Nossa, como eu odeio megacorporações, como odeio o que elas representam e como elas tentam engolir todos que estão à sua volta sem o menor interesse se isto é benéfico ou não. Achou que clicou em uma crítica sobre o recente uso de IA ou as Big Tech? Bem que poderia ser sobre isso, mas na realidade falo sobre as minhas partidas de “Stellaris” e a expansão “Galactic Paragons” (Steam / GOG), que só fez aumentar o meu ódio pelas corporações no game e minha apreciação pelo trabalho da equipe da Paradox.
Antes que eu me empolgue demais e transforme este artigo em uma crítica de fato sobre as Big Tech, permita-me estabelecer o que é “Galactic Paragons”. A Paradox o chama de expansão, eu o vejo como um pacote de conteúdo que acompanha a gigantesca atualização 3.8. Embora o conteúdo dele em si — como novas origens e “heróis lendários” — seja interessante, ele não chega a ser essencial para quem ainda está engatinhando em “Stellaris”. Eu o recomendo de cara para quem tem as grandes expansões ou quem já está bastante investido em “Stellaris”, o que eu presumo que seja a maioria das pessoas que vão ler este texto.
Com isso fora do caminho, é hora de contar a história da “Hegemony of Biv”. Sim, um nome não muito criativo para uma nação cuja origem é o resultado de anos de guerra e posteriormente a unificação de seus planetas — ou melhor, planeta — por meio de um grande líder. Foi o nome que o jogo gerou para mim e eu não estava no meu período mais criativo.
“Ah, então isso quer dizer que você conseguiu estabelecer uma hegemonia militar na galáxia e destruiu todos os seus inimigos, Lucas?”. Quem dera, caro leitor, quem dera, mas ainda não é hora de falar sobre isso.
Em termos de mecânicas a nova origem é fantástica e muito mais bem trabalhada do que várias das que eu vi até então em “Stellaris”. As outras histórias de origem traziam bônus ou até mesmo uma pequena narrativa para te deixar “intrigado” em saber o que acontece nos próximos capítulos. “Under One Rule” de “Galactic Paragons” vai te acompanhar por boa parte da campanha, ou até o final dela, dependendo da sua espécie. Não vou entrar em spoilers do que acontece em cada gigantesco evento narrativo da origem, pois acredito que esse é um dos poucos momentos em que “Stellaris” de fato brilha. Mas já adianto que pode esperar por muitas reviravoltas de acordo com as suas ações, e potenciais bônus ou prejuízos severos para a sua nação.
O que eu não posso deixar de citar é o novo sistema de líderes com traços dinâmicos, o novo sistema de gabinete para o seu império e as mudanças na assembleia intergaláctica que “Galactic Paragons” e a atualização 3.8 introduzem.
Em suma, cada líder do seu império – seja ele voltado para pesquisa ou um admiral de uma frota – agora possuem traços dinâmicos que evoluem à medida em que eles envelhecem ou ganham experiência em campo. O mesmo vale para o seu gabinete, usado para adotar medidas provisórias que vão te ajudar em várias etapas do jogo. Esses líderes também podem ser usados na assembleia intergaláctica para gerar dar mais “peso” para as suas posições em relação às dezenas de leis que são discutidas durante as sessões.
Se você leu o parágrafo acima e começou a torcer o nariz, eu entendo perfeitamente. Eu tomei um baque com o novo sistema e o vi por um bom tempo como um “ame ou odeie”, e não sei ainda se deixei de lado essa sensação. Afinal, elementos que até então não eram atrelados a nenhum sistema agora são impactados pela presença de líderes. Um deles, por exemplo, é o tamanho máximo de cada frota militar.
O limite total de naves ainda é definido pelas suas escolhas e perks, mas cada frota específica teve seu total de naves reduzido para acomodar líderes. Quanto melhor o líder, mais naves poderão estar sob o seu comando. Este foi o meu primeiro e grande ensinamento durante a minha partida de “Galactic Paragons” como a “Hegemony of Biv”.
Sedento por domínio completo e tentando expandir as minhas fronteiras o mais rápido possível, comecei meus planos preparando a minha frota, estabelecendo bases e obviamente explorando a galáxia. A minha primeira interação foi com os humanos, que imediatamente fecharam as suas fronteiras para mim. “Hm, acho que escolher ser xenofóbico não foi uma boa ideia”, refleti.
Claro que isso não iria me impedir de atacar as fronteiras deles e abocanhar alguns setores para mim, não é mesmo? Bem, sim e não. Com a redução do tamanho das frotas e o fato que ainda estava em “early game”, eu não tinha o poderio bélico que outras versões de “Stellaris” me ofereciam. Agora eu tinha que ter um admiral em cada frota para garantir um aumento total da quantidade de naves.
Não seria um grande problema se esses almirantes não compartilhassem o mesmo limite de líderes total. Tem muitos cientistas explorando a galáxia? Decidiu expandir o seu gabinete e adicionar um novo líder lendário que por acaso decidiu se juntar ao seu império? Pois bem, você vai ter que se preocupar se não extrapolou o seu “limite de líderes”, o que implica em prejuízos consideráveis. Na dificuldade mais “fácil” de “Stellaris”, ter três líderes a mais significa uma redução de 36% na liberação de novos traços dinâmicos e um aumento de custos em Unity. E níveis de dificuldade mais altos trazem consigo maiores prejuízos.
Eu entendo o que a Paradox tenta com o novo sistema em várias frentes. Os almirantes e os outros líderes fazem parte do loop de gameplay do early, mid e late game. Selecioná-los não é mais clicar a esmo na lista de líderes disponíveis e enfiar qualquer um para “cumprir o trabalho”. É hora de, mais do que nunca, pensar de forma tática em como expandir o seu império.
Infelizmente, isso bate em outro grande problema de “Stellaris” que o assombra há anos: o constante vai e vem de tentar ser um “Grand Strategy” e um “4X” ao mesmo tempo. O sistema seria menos impactante se, por exemplo, “Stellaris” possuísse uma ferramenta mais robusta para sincronizar ataques de várias frotas, ao invés de apenas clicar em um setor e torcer para que o design das suas naves seja bom o suficiente para uma das frotas não ficar para trás. E, antes que alguém grite para eu dar uma olhada no designer de naves, acredite, eu dei. As minhas frotas usavam o mesmo sistema de propulsão.
Ironicamente, foi bem isso o que aconteceu quando eu entrei em guerra com os humanos na tentativa de tomar algumas das suas fronteiras. A minha frota principal, que tinha um líder com bônus consideráveis para navegação, chegou primeiro e quase foi trucidada por duas plataformas de defesa e uma frota inimiga. A segunda leva foi quem segurou a onda, e assim obtive um custoso sucesso parcial na minha campanha de conquista. Foi um tanto frustrante? Claro, mas eu ainda estava em um “período” de adaptação.
E, antes que faça a segunda pergunta óbvia, nenhuma dessas mudanças foram feitas em um vácuo. A Paradox adicionou novas árvores de tradições que aumentam a quantidade de líderes que você pode ter sob o seu comando. Mas, outra vez, é uma questão de se adaptar e pensar de maneira mais “tática” em como estruturar o seu império.
Eu sei, agora você deve estar pensando: “Lucas, perdoe a pergunta, mas você é burro? Por que então você não esperou para atacar os humanos sem esse prejuízo e com uma frota menor?”. Não havia tempo, meus caros. Eu fazia fronteira com a “Qvagh Corporation”, uma megacorporação que estava lentamente engolindo a galáxia ano após ano.
Eles até tentaram ser os meus amigos de início, estabelecendo escritórios nos meus planetas e me prometendo uma grande quantia de energia em retorno. Eu aceitei, pois, àquela altura, não tinha muito o que ser feito. Eu não queria guerra com eles, já que as minhas frotas com no máximo 100k de poderio bélico não eram nada comparada às dos Qvagh que tinham mais de 600k no mínimo.
De um lado, humanos que não queriam nada comigo, de outro, uma corporação que era amigável demais para o meu gosto. O que fazer? Investir nas minhas colônias, é claro!
Acredito eu que já deixei mais do que claro que o sistema de líderes dá uma bela sacudida em “Stellaris”, e seus principais planetas são inevitavelmente impactados. Após aumentar o meu limite de líderes, me voltei para investir tempo em construir novas estações de defesa e fazer com que eu tivesse uma economia forte no caso de uma possível invasão dos humanos ou da megacorporação.
Com um governador em cada um dos meus 6 planetas — o que engoliu mais da metade do meu limite de líderes — pude ajustar seus traços para que eles me apoiassem em uma maior produção de alloys para fortalecer as minhas naves, apoiar a pesquisa e garantir que as minhas pesquisas fossem cada vez mais fortes. E lá fiquei no meu canto do universo por um bom tempo. Uma bênção e uma maldição
Quando me senti forte o suficiente para atacar os humanos, fui pego de surpresa por um embaixador Necroid. “Uh… isso não é bom”. Enquanto eu estava na minha ilha “paradisíaca” tentando jogar “tall” por necessidade, os humanos foram engolidos por uma hegemonia de Necrons que, adivinha? Isso mesmo, possuíam um poderio bélico ainda mais forte do que o meu!
Teimoso do jeito que eu sou, tentei jogar todas as minhas frotas para ao menos expandir a minha zona de controle e abocanhar mais um ou dois planetas para servirem de indústrias. A manobra deu certo e os Necrons acabaram dando para trás após longas perdas enfrentando minha boa linha defensiva, graças aos bônus dos meus almirantes.
A essa altura da partida a assembleia intergaláctica havia sido estabelecida, para a surpresa de ninguém. A maior força política eram os Qvagh, cujo peso nas decisões era tão grande que eles eram capazes de passar qualquer medida que queriam, e os que se opunham não tinham voz.
Eu até cogitei converter mais votos para o meu lado removendo líderes e usando envoys, mas seria quase como trocar 6 por meia dúzia. Poderia perder um almirante que faria ou não diferença em uma batalha só para aumentar a minha voz durante a fase de negociação de leis. Considerando a minha situação precária, achei melhor não mexer no meu time, que a essa altura estava…. lentamente perdendo.
Em outros tempos eu já teria largado a partida de lado, começado uma nova e esquecido a maldita megacorporação. Mas eu não estava disposto a isso. Eu estava investido para ver como esse drama todo ia desenrolar, eu… estava me divertindo no mid game de “Stellaris”. Sim, algo raro – diria até inédito para mim.
Por anos “Stellaris” brilhava no early game, era monótono no mid game e ocasionalmente chato em late game. As mudanças, por mais duras que possam parecer, dão mais “clareza” de quais caminhos são viáveis durante as etapas mais avançadas do jogo. Não é a perfeita combinação de Grand Strategy e 4x, e nunca vai ser, dada a sua estrutura, mas ao menos há mais ferramentas para você guiar o seu império como bem desejar.
Não há um melhor exemplo disso do que o já citado gabinete do seu império, que permite que você lance “agendas” que dão bônus massivos para o dano ou tempo de construção das suas frotas militares, ou aumenta a velocidade de exploração das suas naves científicas. A lista de “agendas” — como são chamadas — é enorme e só aumenta o leque de roleplay e de opções para estabelecer o domínio do universo. Se não fosse pelos bônus dos conselhos e dos líderes, eu acho que teria muito bem abandonado essa partida. Mas, graças a eles eu consegui manter a minha minúscula presença na galáxia e ainda sobreviver a possíveis investidas de outros impérios que não acabaram subjugados pela megacorporação.
A partida, no entanto, não teve um final feliz. Em uma manobra no mínimo lastimável, eu tentei ser ousado e partir para cima da megacorporação. Achei que meu poderio bélico — montado horas após horas de jogo — seria capaz ao menos de destruir algumas das suas instalações. Eles chegaram com um Juggernaut — uma das maiores classes de naves — e destruíram um dos meus planetas. Do grande “Under One Rule”, sobrou apenas o nome. Virei mais um protetorado de uma megacorporação. Como odeio elas. Ainda bem que ela foi completamente engolida pela crise de endgame assim como eu, mas ao menos me senti vingado.
Ainda vai demorar um tempo para que todas as arestas de “Galactic Paragons” e da atualização 3.8 sejam totalmente aparadas. Embora eu tenha tido “sucesso” com a minha partida, é claro para mim que jogadores que optam por raças humanóides irão perder líderes e bônus com muito mais frequência e que isso vai ser um ponto grande de frustração. Democracias em especial são as mais afetadas pela mudança. Há a opção de automatizar a escolha de traços para os líderes, mas eu pessoalmente não sou um grande fã de automação em “Stellaris”. Ela não funcionava com setores, não funcionava com planetas, e duvido que venha a funcionar com líderes.
Mas aí entra a grande pergunta de todas: você quer que “Stellaris” se curve aos seus desejos, ou você quer que ele permita tecer uma história mesmo quando a sua partida está prestes a desabar? Que tipo de jogador você é, exatamente? Pode soar como uma variante do “Este jogo é um 4X ou um Grand Strategy”, mas não é. Ambos os estilos podem tecer histórias, mas “Stellaris” ao menos me deixa ver a minha queda de forma tão… majestosa.
A comunidade como um todo vai sentir o impacto da expansão e da atualização 3.8 de “Stellaris”. A Paradox decidiu seguir outro rumo com ele e, sinceramente? Eu estou contente com essa decisão. Depois de 7 anos no cabo de guerra entre “ah, mas esse jogo não é bom e mal é um 4X” e “ah, mas esse jogo é bom sim e ele tem um futuro” na minha mente, sinto que cada vez mais a Paradox tem uma visão clara do que ela quer para o futuro do Grand Strategy / 4X. Ao menos disso eu não posso reclamar.
Stellaris: Galactic Paragons
Total - 8.5
8.5
“Galactic Paragons” e atualização 3.8 fazem mudanças importantes na estrutura de “Stellaris”. Algumas eu vejo como ótimas, outras vejo que precisam de uma boa dose de refinamento. Não vai ser fácil se ajustar a elas, mas após tantos anos vendo a equipe da Paradox batendo a cabeça tentando melhorar o mid e o late game, acredito que eles encontraram um caminho bastante favorável para uma boa parcela da comunidade. Demorou 7 anos? Sim, mas ao menos eu me sinto revigorado e decidido em investir mais tempo no game.