Eu não sou o maior fã de remasters, já deixei isso claro em múltiplas matérias que escrevi aqui no Hu3BR. Sinto que a grande maioria deles tem pouca utilidade além de melhorar visuais ou arredondar arestas pontiagudas – arestas estas que fizeram o jogo original tão especial. Essa foi a mentalidade que tinha quando comecei a jogar “The Talos Principle: Reawakened” (Steam), e ela foi mudando a medida em que progredi nele.
O projeto por si só ao menos na sua versão original, já era uma certa “anomalia”. A Croteam, uma empresa tão conhecida pelo shooter “Serious Sam” fazendo um jogo de quebra-cabeça? Ninguém levou muito a sério de começo – nem eu. O resultado foi estonteante, um título que não só vinha recheado de quebra-cabeças muitíssimo bem-feitos, mas acompanhado de uma trama que levanta questões filosóficas acerca da humanidade e do que é ser um humano.
Foi uma história que me tocou profundamente e fez “The Talos Principle” entrar na minha lista de favoritos ao lado de grandes nomes como “SOMA”, “Disco Elysium”, e tantos outros. Na época, jamais imaginaria isso saindo da Croteam – mas também não conhecia muito do escritor Jonas Kyratzes e o seu incrível trabalho tanto no título como na sequência. Uma sequência que, ouso dizer que, até supera a trama do original.
Mas não quero me apressar. Imagino que você queira saber ao menos como é jogar “The Talos Principle”, correto? Bem, é um jogo de quebra-cabeça 3D. Você começa a história em uma ilha que se assemelha a uma região da Grécia e deve completar uma série de desafios. Em meio a isto você é guiado por uma entidade que se intitula “Elohim”, um nome dado para Deus no Hebraico.

“Você é a minha criação”, diz Elohim assim que o seu personagem acorda. “Você pode explorar os meus jardins, mas você não pode entrar na torre”, comenta posteriormente. A Torre é um dos principais “mistérios” de “The Talos Principle”, e eu não vou estragar a surpresa se você não o jogou ainda.
Boa parte dos quebra-cabeças envolvem encontrar novos “ângulos”. Em dado momento no começo do jogo você precisa desativar duas portas, mas só possui um equipamento de “neutralização”. Lembro-me muito bem de sofrer para entender como fazer no original, até perceber que se eu o colocasse atrás de uma grade, ele também funcionaria.
Tais quebra-cabeças aumentam em escopo e variedade quanto mais você avança na trama. Alguns requerem que você redirecione feixes de luz, use exaustores para impulsionar o personagem. Mas o tema continua o mesmo, “ângulos”, novas formas de pensar, de refletir.
The Talos Principle: Reawakened os manteve praticamente intactos. O maior impacto para aqueles que já jogaram o original é visual e a possibilidade de “desfazer” uma ação ao invés de ter que recomeçá-lo do zero. Uma adição muito bem-vinda.

Eu imaginei que eu tinha decorado todos de cabeça de tanto que joguei “The Talos Principle”. Estava errado. Jogar a campanha pela quarta vez foi tão fantástica quanto a primeira, mesmo sabendo para onde a trama ia seguir. E parte disso é graças aos novos visuais de “Reawakened”.
Sem desmerecer a equipe original, a mudança para a Unreal Engine 5 dá um novo ar para “The Talos Principle”. Antes eu me sentia parte de um experimento, uma cobaia, enjaulado e angustiado. “The Talos Principle: Reawakened” faz essa sensação ser ainda mais forte.
Por que o meu personagem explora regiões da antiguidade? Como eu saio da Grécia antiga para o Egito? Não deviam existir pessoas nesse mundo? Eu encontro apenas fantasmas – outros seres que, como eu, estavam lá para resolver quebra-cabeças. Os novos visuais criam um efeito forte de solidão. Seria eu, o único ser consciente vivo? O último a apreciar essas belas paisagens?
É estranho para mim escrever o parágrafo acima. Eu nunca dei muita importância para os visuais de “The Talos Principle”. Eles eram um pouco desconcertantes, mas alinhados com a história. Em “The Talos Principle: Reawakened”, há uma certa melancolia no silêncio, nas margens de um lago que não faz barulho, na ausência do canto de pássaros. Tal melancolia cortada apenas pela excepcional e igualmente marcante trilha sonora de Damjan Mravunac.

Uma adição que não posso deixar de mencionar é a inclusão de comentários dos desenvolvedores sobre o processo de criação de “The Talos Principle”. Sei que muitos podem ignorar ou até mesmo ver como um elemento desnecessário. Eu imploro, não os ignore – ao menos volte para ouvi-los após completar a campanha ou cada região.
Acredito que uma boa parte do meu tempo de jogo em “The Talos Principle: Reawakened” foi ouvindo as fantásticas histórias de como cada desenvolvedor criou um certo quebra-cabeça, trouxe a ideia de um novo equipamento ou um conjunto de regras.
É fascinante de ouvir como alguns desenvolvedores conseguem expressar as suas ideias por rabiscos, palavras ou até pequenas maquetes. Fazer com que tudo fique “coeso” no final do projeto é um gigantesco feito por si só e só me fez apreciar ainda mais o trabalho da Croteam.
E, como alguém que já havia completado “The Talos Principle”, a adição do DLC “In the Beginning” é a cereja no topo do bolo. Já aviso de antemão para não jogá-lo sem ter ao menos completado a campanha principal e o DLC “Road To Gehenna” a não ser que você queria estragar a história – e por favor, não faça isso com você, a trama é boa demais para ser arruinada.

Dito isso, “In The Beginning” tem uma ambientação bastante diferente do restante de “The Talos Principle: Reawakened”, mas há uma ótima justificativa para ela – uma que, obviamente, não irei comentar. Eu adorei a mudança de “cenário” e como a Croteam implementou um novo arco narrativo que tem certas ligações com a sequência de uma maneira bem natural.
O que não é tão “natural” são os quebra-cabeças do DLC. Feitos em conjunto com a comunidade, os 18 inclusos em “In The Beginning” são, de longe, os mais difíceis de toda a franquia. A Croteam já tinha avisado da dificuldade deles, mas creio que os subestimei. Eu mesmo confesso que não consegui completar todos. Se você lutou para “pensar fora da caixa” no jogo base e no primeiro DLC, pode se preparar para um desafio ainda maior.
Mas, me conhecendo muito bem, sei que o restante do meu tempo com “The Talos Principle: Reawakened” vai ser com o novo editor de mapas e quebra-cabeças. Embora presente no primeiro game, a Croteam deu uma tremenda repaginada nele ao ponto de fazer quebra-cabeças ser um processo muito mais “direto”.
A comunidade já vem trabalhando dia e noite para converter clássicos do original para a nova versão, e eu não duvido que eu mesmo acabe publicando alguns. Só não posso garantir que eles sejam bons ou cheguem aos pés de outros membros da comunidade que passaram a última década refinando e descobrindo novos jeitos de me fazer queimar os neurônios.

O maior ponto negativo, se é que posso chamá-lo disso, é que a mudança para Unreal Engine 5 equivale a um jogo que ocupa muito mais espaço em disco e requer um computador bem mais potente para rodar na qualidade máxima. Para mim vale a pena a mudança, mas sei muito bem da realidade dos brasileiros e que muitos podem não conseguir apreciar os novos visuais. Não se sinta “culpado” se você acabar pegando a versão original de 2014. Você ainda vai ter um excelente jogo em mãos e ainda mais recheado de quebra-cabeças feitos pela comunidade.
Eu ainda acho remasters uma boa ideia? Nem sempre. Já vi muitas tentativas ao longo desses últimos anos que ou mudaram o visual demais ou consertaram “problemas” que faziam parte do charme do jogo. Não é o caso de “The Talos Principle: Reawakened”. Os quebra-cabeças – até os mais “fracos” – permanecem idênticos. Algumas soluções que poderiam muito bem ter sido melhoradas não foram, o charme dele não foi embora.
Seja a versão de 2014 ou “The Talos Principle: Reawakened”, ele vai continuar no meu panteão de um dos melhores jogos de quebra-cabeça e de longe uma das melhores narrativas que eu já vivenciei em um jogo. Independente de como escolher, só te peço uma coisa: jogue-o.
The Talos Principle: Reawakened
Total - 9.5
9.5
“The Talos Principle: Reawakened” entra para os raros exemplos de uma remasterização feita com cuidado e carinho. Os novos visuais dão um novo ar que complementa a história, melhorias pontuais o tornam mais “fácil” de degustar, mas ele não perde o charme. Ele e sua sequência são um dos melhores jogos de quebra-cabeça e trazem uma narrativa inesquecível. Jogue-o, seja no seu formato original ou na versão remasterizada.