continuar a campanha, mas o que pode haver dentro dessa casa?”.
As respostas para essa pergunta variam. Na maior parte do tempo, era “mais zumbis”, e nunca vou dizer “não” pra isso. Outras vezes eram materiais, ou uma “receita” para criar mods para as minhas armas, ou mesmo uma sidequest com algum personagem extravagante. Com a exceção das sidequests, que são marcadas no mapa, todo o resto cabe ao jogador descobrir. E a Dambuster usa e abusa de pequenos quebra-cabeças para te deixar interessado ao longo da história.
Um dos pontos altos neste aspecto para mim foi a minha contínua tentativa em abrir uma guarita. Tentei a porta e o jogo me avisou que eu precisava de uma chave. Ok, hora de procurar a chave. Devo ter passado 30 minutos lutando contra zumbis na esperança de que um deles por acaso tivesse a chave, e nada da sorte sorrir para mim. Foi então que eu notei um sistema de alarme.
“Ei, deve ser isso; talvez, se eu desativá-lo, a porta abra”. A porrada que eu dei com o taco de golfe fez justamente o contrário; ativei o alarme e mais uma horda veio atrás de mim. Assim que eu dei conta deles foi que eu reparei um pequeno circuito atrás da guarita. Era este maldito circuito que eu tinha que ter quebrado antes de quebrar o alarme.
Depois de mais uma volta ao redor da guarita eu reparei o mesmo circuito dentro da guarita. “Não, não pode ser”, disse para mim mesmo. Peguei a arma mais fraca que eu tinha, joguei dentro da guarita e consegui desativar todos os sistemas de segurança. Minha recompensa foi uma quantidade absurda de materiais e um poderoso bastão que me foi muito útil pela próxima hora da jogatina.
“Mas Lucas, isso não é nada de especial!” Tá, eu concordo, mas leve em consideração que a Dambuster estava confiante o suficiente de que os jogadores iam conseguir resolver aquele pequeno quebra-cabeça sozinho sem ter os personagens gritando no seu ouvido a cada segundo com a solução — uma tendência que só vem crescendo e eu a abomino — que não marcou nem a câmera de segurança ou o circuito com “símbolos especiais” para que ficasse óbvio o que devia ser feito.
“Dead Island 2” abraçar elementos como o uso de “baits” — que são equipamentos especiais para atrair zumbis para uma armadilha ou criar novas rotas de fuga — também foi uma boa surpresa. O antecessor tinha lá as suas armadilhas, mas a maioria era fixa. Um excelente exemplo fora das missões foi eu ter criado uma imensa trilha de gasolina com um barril e depois acertar com uma espada um botijão de gás, criando o mais puro caos — ver zumbis tendo a pele derretida / queimada foi grotesco, mas satisfatório.
Outra evolução excelente da franquia é o próprio sistema de níveis, que muda as terríveis habilidades passivas por uso de cartas. Algumas são exclusivas do personagem que você joga, outras podem ser compartilhadas por personagens com arquétipos similares. No caso de Carla, uma das suas melhores habilidades era uma forma de “parry”: Bloqueie na hora certa e você ganhará um bônus de dano contra um zumbi. Aprender a bloquear foi um pouco difícil no mouse e teclado — creio que o sistema não está totalmente refinado — mas assim que eu peguei o jeito, foi só felicidade.
Essas surpresas continuaram até mesmo na forma como a história de “Dead Island 2” é contada. Ainda que tanto as missões principais e secundárias abracem o exagero e o absurdo com personagens caricatos — mas não irritantes como os de Saints Row (2022)—, a Dambuster mais uma vez soube equilibrar a exposição com colecionáveis opcionais que contam melhor as horas que antecedem a implosão de zumbis em Los Angeles. “Dead Island 2” não vai te fazer chorar, mas ao menos não joga tudo ao exagero.
Claro que sete horas de jogo é muito pouco para avaliar um jogo como “Dead Island 2”, portanto eu permaneço com algumas ressalvas em relação a vários sistemas dele, majoritariamente o sistema “Flesh” de dano localizado.
Como eu falei no começo do texto, ainda que ele seja fantástico de um ponto de vista técnico, eu senti que ele não é tão útil em desmembrar zumbis sozinho, e precisa ser combinado com o cenário. Não que seja algo negativo, mas, como alguém que joga majoritariamente sozinho, ter a chance de deixar os zumbis mais “lentos” para não ser atacado de primeira e acabar morrendo soa como uma excelente ideia — se não estivesse relativamente atrelado ao sistema de níveis. Ou seja, quanto mais forte, mais fácil vai ser arrancar a perna de um zumbi. Ironicamente, estourar a cabeça de um com uma pisada pode ser feito desde o começo do jogo.
Quem deve se sair melhor nesse aspecto serão os personagens com maior agilidade e maior proficiência no uso de armas cortantes. Amy, Ryan e outros com cartas-habilidade irão fazer picadinhos dos zumbis com o sistema “Flesh” e poderão acabar sendo preferências para quem decidir jogar sozinho.
Outra preocupação minha é o sistema de armas e criação das mesmas. Onde o primeiro “Dead Island” tornava as armas “fúteis”, já que elas quebravam com facilidade, sinto que a sequência vai para um caminho contrário, e elas duram um tanto demais para o meu gosto. Não é um grande problema na primeira hora ou até a sétima hora. Mas o que acontece quando eu estiver no final do jogo? Quais serão os incentivos para eu mudar o meu estilo de combate? E outra, “Dead Island 2” terá armas de fogo; o quanto isso impactará o grau de dificuldade?
Vi alguns zumbis “raros” como um com colete de granadas e outros que correm em sua direção (apesar de que correr é um termo muito forte; ele dá uma corridinha como alguém que está tentando pegar um ônibus que acabou de parar no ponto). Haverá mais variedade na versão final? Meu maior medo é que “Dead Island 2” mostre todas as suas cartas nas primeiras horas e acabe virando um tédio no restante, e assim acabe ficando no lugar como “um bom jogo, mas melhor em coop”.
Ainda que eu tenha todas essas ressalvas e perguntas não respondidas, saí surpreso do meu tempo com a versão de preview, e quero ver muito mais do que o jogo tem a oferecer. Acredito que depois de tanto tempo e tantas desenvolvedoras, “Dead Island 2” está em um ponto de equilíbrio geral fantástico — e, por mais que siga algumas tendências do mundo “AAA”, ele ainda é, no fundo, “Dead Island”, e isso por si só já me faz muito contente.