Deixa eu te perguntar uma coisa antes de você começar a ler esta crítica: Você se estressa muito jogando jogos online? Se sim, quanto? Ao ponto de desinstalar o jogo? Capaz de entender que foi só uma partida e que outras melhores virão? A pergunta é crucial para entender o quão disposto você vai estar ao lidar com “Warlander” da Toylogic (Steam)
Depois de um longo período em beta fechado, e um curto período em beta aberto, eu me apaixonei pela primeira vez por ele quando escrevi as minhas primeiras impressões no final do ano passado. O conceito que o faz ser tão interessante é ter exércitos de 40 ou 100 jogadores lutando em um campo de batalha por torres, destruindo castelos, construindo fortificações ou instrumentos de defesa, e criando laços diplomáticos que podem ser anulados a qualquer momento. O vencedor é aquele que não teve o núcleo do seu castelo destruído.
Para que isso não vire uma completa desorganização, o jogo separa os exércitos em esquadrões, que são supervisionados por um comandante geral que define as ordens e tenta – no melhor da sua capacidade – guiar todos para completar objetivos específicos. No momento ele possui dois modos de jogo, “2 army battle” e “5 army battle”, e dois mapas. O primeiro modo separa 40 jogadores em 2 exércitos de 20 jogadores cada. O segundo separa os 100 jogadores em 5 exércitos de 20 jogadores.
Outro ponto que eu imaginava ser uma solução sensacional era saber o quanto de complexidade adicionar nas partidas iniciais e quando elevá-la, à medida que o jogador aprende mais sobre si, os mapas e as três classes – Clérigo, guerreiro e mago. Para que isso ocorra de forma “sutil”, o jogo utiliza dois sistemas de níveis: um nível “geral” para cada personagem, e um nível determinado pela pontuação que você atinge durante uma partida, chamada “Valor”.
Quando eu joguei o beta, minhas expectativas estavam lá em cima. Todo mundo jogava de maneira coordenada, esquadrões dedicados a defesa de castelos faziam de tudo para impedir uma invasão do inimigo, esquadrões de ataque tentavam capturar torres, e esquadrões especializados driblavam a defesa do inimigo para destruir o “núcleo” do castelo e assim vencer a partida.
Assim que ele foi liberado ao público, a melhor maneira que eu posso descrevê-lo é “caos generalizado”. E não é por conta de um tutorial fraco ou a ausência de objetivos claros, muito menos incentivos para que esses objetivos sejam completados. Isto é simplesmente o que acontece quando você coloca 40 ou 100 jogadores em uma partida onde não há incentivo para comunicação.
Sim, você leu certo, comunicação. Um dos pilares que até então me pareciam certeiros no desenvolvimento de “Warlander” parece ter sido deixado de lado no início do free-to-play. As dezenas de opções de marcar objetivos ou pedir ajuda para os seus companheiros foram alteradas ou removidas completamente por motivos que eu não consigo imaginar.
Quer pedir para ser curado no meio de uma batalha? Boa sorte tentando acertar a tecla correta ou torcer para que alguém esteja com o voice chat ligado (que, por algum motivo, vem desligado por padrão em um jogo onde comunicação é tão vital). Isto quando você não acaba ficando ensurdecido pela quantidade de sons emitidos pelos jogadores — dos gritos de guerra às magias. Uma mixagem péssima de som, que só com muito ajuste nos menus de opções de áudio ficou razoavelmente aceitável.
Outro problema seríssimo torna a ausência de comunicação ainda mais aparente: o total desbalanceamento das classes presentes no momento. Os Magos são extremamente poderosos, guerreiros destroem barreiras como se fossem nada e os clérigos — pobres coitados — servem para curar e olha lá.
A diferença de poder entre as três classes é gritante ao ponto de ver equipes de ataque serem compostas unicamente de magos, a classe que tem menos pontos de vida, e ainda assim serem capazes de destruir as principais fortificações do oponente em menos de 5 minutos de partida (de um total de 15). Boas notícias pra mim, imagino,, que decidi ser suporte e jogar de clérigo.
Não quero chegar a extremos e dizer que é “injogável” ou “dolorosamente frustrante”. Eu gosto de um jogo que gera este “caos generalizado” de tempos em tempos. Eu não me importava em morrer dezenas de vezes em uma partida desde que eu estivesse de uma forma ou outra ajudando a minha equipe com curas ou buffs. Só que, bem, eu não estava tanto assim, de tanto que eu morria.
Até então minha experiência com “Warlander” vem sendo a seguinte: eu olho para o ícone na minha área de trabalho e penso “Bom, vou jogar uma ou duas partidas, e parar”. Faço as duas partidas, venço ou perco e sigo com o resto do meu dia.
Você pode ter lido a frase acima e pensado: “Bem, o Lucas tem um relacionamento saudável com jogos multiplayer!”. De fato eu tenho, mas não era esse o motivo que eu me limitava a tantas poucas partidas. Mais do que isso e eu ia acabar perdendo a minha paciência com o desbalanceamento do jogo.
Quer saber como uma partida de 100 jogadores separados em 5 equipes de 20 jogadores cada se resolve? Quem tem mais magos com poderes mais altos vence. Táticas? Esquece. Estratégia e comunicação ou alianças entre comandantes? Se elas ocorreram em algum ponto, eu não vi.
Outra decepção foi a mudança de um mapa mais abrangente para as partidas de 2 exércitos em um típico mapa de “3 lanes”. Se por um lado facilita o aprendizado para novatos, por outro cria estratégias óbvias e pouca dificuldade de manobra. A razão pela qual o jogo não saiu com ao menos 2 mapas para o modo 2 exércitos é um grande mistério.
Mas o que realmente me deixa entristecido ao jogar Warlander é o seu sistema free-to-play. Ou melhor, o seu sistema “Pay to Win”. Além de conter um passe de temporada, o jogo vende itens cosméticos, itens que podem melhorar o seu personagem e ainda te dá recompensas aleatórias no final da partida. Algumas delas úteis, outras nem tanto.
Agora você imagina o imenso abismo que sou eu, um mero clérigo que não gastou um centavo no jogo contra um mago que está com um equipamento de nível alto e me destrói em questão de segundos. Chamar de frustrante é pouco.
A Toylogic tenta “contrabalançar” essa dificuldade fazendo com que classes de nível mais alto sejam apenas acessíveis para jogadores com um alto nível de “Valor” — nome dado a pontuação recebida ao fazer ações importantes durante a partida — e ainda introduz um cooldown de 120s para que essas classes possam ser reutilizadas.
Acontece que toda ação, por menor que seja, aumenta o seu nível de “Valor”. Construir defesas ou conquistar uma torre já gera “Valor” suficiente para o abismo entre quem não gastou um centavo no jogo e aqueles que investiram ao menos no passe de temporada começar a se abrir.
O resultado? O “caos generalizado” que eu mencionei antes vem principalmente de jogadores que compraram o passe de temporada e estão se espancando no meio do mapa com unidades potentes e o restante dos jogadores ficam nos cantos tentando fazer alguma coisa para ajudar.
Eu não nego que eu acho engraçado ver dezenas de explosões e magias sendo disparadas nos mapas e bonecos voando para lá e pra cá — mesmo que isso destrua a taxa de quadros do meu computador (que possui uma 3090, e só consigo imaginar o quão pior deve ser para quem tem um computador mediano). Mas, uma hora essa graça vai acabar.
Isto não quer dizer, no entanto, que eu tive só partidas ruins. Quando os astros se alinham, algumas partidas de “Warlander” são definitivamente intensas. Uma das mais memoráveis até então foi quando eu e o meu esquadrão conseguimos defender a nossa base correndo de um lado para o outro, reforçando e construindo defesas para dar tempo suficiente para que o esquadrão especializado invadisse o castelo inimigo e causasse dano ao núcleo dele. A partida, que durou 15 minutos, foi decidida nos 5 segundos finais.
Eu estava eufórico, eu queria que isso ocorresse em todas as partidas, que todos pudessem ter a chance de encontrar um grupo que conseguisse se coordenar dessa forma (ou que você consiga convencer outras pessoas a jogarem com você). Mas eu sei que isso vai ser temporário, que aqueles que jogam sem investir dinheiro em “Warlander” mais cedo ou mais tarde vão ser deixados — e muito — para trás.
Você quer saber o que eu ganhei no final da partida onde eu defendi a base com a minha equipe? Um item cosmético chulo e uma melhoria de uma habilidade de mago. Sim, até as melhorias para as suas habilidades são aleatórias. Isto é, se você não quer desembolsar um dinheiro extra para comprar o passe de temporada e garantir que ao menos os seus equipamentos sejam bons.
Apesar disso tudo eu ainda acredito no potencial de “Warlander”? Em parte, sim, mas acho que ele foi lançado muito prematuramente e a maioria dos problemas que eu encontrei, salvo o desempenho horrível, são pontuais. A Toylogic pode muito bem repensar o sistema de valor e diminuir esse abismo para partidas mais “equivalentes”.
Pois, apesar dos pesares, o núcleo de “Warlander” é de fato divertido. O híbrido entre ataque, construção e dominação de mapas com ligeiros elementos de evolução de personagem é uma boa combinação. Ele só precisava de mais tempo no forno. Agora que ele já saiu do forno, o melhor que eu posso torcer é que ao menos mudem o tempero ou o recheio para que ele deixe de ser “o jogo que eu jogo 30 minutos por dia para não me estressar” e vire “opa sem querer gastei 3h em Warlander”.
Warlander
Total - 6
6
Ainda que tenha uma base sólida e mecânicas bem elaboradas, o absurdo desbalanceamento entre classes, a falta de comunicação e o sistema free-to-play predatório de “Warlander” o jogam para baixo. Para um jogo que eu estava tão empolgado para jogar, virar um “tira gosto” de 30 minutos por dia não era o que eu esperava. Quem sabe não irei revisitá-lo após algumas boas atualizações?