Nada define melhor “perseverança” do que passar um mês dissecando, buscando informações e tentando entender um jogo. Command: Chains of War, a segunda expansão para o wargame Command: Modern Air / Naval Operations (CMANO), é um destes exemplos. Reencontrar o Wargame da Warfare Sims depois de três anos tem sido uma experiência singular.
Chains of War funciona como uma expansão “standalone”, onde jogá-la sem uma noção prévia das mecânicas é o mesmo que comprar uma fazenda e não saber plantar uma planta. Não, não é um exagero. Tanto a expansão como a atualização 1.12 para a plataforma desenvolvida pela Warfare Sims atingem um patamar que não esperava.
Quando escrevi sobre CMANO em 2013 eu tinha uma noção básica de como funcionava parte dos sistemas do jogo. Quase quatro anos depois e me deparo com uma dúzia de novas mecânicas que não apenas o enriquecem, mas também me fazem me sentir completamente inapto para jogá-lo.
Enquanto a primeira expansão, Northern Inferno, se foca em limitar as ações do jogador a tecnologias desenvolvidas e presentes durante a Guerra fria, Chains of War segue o caminho inverso e olha para o futuro do combate bélico — e eletrônico — em um cenário hipotético de guerra entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul. Ambientação que ultimamente, dado o aumento das tensões na região e no mar da China, se mostra levemente incômoda para um wargame.
Da mesma maneira que a Graviteam e a Fury Software fazem em seus jogos, a Warfare Sims não almeja enaltecer a posição de um dos lados ou dos outros países participantes do conflito — que incluem os Estados Unidos e a China. Ela delimita um espaço virtual para a simulação, definição de ordens e conquista de objetivos. Nenhum dos lados recebe prêmios ou condecorações no final. Uma pontuação é dada de acordo com o seu desempenho naquela situação e mais nada.
Porém, o aspecto intrigante de Chains of War não reside na forma que os cenários são dispostos, mas a um novo grau de granularidade que eles são moldados com as novas mecânicas inclusas na atualização 1.12.
CMANO sempre foi um exemplo de um jogo imensamente complexo e profundo, mas ainda com uma camada considerável de abstração. Anteriormente cada avião era modelado de acordo com uma “barra de vida” que ia de 0 a 100 e mais nada. Em Chains of War os aviões podem ter as suas estruturas danificadas de acordo com o calibre da arma, posição e ângulo que foi atingido.
Não há melhor jeito de exemplificar a minha não consideração com as novas mecânicas do que a minha pequena história sobre o meu constante uso de bombas guiadas a laser e mais nada. Antigamente era só armar alguns aviões F-16C com GBU-12, enviá-los para a zona inimiga e torcer para que um deles saia ilesa do conflito. Eu sei, não precisa me dizer que era uma ideia idiota, entretanto, ela funcionava muito bem até essa expansão. Foi já na primeira missão que a tática ridícula, para não a chamar de outro nome, resultou em três aviões severamente avariados e um sem comunicação com a base.
E em Chains of War, não há nada mais assustador do que perder a comunicação com o restante de um esquadrão ou uma frota.
Comms Disruption — função exclusiva para quem possui a expansão — é um evento onde ocorre a perda de conectividade entre um porta-aviões, navios ou outros aviões dentro de uma área, podem ser ocasionados devido a avarias na estrutura de uma das unidades, ou as recém-implementadas bombas eletromagnéticas. Ou seja, uma bela de uma fritada em todos os sistemas eletrônicos. Na minha primeira situação de crise durante uma missão cheguei a ter um contato no radar de um dos aviões que patrulhava a área, porém devido a intensidade da região onde ele estava situado, presumi imediatamente um contato hostil e o abati. Peço desculpas, piloto sem nome do F-16C.
A complexidade dos cenários de Chains of War não é algo a ser levado como brincadeira. Grande parte dele requer esforços por terra, ar e mar ao ponto de sincronizar ataques em regiões separadas para que não houvesse chance de retaliação. Sincronia de ataques é um dos pontos que, infelizmente, ainda peca em CMANO dado o sistema de missões.
As missões são usadas para de certa forma “facilitar” a já não tão amigável interface — que você só vai entender se for um oficial da marinha, o que não sou, ou paciente assistir uma série de tutoriais e ler um manual de mais de 500 páginas, o que sou — é preciso designar uma área de atuação para as tropas e qual a operação a ser efetuada. O problema é que apenas por meio do editor de cenários que se pode inserir gatilhos para que todos os ataques sejam realizados ao mesmo tempo. O que torna as operações presentes em Chains of War ainda mais aterrorizantes.
Em um deles era encarregado de destruir uma artilharia costeira ao norte da Coréia do Norte para que as tropas de invasão não fossem atingidas. Armado com alguns mísseis ar-terra e bombas, tive de manualmente ajustar a velocidade de voo e altura de cada avião até que eles ficassem sincronizados e disparassem em conjunto. Para fins de exemplificação, uma tarefa dessas durou 40 minutos. Sim, quarenta minutos de olhar para a uma tela em preto e ver pontos em azul irem lentamente do ponto “A” ao “B”.
Só por favor, não me peça para escolher um cenário preferido de Chains of War, pois é uma tarefa impossível. Cada um deles tem pontos fortes e fracos e vão de coleta de inteligência sobre defesas inimigas, avanço para o pacífico via submarinos ou uma emergência causada por uma bomba de pulso eletromagnético. Nem parece que é a mesma empresa que desenvolveu a campanha-base do jogo original tamanha são as novas ideias inclusas nos doze novos cenários.
Eu continuo a bater na tecla de que tanto CMANO como Chains of War são jogos para uma parcela seletíssima da comunidade de estratégia. Ao mesmo tempo, quase imploro para que joguem, pois não consigo pensar em nada que possui tamanha profundidade, granularidade e um banco de dados tão rico quanto o que a Warfare Sims conseguiu cultivar nos últimos anos.
O prazer que extraio de CMANO é o mesmo o de folhear páginas dos manuais de simuladores, aprender como funciona a campanha dinâmica de Falcon 4.0 ou como levantar voo com um A10-C no DCS World. A barreira de entrada beira o impenetrável. Códigos, menções de armamentos que jamais ouviu falar e horas de frustração. Quando tudo se encaixa, poucas coisas trazem a mesma emoção que estes simuladores, ou completar uma missão de Chains of War.
Como a própria desenvolvedora pontuou muito bem em um dos seus blogs. Para muitos de nós que jogamos wargames, os jogos vão além de uma mera demonstração de um cenário de combate. É uma ferramenta para, superficialmente, compreender possíveis situações de risco naquela região e quais são os principais combatentes. Normalmente jogo-os com um livro de cabeceira, assim como fiz com Dien Bien Phu da John Tiller Software enquanto lia The Last Valley. Uma pena não poder repetir o mesmo, devido ao tempo, com os cenários restantes de Chains of War — que de acordo com as minhas contas, ainda devem durar mais uns meses até completa-los. Depois disso é hora de partir para os novos cenários criados pela comunidade.
Depois de quase três anos longe de CMANO agora tenho a mais absoluta certeza de que o wargame é uma referência tão grande quanto The Operational Art of War, Gary Grigsby’s War in the East e até os visualmente antiquados títulos da John Tiller Software. Chains of War mostra que há uma escalabilidade enorme para a plataforma, e sinto que isso é apenas o começo para a Warfare Sims.
Se você tem interesse em conhecer mais sobre o CMANO de maneira geral, eu recomendo dar uma lida no Of Real and Simulated Wars, onde o JC comumente posta sobre o game (e wargames) e certamente tem mais experiência do que eu.