A maior barreira que vejo em um wargame é a interface. O mercado, cujo crescimento é quase banal comparado com o resto da indústria se mantém em padrões estéticos vindos diretamente do Windows 95. Como fazer alguém se interessar por um jogo onde complexidade é seu sobrenome, se nem mesmo conseguimos transpor tal barreira? É aqui que Strategic Command WWII: War in Europe entra. Ele está disponível na loja da Matrix Games por US$ 39,99.
Assim como seus antecessores, a Fury Software mais uma vez conseguiu unir o novo com o antigo, o estilo clássico do combate em hexágonos com uma interface polida. Pode não ter a complexidade de War in The West, ou os nuances de Decisive Campaigns: Barbarossa, mas tem a capacidade de cativar.
O loop é simples para quem tem o mínimo de intimidade com jogos por turno, mova unidades entre hexágonos, ataque-as e fique de olho em modificadores como terreno, força e suprimento de tropas. Um sistema tão maleável como o de Unity of Command, mas com seu escopo no mínimo triplicado.
É menos um jogo sobre recontar a história da segunda guerra mundial, e sim vivenciá-lo sob a perspectiva militar das grandes potências envolvidas no conflito. O balanço entre administrar a sua nação, com pesquisas e diplomacia, e de fato efetuar manobras no campo de batalha, está equilibrado em um ponto onde nenhum rouba o espaço do outro na mente do jogador.
Grande parte disso vem da habilidade da Fury Software ser capaz de pintar uma boa noção da situação de cada país sem que o jogador se sinta sobrecarregado de informações. Tudo o que você precisa para tomar as decisões corretas no combate estão à sua frente.
Basta um relance sobre o mapa que se tem a quantidade de tropas, terreno, posição das tropas inimigas e qual a eficácia delas em combate. Cada decisão deve ser tomada com precisão cirúrgica, pois o inimigo estará preparado para contra-atacar a qualquer erro.
Inteligência artificial ainda não é o forte de muitos Wargames, mas a Fury Software se sobressai na área com um oponente que sabe interpretar e se adaptar com um meticuloso plano de defesa. Quebrar a linha Maginot como a Alemanha, por exemplo, foi uma tarefa muito mais difícil do que pensava.
No terceiro turno da campanha — que optei por começar em 1940 — minhas forças já haviam avançado sobre a Bélgica e estavam prestes a adentrar a França. Uma vitória garantida era o que eu imaginava. Fui pego de surpresa um turno depois quando um grupo de bombardeiros e escolta das forças aéreas britânicas basicamente reduziram para metade a minha força na região. Seguido disso, um esforço em conjunto da França e Reino Unido dizimou a minha frota inicial de submarinos, a qual usava no momento apenas para reconhecimento e destruição de comboios.
A força de um país não é medida apenas pelas peças colocadas neste tabuleiro digital, e como elas capturam pontos importantes — que dá bônus de manufatura —, é também saber como e quando investir no reforço de unidades e pesquisa de novos equipamentos. Uma forma de incentivar o jogador a tomar decisões. Afinal, quem não conquistar, será conquistado.
O aspecto mais fraco, ou estranhamente desnecessário, fica para o sistema de diplomacia. Das inúmeras horas jogadas, pouco uso vi nele a não ser para declarações de guerra em 1939. Boa parte dos países já tinha seu lado definido e gastar recursos para influenciá-los a trocarem ao invés de enviar mais um esquadrão apresenta-se como um esforço em vão.
Esta peculiar dança de vai e vem, de movimentação de tropas, de criação de divisões e fortalecimento de áreas de controle demonstra o nível de stress e comprometimento emocional que foram quebrar as barreiras dos diversos países para os países do Eixo ou liberá-los para os Aliados.
É nela que você compreende o desprazer de invadir a Rússia e tentar evitar que a guerra se estenda até o inverno, é quando percebe que o terreno a ser defendido é tão extenso que se não existir uma produção constante de unidades, você será esmagado. E, céus, como Strategic Command WWII: War in Europe te prende. Não da mesma forma que Civilization ou um 4X, onde um jogador é confrontado com um problema e precisa achar uma solução para ele. Mas por entrar na cabeça do jogador e tentar mostrar as dificuldades de se conduzir uma guerra.
Mediante as unidades e linhas do tabuleiro uma história se desenrola com uma fúria incontrolável. Horas se passam na tentativa de otimizar cada movimento, reforçar cada frente de batalha. Os turnos em si são tão longos que eu poderia criar uma narrativa sobre eles.
Posso até traçar um pequeno paralelo entre o degaste da guerra e o meu próprio desgaste em ver os turnos triplicarem de duração. De 1939, onde duravam cinco a dez minutos, a 1944, onde cheguei a gastar 50 minutos em profunda reflexão de como evitar que a União Soviética ganhasse ainda mais terreno em solo alemão.
Por consequência, as ações ganham peso em momentos cruciais da guerra. “Devo ou não estender meu domínio sobre o Norte da África? ”, ou “Até que ponto posso comprometer tropas para a Normandia sem desequilibrar outras frentes? ”. Isto, enquanto tenta compreender as fraquezas da nação para prepara-la contra o inevitável ataque inimigo.
São nestes nuances que Strategic Command WWII: War in Europe, e wargames no geral, me conquistam e apresentam-se como uma porta para o passado ou para o futuro. Pela maneira que eles nos fazem questionar o posicionamento de tropas em uma guerra mais do que quase outro gênero (ou subgênero).
Com um polimento extraordinário, a Fury Software consegue fazer com que Strategic Command WWII: War in Europe seja intrigante sem ser intimidador, complexo e acessível, agressivo e elegante. Um ótimo primeiro degrau para quem almeja se aprofundar nos Wargames ou aqueles que buscam um jogo que consegue expressar as dificuldades de conflitos em grande escala.
Strategic Command WWII: War in Europe
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Strategic Command WWII: War in Europe é umas das necessárias pontes entre os jogos de estratégia e Wargames. Pinta o desgaste de conflitos ao fazer o jogador sentir na pele os efeitos do mesmo. Coloca a seu encargo decisões que terão efeitos daqui a dez turnos. Ainda assim, é fácil de ser compreendido até para novatos.