A medida em que as principais franquias de shooter tomaram proporções imensas e se focaram no espetáculo ao invés da usabilidade, comecei a ter menos interesse por elas. Partidas de 64 jogadores tornaram-se confusas e o foco do trabalho em equipe dá lugar ao individualismo. Rising Storm 2: Vietnam, desenvolvido pela Tripwire Interactive e a Antimatter games, é a antítese desse movimento.
Construído em cima da base estabelecida por Red Orchestra 2 e Rising Storm, Vietnam segue uma linha mais “realista” de shooters, onde posicionamento e flancos são mais comuns do que um avanço em massa por parte de um dos times.
O período do Vietnã se consolida como o início da mudança tática usada pelos Estados Unidos e como os grupos separatistas vietnamitas entravam em combate com eles. O terreno simétrico de Red Orchestra ou Rising Storm dá agora lugar para vales, cidades e densas florestas. O problema é que boa parte dos jogos situados no período raramente dão importância sobre como o combate funcionava nesses terrenos e Rising Storm 2 está ciente disso.
Ele utiliza principalmente do arsenal para demonstrar um combate assimétrico. Ambas as equipes possuem qualidades e fraquezas bem definidas. Os EUA são capazes de jogar Napalm e usar helicópteros, entretanto pecam na mobilidade e dependem da sobrevivência do líder de cada esquadrão para que os outros jogadores não tenham de começar a partida na base.
Já os vietnamitas não possuem um arsenal bélico tão poderoso, porém podem criar bases temporárias em quase o mapa todo, além de mais de cinco tipos de armadilhas e túneis espalhados pelas fases. Claro que isto é apenas uma fração do que aconteceu no Vietnã e exemplos de como a foi a atuação dos Estados Unidos e seus aliados na região são melhores entendidos em jogos como o jogo de estratégia por turnos Vietnam ’65, mas é um avanço considerável em questão de shooters “realistas” voltados a um público maior.
O resultado da assimetria transforma completamente a forma que cada jogador de uma equipe enxerga o mapa e se movimenta por ele. Rising Storm 2 pune fortemente quem decidir sair correndo em um campo aberto. Uma bala certeira é mortal, além de facilmente dar a sua posição para o time inimigo inteiro. Busca-se novos caminhos, preparam-se armadilhas, reestruturam-se metodologias de eliminar o oponente.
Visualização de terreno, zonas de controle e fluxo de infantaria tem sido as minhas principais críticas em shooters. Battlefield 1, por exemplo, tem um design voltado para manter o jogador sempre presente na ação. Inicie em uma bandeira, próximo a um soldado amigo, em um avião. Não importa aonde, sempre há algo a ser feito, uma explosão e etc. O problema de tal “solução” é diminuir a visão do jogador de uma batalha no geral. Quantas vezes alguns já reclamaram como “não sabiam o motivo” de terem perdido ou acabarem por achar o modo conquista chato. Até mesmo o modo Operations foi recebido de modo mais positiva pelo simples fato que ele provê objetivos visíveis, cria um fluxo e direcionamento para as unidades.
A melhor forma que Rising Storm 2 encontra para isso é o novo modo Supremacy, por mim considerado a principal evolução da franquia que, junto com Squad (ainda em Early Access), vem se tornado os meus shooters militares preferidos dos últimos anos.
No Supremacy há o conceito de conquista de território de uma forma não linear. Cada território é ligado por uma linha, pense nela como uma linha de suprimentos. Com bandeiras listadas de A até G, se cria a oportunidade de estabelecer diferentes tipos de táticas dentro de um mesmo mapa.
Quando o lado dos Estados Unidos conquista três bandeiras, sendo uma delas ligada apenas por uma linha de suprimento, o inimigo pode muito bem conquistar essa área e facilitar a captura das outras duas. Vai embora a fórmula onde uma ação A tem a reação B e entra a fórmula de que a ação A pode ter resultados “A”, “B”, “C”, “D”, “F”, etc. As partidas perdem a sensação de mesmice que eu vejo tanto em outros shooters, onde os pontos de conflito são tão bem definidos que se não se preparar para um possível encontro com inimigo na área “X” ou “Y”, você está fadado a perder.
Ele oferece a devida quantidade de informação para que as equipes e os esquadrões que as formam tomem decisões, mas nunca se sintam perdidas no combate. Se há um ponto de captura tomado pelo inimigo, o jogo rapidamente questiona: qual é a melhor maneira de atingir o objetivo?
Rising Storm 2: Vietnam cria sistemas para que os mapas o sustentem e não mapas que justifiquem a existência de certos sistemas. A quantidade de apenas nove mapas no lançamento pode parecer pouca, porém dado a forma que tanto o modo Supremacy — como conquista de territórios tradicional — funciona, você tem diversas formas de navegar por ele. Junte isto ao ritmo demasiadamente lento das partidas, que podem durar mais de uma hora, e você tem um jogo que pede uma atenção constante do jogador para possíveis zonas de conflito e formas que o oponente tem de se aproximar de você.
Existe o afunilamento de locais, criação de chokepoints, mas o medo surge quando você está dentro de uma cabana, com poucos reforços e com uma breve noção de onde o inimigo pode aparecer. “Será que ele vem pela montanha? Ele tem uma base avançada próxima? Como eu vou vê-lo no meio desse mato todo?”. Explosões pontuadas vindas de artilharias ou bombas só pioram a situação. O espetáculo aqui é como Rising Storm 2: Vietnam faz o jogador se sentir acuado, insignificante, e não um exército-de-um-homem-só.
Quando escrevi as minhas primeiras impressões, mencionei a importância da introdução de um sistema de progressão — algo que faltava tremendamente em Rising Storm e Red Orchestra 2. Por mais que ele esteja presente, acaba por se tornar supérfluo a mim pois as minhas principais críticas com os mapas haviam sido sanadas.
Ao invés da Antimatter Games tentar abraçar um dos dois principais modos de jogo, ela conseguiu o quase impossível, equilibrá-los para que sejam divertidos em todos os mapas. Isto é notável em pequenas alterações no layout de Hill 937, na redução da área jogável em mapas do modo Territories em Hue City e Chu Chi.
Fazia tempo, muito tempo, em que eu não via um conjunto de mapas tão diversos e bem trabalhados como o de Rising Storm 2. A única preocupação é a Antimatter ser capaz de manter a qualidade dos possíveis novos mapas, pois o grau que estabeleceram está lá em cima.
Com o subgênero de shooters militares voltados para “realismo” perdendo a força que tinha em meados de 2000, cada lançamento deve ser celebrado ao máximo. Rising Storm 2: Vietnam não é apenas um excelente shooter, ele dá uma nova forma a franquia e avança em pontos importantes o que era até então considerado uma jogabilidade relativamente simétrica e, até um pouco chata. Mostra que há muito espaço ainda para implementar mudanças no design para que os jogadores tenham situações interessantes do que um puro espetáculo visual.
Rising Storm 2: Vietnam
Total - 9.5
9.5
Enquanto boa parte da indústria enche de efeitos visuais e elementos de progressão um em cima do outro, Rising Storm 2: Vietnam adiciona o mais básico da progressão, mapas que se adequam as suas mecânicas e gera tensão ao lembrar o jogador que ele é, acima de tudo, muito frágil. Mais um excelente shooter voltado para o realismo que sabe que variedade não vem de inúmeros sistemas ou mecânicas, mas sim como uma ou duas interagem entre si.