Conto nos dedos as vezes que eu vejo um mod que altera o jogo base o suficiente a ponto de torna-lo quase indistinguível, ou, ainda mais, o tornar mais próximo do que eu desejava. Um deles é o Wikinger: European Theater of War para o Company of Heroes 2, que está disponível tanto via Steam Workshop como via o ModDb (instruções para instalação).
Apresentado para mim pelo também excelente Waywyard Strategist (se você tem uma conta no Twitter, você deveria segui-lo), Wikinger basicamente é uma resposta da comunidade para a adição de granularidade e peso ao game de estratégia da Relic, sem que ele perca as características da sequência.
Jogável tanto em modo contra a IA ou via partidas online personalizadas, gastei a minha última semana lentamente o aprendendo e me deliciando com as mudanças. Além das quatro facções base do jogo (Estados Unidos, Reino Unido, União Soviética e Alemanha), ele adiciona outras 16 subfacções. Aqueles que jogam com tropas Norte-Americanas podem se focar em uma divisão de artilharia ou possivelmente em infantaria ou até apoio aéreo.
Funcionalidades similares já estavam presentes Company of Heroes 2, mas não com o grau de complexidade que o Wikinger oferece. A árvore de habilidade dos comandantes era linear, enquanto no mod cada subfacção ganha uma árvore não-linear, o que basicamente triplica a possibilidades de match-ups nas partidas.
Comecei minhas experimentações com as subfacções diretamente com o exército dos Estados Unidos contra a União Soviética e rapidamente me deparei com uma mudança gritante, o custo e uso de veículos.
Company of Heroes 2 se apoia em demasia na sobrevivência de veículos, como os tanques usados por facções como a Alemanha para seu end-game. Um custo alto de materiais como combustível e munição os tornam peças essenciais e, dependendo do mapa, indestrutíveis para a maioria dos jogadores. Wikinger acaba com essa barreira ao tornar a proteção desses métodos de transporte mais realista. Um tiro de Bazooka certeiro em um Panzer IV não irá somente danificá-lo ao ponto de requerer reparos, mas sim destruí-lo.
Cria-se, portanto, um interessante cenário onde o jogador — no caso eu — começava a redobrar meus esforços de posicionamento das tropas, algo já comum na franquia, mas que agora tinha um ar de Dawn of War 2.
Sim, o clássico da Relic (ao contrário do decepcionante Dawn of War 3), recebido na época de maneira morna pela comunidade dado ao foco em táticas e a ausência de construção de bases, ressurge em alma dentro de Wikinger. Unidades especiais, como médicos que podem curar em área, e a opção de colocar suas tropas deitadas no chão com um atalho ao invés de depender da boa vontade da IA, transforma o campo de batalha.
Recomendo assistir essa intensa partida PVP do mod
Em um dos mapas testados, o belíssimo Rasputitsa, me peguei diante da seguinte situação: três grupos de tropas soviéticas controlavam um ponto, porém eu não queria investir mais soldados na região pois desequilibraria minha frente de batalha. O que fiz? Peguei um grupo de paraquedistas e os fiz rastejarem até próximo do local. Os posicionei atrás de uma pequena montanha de neve e, com duas granadas, causei destruição suficiente para que elas batessem em retirada.
Perceba como foi importante a troca, absorção e o uso de informações limitadas nessa situação. Estava ciente que meu oponente ainda não havia me visto, pois suas unidades não abriram fogo. Ao mesmo tempo, estimei que ele deixou as tropas próximas ao ponto de captura, algo que tende a não ser uma tática viável e, ao saber que o mod não coloca mais o contador de tempo para uma granada explodir, e aumenta o seu raio de dano, pude criar um elemento de surpresa.
É essa surpresa que Wikinger se apoia muito, um campo de visão reduzido, retirar informações que podem ser consideradas cruciais para decisões e fazer com que o jogador fique mais atento a batalha em si do que números na tela. Com essa ideia em mente, que redobrei o uso de cortinas de fumaça nos minutos finais da partida — mecânica que considero pouco útil no jogo base — e comecei a enxergar os mapas de uma nova forma; não só para estabelecer pontos de defesa, mas para encontrar pontos cegos com maior frequência. Ensinamento, esse, que serve para qualquer jogo de estratégia em tempo real. Quando vi já haviam passado horas, estava na décima sétima partida e ainda descobria novidades, como o uso de novos grupos específicos de soldados para captura ou de personagens “heroicos” com habilidades únicas. Ideia melhor aplicada pelo mod do que em Dawn of War 3.
Não que Company of Heroes carecesse de momentos como esse, mas é a forma que Wikinger os traz à tona que importa. Saber que eu tenho um maior controle sobre as minhas tropas — mesmo que isso aumente o micro gerenciamento — me dá uma tremenda alegria.
Em maio desse ano, Brendon Chung, desenvolvedor de Quadrilateral Cowboy e Thirty Flights of Loving, descreveu brevemente em seu blog o que tornou Company of Heroes tão inovador: posicionamento, flanqueamento, o uso de barricadas — tanto naturais como construídas pelo homem — para defesas. Tanto o primeiro quanto o segundo são games que eu considero atemporais. Fogem do macro de jogos como Total Annihilation ou Ashes of the Singularity, e são praticamente únicos em sua execução.
Por mais que eu desaprove decisões feitas pela Relic na tentativa de criar a tal “granularidade” (inclusão de habilidades passivas que precisavam ser definidas pré-partida e “builds” muitos rígidas), ver como a comunidade aplica seu toque especial — seja por Wikinger ou outros mods — é que me faz lembrar por que gosto de jogos de estratégia.
No final de setembro eu havia escrito sobre como a atualização Closer Combat acabou com a estagnação de Steel Division e, embora Company of Heroes 2 não sofresse do mesmo problema, me deu motivos de sobra para reinstalá-lo.
Se você andou com saudade de Company of Heroes 2, quem sabe não essa é a sua chance também?
Links interessantes:
- Algumas artes conceituais de Diablo 2 ressurgiram no Mobygames – é bom lembrar que resgatar a história dos jogos é importante.
- An Ode to the Brilliance of Roguelikes por John Brownlee – Um belo texto sobre a influência de roguelikes no design minimalista
- Current Mood no Itch.io – Delicioso joguinho sobre humor. Recomendo que passe bastante tempo na parte “felicidade”.
- A linguagem da revolução Soviética – Não ligado a jogos, mas o Moscow Times publicou na última semana uma concisa e rica retrospectiva nas mudanças da língua durante a revolução de 1917