Creio que já tenha deixado claro meu descontentamento com Rome II: Total War após classificar a sua última expansão, Empire Divided, como o “remendo do remendo”. Fazendo cinco anos este ano, me impressiono ao ver a Creative Assembly retornar ao game, desta vez com o Desert Kingdoms Culture Pack (Steam)- um pacote de novas facções que pode ser enfim o primeiro verdadeiro rival de um dos meus favoritos, o Pirates and Raiders Culture Pack.
O conceito de Culture Packs oferecidos pela desenvolvedora é uma grande questão de “ame ou odeie”, tanto da minha parte quanto da maioria da comunidade. Muitos deles, como o risível Greek States (que permite jogar com Esparta), são carentes de personalidade e tipicamente oriundos de culturas cujas diferenças são, no máximo, tênues. Desert Kingdoms não foge à regra, tendo grande parte dos exércitos formados por unidades de cultura africana / arábica e com leves revisões na quantidade de dano ou quantidade de proteção. Entretanto, desta vez o que me interessa não é o combate em si, mas a maneira como cada combate pode ser o seu último.
Independentemente de ser com os Kush, os Sabá, os Nabateus ou os Masaesyli, a campanha de Rome II é uma luta contra o tempo e o espaço; é uma ladeira íngreme e impiedosa. Com 7% de penalidade na pesquisa tecnológica e rodeados por facções poderosíssimas, como o Egito, o jogo usando esses exércitos se torna uma questão de quem vai engolir um ou outro primeiro.
Como não fujo de um bom desafio, comecei minha primeira campanha com os Masaesyli, uma das tribos que seriam importantes para a formação da Númídia. Cercada por Cártago e com um controle de um território maior do que imaginava, estava na boca do leão antes mesmo de iniciar meu turno.
Atacar Cártago antes mesmo de ter um fluxo de caixa positivo que me permitisse ter um exército reserva seria suicídio. Estaria igualmente em maus lençóis caso expandisse para o oeste com o fim de conquistar a única facção “fraca” da região, pois a proximidade da minha capital da região controlada por Cártago era muito maior do que a proximidade da cidade que estava na minha mira; seriam necessários no mínimo dois ou três turnos para voltar e possivelmente recuperar a minha posição. Esperei dez turnos se passarem antes de tomar uma decisão. Coisa que raramente, quiçá nunca, aconteceu em Rome II.
O escopo do game e as inúmeras culturas que ele engloba raramente dão espaço para que o terreno seja de fato um fator desvantajoso. Vide por exemplo o fato que Thrones of Britannia tem um mapa das ilhas britânicas ao menos 23 vezes maior do que o de Rome II / Attila. Questões de terrenos raramente eram casos de alarde; nos jogos recentes da franquia, apenas Mortal Empires de Warhammer II se destaca nesse quesito, e mais por causa dos modificadores de vampirismo ou corrupção do Chaos do que pelas distâncias ou peculiaridades do terreno.
E ainda sabendo que o terreno não era tão impactante quanto imaginava, hesitei.
Hesitei da mesma forma ao ver que as tropas iniciais do Kush são formadas em sua grande maioria por soldados escravos, e minha fronteira com o Egito não me colocava em uma posição exatamente confortável. Teria de enfrentar os Nabateus se quisesse ter alguma chance de expandir meu domínio; e entre nós, havia um Mar Vermelho. Ou favorecia o desenvolvimento dos portos e realizava um ataque em massa neles, mesmo que isso significasse deixar a minha fronteira aberta para o Egito, ou ficava acuado na minha zona de conforto até ser engolido pelos meus rivais. Não existia uma “estratégia vitoriosa”, nenhuma “receita de bolo”; havia retornado à estaca zero, como se tivesse começado a jogar há poucos dias e não há quase cinco anos.
Claro que pode se usar o argumento que outras nações de Rome II oferecem situações similares, mas é essa mistura do expansivo terreno do norte da África e do Oriente Médio aliado aos prós e contras dos Desert Kingdoms que dá o tempero especial ao Culture Pack. Suas ações devem ser muito mais calculadas quando se joga com um grupo cujo bônus de combate é de mais de 50% em áreas de deserto.
Fui levado às memórias da primeira vez que desfrutei do Pirates and Raiders Culture Pack, onde a ênfase em unidades navais me fez ver o mapa sob outro olhar, enxergar pontos fortes e fraquezas de outras nações. Explorei novos caminhos e descobri como certas mecânicas que raramente utilizava – como emboscadas – são úteis para compensar as limitações do meu exército. O Desert Kingdoms faz isso em dobro; a corrida contra o tempo, o receio de atacar, o exército potencialmente fraco e o medo de sair da sua zona de conforto.
Não ignoro também o fato que sim, as quatro facções podiam ser jogadas previamente via mods, e mesmo presentes desde 2016 no meu jogo, a cópia de traços socioculturais da região as tornava ligeiramente mais “fáceis”. Eu não dispunha de eventos específicos como os incluídos na expansão, nem de ter de usar soldados escravos no início; muito menos tinha a adição de um sistema político competente oriundo da atualização lançada junto com Empire Divided e agora expandido pela inclusão de uma maior presença feminina em nações como o Egito e os Kush, recursos como especiarias, e alguns pequenos ajustes na interface – como a longamente aguardada adição de um botão de unificar unidades do mesmo tipo.
Rome II continua obviamente com seus problemas de IA, um combate fraco e um sistema de siege que não funciona. Isto eu e você já estamos carecas de saber e, a essa altura, não vai mudar. Ou sucumbimos ao seu charme ou batemos a cabeça contra a parede (enquanto esperamos o próximo jogo da Creative Assembly) à toa. E se, mesmo ciente de todos os defeitos, prossegui até o final com três das minhas quatro campanhas realizadas com as facções do Desert Kingdoms, é por que ele mais do que mereceu.
Ao invés de prometer mundos e fundos como fez com Empire Divided, a Creative Assembly soube definir claramente o escopo do Desert Kingdoms Culture Pack. É para aqueles que amam Rome II, que querem ainda mais motivos para voltar a jogá-lo, mesmo com seus problemas. Não vem com uma narrativa mirabolante, tampouco com a esperança de que é um “jogo novo”. Usa os sistemas já presentes para aumentar o desafio e, mais uma vez, fazer o jogador repensar sua estratégia.
Total War: Rome 2 - Desert Kingdoms Culture Pack
Total - 8
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Desert Kingdoms Culture Pack traz desafio para quem já é veterano em Rome II sem que ele tenha uma constante sensação de “deja-vú”. É hora de rever suas táticas, analisar o mapa e buscar novas maneiras de expandir. Excelente para quem (ainda) não desgrudou do game de estratégia.