Escondam seus pertences, suas famílias, tudo o que há de valor na sua vida, pois os piratas chegaram em Total War: Warhammer II com Curse of the Vampire Coast (Steam). Bem, vampiros, mas ainda assim piratas. Notou a minha empolgação? Não? É porque, veja bem, caro ou cara leitora: eu, seguindo a eterna maré de obviedades, não sou chegado em piratas, pois sinto que muitos jogos não só carecem de introduzir o contexto socio-político que causou o aumento deles, como se apoiam em estereótipos batidos — coisas que o fantástico Pillars of Eternity 2 consegue evitar, e que agora Curse of the Vampire Coast torna desnecessárias. Afinal, falo de Warhammer, o universo mais ridículo, exagerado e sem pé nem cabeça dos games. Falo de uma nova “raça” que tem caranguejos que usam crânios de mamutes como casulo.
Assim como foi com Tomb Kings, a Creative Assembly ataca em duas frentes para te puxar de volta para a campanha Eye of the Vortex: primeiro, com a introdução de novas mecânicas, e segundo, com o reenquadramento de mecânicas anteriores. Dada a natureza vampírica deles, os quatros heróis lendários e os seus respectivos exércitos dividem certos atributos dos vampiros originais vistos em Total War: Warhammer. Corrupção vampírica é essencial para expandir o seu controle territorial e garantir bônus de combate, suas unidades de infantaria são carne para ser moída pelo exército oponente, mas podem ser facilmente recuperadas dado o seu baixo custo (mortos custam pouco, pelo visto), o que garante constantes investidas contra outros exércitos.
Ou, se você quiser e for habilidoso o suficiente, pode não controlar nenhuma cidade.
A maior e mais impactante adição de Curse of the Vampire Coast é que cada herói lendário tem o seu próprio barco especial, com uma árvore de construções inteiramente nova — muitas delas ligadas à eficácia das suas unidades em combate. Aliado a isto está a opção de, ao invés de dominar cidades, estabelecer “baías de piratas”, que funcionam como um meio termo entre território controlado e uma área escondida dentro do próprio território inimigo que gera infâmia — da qual vou falar mais daqui a pouco — e muitas moedas de ouro. Parte horda, parte conquista territorial, e parte algo diferente o bastante para precisar de um novo aprendizado, mesmo pra quem já tem experiência em TW2.
Ao contrário dos seus parentes que preferiram optar por ficar em terra firme, não existe um turno sem um tiquinho ou um tantinho de ação com os vampiros piratas. Mover o quanto antes, entender até onde se estende à frente a defesa do inimigo, atacar pontos fracos e estabelecer baías de piratas são uma necessidade se você quer passar do turno 20 sem ver sua partida sucumbir.
Um dos dois deslizes da Creative Assembly ao criar Curse of the Vampire Coast foi estabelecer o grau de “facilidade” de cada lorde lendário. Não caia no papo que a campanha de Count Noctilus é fácil, pois ele é um dos poucos lordes que começam somente com um mini-Vortex no meio do oceano. Cliquei para começar a campanha e havia tantas notificações na tela que nem sabia por onde começar. “Pera, eu tenho um barco agora? Mas e o Vortex? De onde surgiu esse monstro que agora devora barcos e ataca cidades costeiras? O que são essas novas missões?” Decidi seguir em frente aplicando o método mais tradicional que pensei: invadir regiões costeiras e roubar seus tesouros. Foi uma boa tática até descobrir que existiam outros piratas independentes no oceano com um exército muito mais poderoso que o meu, e eu não tinha a menor ideia de como funcionavam as unidades base.
Outra vez a Creative Assembly cria um ainda maior distanciamento entre os vampiros de Warhammer 1 e os piratas de Curse of the Vampire Coast com as próprias unidades base. Os vampiros piratas lutam um combate de contenção e controle de área. Suas unidades básicas possuem uma taxa menor de pontos de vida, menos proteção que até mesmo os esqueletos (que por um acaso usam armadura e, portanto, são mais resistentes; lógica de Warhammer, vai entender). Para completar o pacote, essas unidades são inicialmente mais dependentes de ataque a distância com armas de fogo do que combate corpo-a-corpo. Os verdadeiros astros são as monstruosidades capazes de destruir a moral até dos mais poderosos exércitos — exceto se você jogar Mortal Empires e entrar em combate com os anões e seus terríveis lança-chamas — com suas artilharias de longo alcance. Recue, tome controle de pontos de afunilamento, espere o inimigo vir até você e lentamente reduza os seus números. Não é fácil de aprender, ainda mais se você — como eu — está acostumado a métodos mais conservadores de combate. Avance o suficiente em níveis, e tanto o seu lorde lendário como algumas dessas unidades poderão aterrorizar os seus oponentes, reduzindo ainda mais a moral deles no combate.
Obviamente não foi o que ocorreu quando tentei dar uma de “maioral” e me meter com os outros lordes piratas. Ataquei uma dessas unidades independentes e fui devidamente massacrado. Não estava pronto para o alto-mar, portanto optei para recomeçar como Luthor Harkon, que possui um pequeno pedaço de terra na então chamada Vampire Coast, possibilitando assim uma curva de aprendizado mais dócil. Mas, ainda assim, não foi fácil.
Luthor tem múltiplas personalidades que variam a cada quantidade de turnos. Há momentos em que uma dessas personalidades dá bônus de ataque a distância e liderança, aumentando assim a moral das tropas; em outro momento, você pode pegar uma que te prejudica imensamente e deixa as suas unidades, que já são lentas, ainda mais lentas para se moverem. Foi com ele que finalmente consegui entender melhor o sistema de “baía dos piratas” e especialmente o de infâmia. Infâmia é como a moeda geral de todos os lordes piratas: quanto maior, mais poderoso ele é nos ranks, e maior a influência que ele tem no ato de completar a campanha Eye of the Vortex. Inúmeras ações geram infâmia — o estabelecimento de certas construções em cidades, saquear cidades inimigas, executar seus oponentes em combate, encontrar tesouros, etc.
Falando em tesouros, aqui está outro excelente acerto da Creative Assembly. Se os Tomb Kings procuram por relicários em diversas áreas dos mapas, os vampiros piratas fazem caça ao tesouro. Mas, para isso precisam de mapas que podem ser obtidos via quests e que nem sempre revelam a posição exata; quando surgem, pode ter certeza que estão atrás das linhas inimigas e só um herói será capaz de resgatá-lo para a sua facção. Isto se ele não morrer na volta (aconteceu mais de uma vez comigo).
Vejo, entretanto, que o verdadeiro esplendor do design da Creative Assembly em Curse of the Vampire Coast é que você pode jogar como eu descrevi, ou inventar um jeito completamente novo, ou tentar misturar tudo isso — conquista territorial, ser um nômade, estabelecer baía de piratas ou manter um contingente do seu exército em cada território no modo “emboscada” (que Khorne tenha piedade das suas finanças, pois dos seus soldados ele não vai ter). Não importa; os lordes vampiros são versáteis e, assim como todo bom marujo, seu porto é o mar, um mar que devia ter também recebido um tanto mais de atenção no quesito tático.
E aqui está o segundo deslize da Creative Assembly: a terrível adaptação das batalhas marítimas em batalhas terrestres mesmo que a facção dos piratas tenha toda a sua história baseada em torno disso. A desenvolvedora já havia avisado que todos os embates marítimos seriam resolvidos em ilhas ou na costa; em partes é compreensível, dados a natureza e o escopo de Total War: Warhammer, e a necessidade de adaptar toda outra facção para também fazer parte dessas batalhas seria um trabalho descomunal, um que eu acredito tem grande chance acontecer com Total War: Warhammer III. O problema é que muitos dos mapas usados em tais batalhas são fracos, para não dizer terríveis.
A maioria gira em torno de sempre ter um morro no meio e as duas unidades estarem localizadas em pontos opostos. É um design chato pois acaba sendo uma correria de quem chega no monte primeiro e, pela batalha de contenção travada pelos piratas vampiros, você acaba quase sempre levando a pior. Espere muitas baixas nos turnos iniciais, a menos que aprenda a dialogar com qualquer facção independente que deseja travar batalha marítima com você para que evite as batalhas o máximo que puder.
Evitei o quanto pude, aumentei minha infâmia até chegar no topo do rank dos piratas, alternei de estilos de jogo no meio de uma campanha, recrutei exércitos de renome (tropas com atributos especiais) e assim que peguei o estilo de jogo – que, reforço mais uma vez, vai pegar até os mais experientes de surpresa – fui recompensado com uma das melhores — se não a melhor história — que a Creative Assembly fez para Total War: Warhammer II. A batalha final, de tirar o fôlego, faz a campanha original dos High Elves parecer coisa de amador.
Agora, com um pouco mais de 40 horas de Curse of the Vampire Coast e a campanha de Luthor e Count Noctilus terminadas, fico com um misto de euforia e alegria pois ainda me faltam outros dois lordes para jogar e sequer encostei em Lokhi Fellheart. A Creative Assembly, mais uma vez, trouxe facções versáteis, com mecânicas exclusivas, e que se encaixa perfeitamente tanto em Eye of the Vortex como em Mortal Empires. Se for essa política de DLCs a ser adotada para Total War: Three Kingdoms e Total War: Warhammer III, estarei felicíssimo.
Total War: Warhammer II - Curse of the Vampire Coast
Total - 9
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Complexos de serem aprendidos, os piratas vampiros de Curse of the Vampire Coast são uma das mais versáteis facções em Total War: Warhammer II. Queira você dominar os mares, a terra, ou ser um nômade, há um pouco de tudo para qualquer fã da franquia.