Minhas lembranças sobre as Tartarugas Ninjas são, no mínimo, nebulosas. Se eu assisti o desenho dos anos 90 eu não me lembro, se eu vi os filmes, não me recordo de nada. O que mais marcou foi um presente que me deram de uma das tartarugas que brilhava no escuro. Eu a deixei cair debaixo da cama e acordei assustado com algo brilhando. Estabeleço o palco para que você, caro leitor, entenda que o meu grau de nostalgia para com Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge (Steam / Xbox / Switch / PlayStation) é basicamente zero. Sabia que era um Beat ‘em Up, que fazia “homenagens” a jogos passados, mas não fui atrás deles para comparação – algo raro para mim.
O motivo dessa decisão é igualmente simples e complexo. Ao contrário das minhas tradicionais críticas, eu não queria ser influenciado por algo do passado, ou ficar refletindo sobre quais homenagens o game fez para algo que foi lançado há mais de 20 anos atrás. “Deixa eu ser levado pelo oceano e ver aonde ele vai me levar”.
Para um gênero que por boa parte de duas décadas pareceu quase morto, e tem voltado com força, seja na cena independente com Fight ‘n Rage – ainda o meu favorito de todos – ou Streets of Rage 4 e seu respectivo DLC, o pesadelo de Mr. X, eu estou impressionado com o quanto eu fiquei entusiasmado em jogar e rejogar partidas de Shredder’s Revenge, dado a forma que ele é estruturado e suas peculiaridades.
Como todo Beat ‘em Up da atualidade, o jogo oferece um modo “história” e um modo arcade. A estrutura de ambos é simples o suficiente para qualquer um que tenha o mínimo de proficiência no estilo pegar o controle e jogar. Diria que, em certos pontos, ele chega a carecer de desafio.
A minha primeira jornada pelo modo história foi, é claro, segura. Escolhi Leonardo por conta do seu formidável equilíbrio entre alcance, velocidade e força – os três principais atributos que definem os pontos fortes e fracos de cada personagem – mas cada uma das personagens ainda mantém um estilo “próprio” de combate.
Cheguei na metade da campanha e o primeiro pensamento que veio foi “Hmm, esses chefões estão um pouco fáceis demais para o meu gosto”. Eu tinha perdido poucas vidas, e Shredder’s Revenge é um tanto quanto gentil em recuperar a sua vida; ou melhor, oferecer deliciosas pizzas para recuperar os pontos de vida e liberar novas habilidades assim que você atinge uma pontuação específica no modo história. Peculiarmente, não me importei tanto e segui em frente, sem pensar se isso seria um grande problema ou não. As coisas até deram uma apimentada nas fases finais, com alguns chefões com padrões de ataque ou estratégias diferentes que ajudaram a dar uma sacudida e me manter mais atento.
Depois de duas horas e meia a três horas a campanha estava finalizada. “Ok. Ótimo, vamos de novo! Agora com um novo personagem!”. O tempo que eu demorei entre acabar a campanha e começar uma nova foi o ato de levantar da cadeira, me espreguiçar, esticar as pernas, pegar mais água e decidir qual seria o próximo personagem. No caso, a jornalista April.
Esse não é o meu comum quando eu jogo Beat ‘em Ups. Minhas partidas são tipicamente espaçadas enquanto eu descanso os meus músculos – graças à minha mania maldita de ficar arqueado que nem um camarão, que está lentamente destruindo as minhas costas. Minha experiência até então era com jogos que me faziam ter precisão e ler os padrões de ataque dos inimigos nos mínimos detalhes. Shredder’s Revenge oferece o contrário — um estado quase zen, um gostoso transe de jogá-lo puramente por ser divertido.
“Por ser divertido”, até porque o meu repertório de jogos não tem apenas os mais desafiadores, estressantes e “engajadores” jogos possíveis, tendo também dezenas de musous dos mais variados tipos ou jogos de pura criação como o Cloud Gardens. Eu só não havia sentido isso ainda com Beat ‘em Ups. Aquela sensação gostosa de começar outra partida, ver os minutos e as horas passarem enquanto esbofeteio os capangas de Shredder. Por isso que a dificuldade não me incomodou, muito menos a estrutura do modo história. É divertido! Este não deveria ser o componente principal em um jogo das Tartarugas Ninja? Então pronto.
Depois de três campanhas completas, sendo duas no modo história e uma no modo arcade, vejo como um dos maiores triunfos da Tribute Games — em comparação com seus jogos anteriores (Panzer Paladin, Mercenary Kings), que atiravam para todos os lados e aparentavam não ter foco — a capacidade da desenvolvedora de saber o ponto certo de quando uma fase deve terminar.
Embora eu ache que Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge teria se beneficiado de um pouco mais de variedade de situações especiais, como lutas em elevador ou um melhor espaçamento das fases em que você está “pilotando” algum veículo, nenhuma dura demais para que isso vire um agravante. No máximo o que acontece são cinco minutos a mais na partida, algo que eu estou mais do que disposto em gastar se o resultado é seguir para a fase que eu gosto.
Outro componente que sustentou, e muito, esse meu desejo de continuar a jogar outra e mais outra e mais outra partida é a apresentação visual de Shredder’s Revenge. Novamente, a questão da nostalgia não entra em jogo, mas sim o quanto a Tribute conseguiu dar personalidade a personagens que na minha memória eram nebulosos. Quem são os chefões que eu lutei? Com a exceção de Shredder, eu conhecia um ou outro, mas eu garanto que foi gratificante derrotá-los e aprender seus ataques. Isto é, quando eu não perdia o foco prestando atenção nas animações de fundo e em como cada área é rica em detalhes.
Não posso deixar de mencionar a fluidez do sistema de combate, que, como disse antes, pode não ter a complexidade severa de um Fight ‘n Rage, mas está ajustado no ponto certo para que quem tem interesse em ir um tiquinho mais a fundo encontre sempre algo agradável. Especiais, bloqueios, desvios distintos para cada personagem ajudam a manter o controle do caos que cedo ou tarde vai aparecer na tela.
Sério, me faltam palavras para descrever a fluidez com que os personagens deslizam, pulam, o feedback dos golpes; tudo foi feito com tamanha precisão que você sente o impacto de cada soco, mesmo que ele esteja muito longe da “violência” proferida em Streets of Rage. É a excelentíssima combinação audiovisual que um jogo do estilo precisa ter para me agarrar de jeito.
E quando esses componentes não eram suficientes, Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge me presenteou com um bom conjunto de colecionáveis e desafios extras. Os colecionáveis podem não passar de um “troféu” e eu imagino que vá fazer mais sentido para quem for fã da franquia, mas os desafios extras são – como o resto do jogo – feitos na medida certa.
Joguei e rejoguei fases para completar um desafio de não ser atingido por obstáculos ou não ser agarrado. Os que me restam são os mais cascudos como “termine a fase sem tomar dano”, que pede para que eu praticamente “decore” onde os inimigos estão. Vai dar trabalho, mas estou disposto a tentar.
Sabe o que eu me pego imaginando? Como deve ser jogá-lo com várias pessoas. Sim, isto mesmo que você leu. Toda a minha experiência com Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge foi solo. Eu tenho a tendência de jogar sozinho e por mais que ele possua limite para 6 jogadores e um modo online, eu não tive tempo nem outras pessoas com quem jogar. E mesmo assim ele se sobressaiu em todos os aspectos que eu imaginava.
A meu ver, se a Triumph tinha como objetivo entregar um Beat ‘em Up que abrange todo tipo de jogador – e com uma dose extra para quem é fã das Tartarugas Ninjas – o seu objetivo foi completado com excelência.
A melhor lição que eu posso tirar dele é como a próxima leva de Beat ‘em Ups pode trabalhar a sua dificuldade. Até que ponto um jogo precisa ser técnico ou complexo para gerar investimento por parte do jogador? Shredder’s Revenge até então tem a melhor solução: Estabeleça uma linha base, trabalhe em cima dela para adequar outros tipos de jogadores e nem sempre se foque demais ao público que irá completar todos os desafios ou na dificuldade máxima. Eu sem dúvidas sou do segundo grupo, mas Shredder’s Revenge me forneceu o suficiente para que eu não sentisse que eu estava perdendo nada.
Com uma tabela de lideranças – quem é leitor afinco do site sabe que é a minha fraqueza no modo arcade – e a possibilidade de jogar com outras pessoas, Shredder’s Revenge entra para o meu repertório de jogos que vão ficar instalados por tempo indefinido. Seja para as situações em que eu queira relaxar esbofeteando os capangas de Shredder, ou tentando encontrar alguém com um sono tão desregulado quanto o meu para partidas cooperativas.
Eu aposto que, mesmo que anos se passem, no dia que eu estiver um pouco para baixo ou sem paciência para me investir demais em um jogo, eu vou falar: “Quer saber, hoje eu vou de Shredder’s Revenge para relaxar”.
Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder's Revenge
Total - 9.5
9.5
Ainda que eu desejasse uma maior variedade de fases, Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge é um ótimo beat ‘em up para qualquer tipo de jogador — seja um veterano dos arcades, seja um fã de tartarugas ninja, seja alguém nostálgico pela franquia ou quem simplesmente deseja um bom jogo para jogar sozinho ou com outras pessoas. Espere completar a campanha dezenas de vezes, e, se bobear, completá-la muitas vezes mais ao longo dos anos.