A história nos conta que tanto Sun Ce como Lü Bu foram líderes formidáveis, personagens que moldaram os acontecimentos da China no período dos Três Reinos. Porém, ser um guerreiro formidável é só parte de uma história. Um líder sem um exército não é nada; tampouco será alguma coisa sem uma população que esteja sob seu controle, ou sem terras para manter suas tropas alimentadas. A World Betrayed (Steam) na verdade trata desses temas mais do que dos personagens centrais – uma pegadinha e tanto.
No começo da campanha de Lü Bu, você é apresentado a sua principal mecânica – Momentum. Vencer batalhas permite que você avance as tropas no mesmo turno, mas ao mesmo tempo isso irá gerar fadiga nelas. Uma segunda ou terceira batalha não só significa derrota, mas também um final “precoce” à sua campanha.
Mas eu, com toda a minha inteligência, não pensei nisso. Venci um exército, venci outro exército, venci um terceiro exército. Me senti glorioso na pele de Lü Bu; era invencível. Quem me pararia? Minhas tropas estavam prontas para mais um combate, e Lü Bu as lideraria com a perspicácia de sempre.
O sonho desmoronou ao tentar atacar uma cidade de Cao Cao – uma estratégia perigosa, já que a campanha começa momentos após a morte de Dong Zhuo pelas mãos de Lü Bu. Eu não tinha aliados naquele momento, e minhas únicas províncias eram uma fazenda e uma cidade. Afinal, quem confiaria naquele que matou Dong Zhuo? A quem eu tinha para recorrer? Avançar era a minha única opção.
Em um momento mais inteligente, eu teria me lembrado que Liu Bei ofereceria uma aliança a Lü Bu. Mas não só não lembrei como decidi ir para cima da cidade de Cao Cao, cuja resposta foi tentar conquistar a minha cidade. O resultado foi uma troca onde minhas tropas fatigadas falharam em tomar conta da situação, Lü Bu estava ferido, e Cao Cao tinha tomado a minha cidade.
Meu único respaldo era a fazenda, mas de que servem os mantimentos e o custo de manutenção se não tenho um exército? Turnos após ter me aliado a Liu Bei, comecei uma longa jornada até conseguir chegar em sua cidade e ter um pouco de paz e definir meus próximos passos.
Aprendi da pior maneira como usar o Momentum, mas assim que peguei a manha, a campanha de Lü Bu se tornou muito mais fácil do que eu imaginava. Claro que ajuda bastante que as novas unidades trazidas por A World Betrayed tenham atributos bem específicos. Os Camp Crushers podem parecer inúteis no campo de batalha quando se pensa em batalha de lanças, mas seus pontos de vida e sua forte armadura compensam o curto alcance. Já os Flying Riders – uma cavalaria com armadura — cria zonas de controle como nenhuma outra é capaz. Talvez seja no momento dessa análise a cavalaria mais forte de Three Kingdoms.
Quando aliei meu poderio militar a uma boa esquematização diplomática – um dos fortes do game – sabia que a China estaria sob o meu controle (e o de Liu Bei) em pouco tempo. Aliás, foi o único caminho anistórico que segui e não traí o personagem. Também, depois de tanto perrengue que passei nos turnos iniciais, a última coisa que passou pela minha cabeça era cuspir no prato que comi.
Mas não ache que isso significa que a Creative Assembly deixou de lado o aspecto narrativo. A World Betrayed traz o mesmo tom forte de Mandate of Heaven e da campanha principal. Ótimas cinemáticas e mais uma vez a forte identidade de que a China passava por um período de caos – ainda mais do lado de Lü Bu. Quero, e muito, que continue assim.
Queria eu ter as mesmas palavras para descrever como foi jogar a campanha de Sun Ce; apesar de apontada como muito mais difícil que a de Lü Bu, a sua mecânica “Reckless Luck” – também focada no expansionismo – é mais piedosa do que o Momentum de Lü Bu. Atingir os objetivos para que ele não morra de forma precoce é muito mais fácil.
A facilidade vem de um aspecto um pouco linear demais para a sua campanha, problema que tem sido recorrente em Three Kingdoms. A posição inicial de Sun Ce é muito mais atraente de um ponto de vista de conquista do que Lü Bu, que tenta fugir de tantos inimigos. Uma olhada rápida e você já sabe quais são as melhores províncias a serem capturadas, onde os exércitos mais fracos estão, quais os melhores pontos para se obter lucro via comércio ou diplomacia, e como manter a linha de frente bem alimentada.
Os maiores problemas que enfrentei na realidade não vieram nem dos meus oponentes, mas dos bandidos que foram melhorados na atualização 1.5 (coisa que Romance of the Three Kingdoms XIV pelo visto esqueceu que existe). Vira e mexe vinha um me encher a paciência, eu revirava os olhos e pensava “ah não, de novo? Você não cansa não?”, e dava um fim às suas ambições.
Não vou mentir, uma bela ajuda veio das novas unidades que vieram com Sun Ce. A Tiger Guard – infantaria que usa lanças – é bem mais poderosa do que devia e os mercenários de sua família têm um custo de manutenção muito mais baixo do que o esperado. Ainda bem que eu estava com os cofres cheios, pois foram eles que me ajudaram no resto da conquista territorial.
Fora isso foi uma campanha relativamente tradicional dentro dos conformes e limitações de A World Betrayed. Seguia as missões, completava objetivos, e no final Sun Ce estabeleceu e manteve o legado dos Wu vivos.
Todavia, eu devo apontar que algumas decisões anistóricas apareceram ao longo do caminho tanto para Lü Bu quanto para Sun Ce. Optei por não segui-las para ter a experiência mais “padrão” possível, mas é bom ver que a Creative Assembly está pouco a pouco começando a entender como remover a linearidade e dar um aspecto mais “sandbox” para Three Kingdoms, movimento que começou com Mandate of Heaven e não tenho dúvida que vá se estender pelos próximos DLCs.
Também não espere algo como uma rivalidade daquelas vistas em Total War: Warhammer II – lembre-se, a China estava em um período de ebulição. Nada é preto no branco como o colonialismo imprudente e os nativos de The Hunter and The Beast. Minha crença é que a Creative Assembly continuará a evoluir os DLCs com temas paralelos. Expansionismo, diplomacia, crises internas, e por aí vai.
Para um DLC que se insere no meio de uma campanha já em andamento e turbulenta, a World Betrayed exerce muito bem a sua função. Aponta os pontos fortes e fracos do expansionismo, e revela que grandes lutadores não equivalem a grandes conquistadores sem um bom apoio, mantimentos e logística. Mesmo que deslizes – como o caso de Sun Ce – ocorram, é uma ótima desculpa para revisitar esse período da China.
Total
Total - 8
8
Muito bom
Girando em torno do tema “expansionismo”, a World Betrayed desembola as teias e os mitos de grandes conquistadores. Nos relembra que eles só chegaram no lugar de poder da China com apoio, mantimentos e acima de tudo logística. É parte desafiante, parte inovador por se inserir no meio de um período já complexo, e mesmo com os seus defeitos, vale o investimento.