Pergunte-me como eu gosto dos meus jogos de corrida e a minha resposta vai ser “Difíceis”. Não necessariamente com uma IA difícil, mas difícil de se tornar um expert. É por conta disso que grande parte da minha vida foi voltada a simuladores. Eu nem sempre tenho essa possibilidade quando o assunto é motos. Eu apreciava de longe a franquia “RIDE” pelo que ela almejava, um misto de realismo e “arcade”. Mas foi só com “RIDE 5” (Steam / PlayStation 5 / Xbox Series S/X) que eu comecei a me conectar melhor com ela — porém não necessariamente ela se conectar comigo.
O mais novo projeto da Milestone — praticamente um monopólio da indústria do motociclismo — acompanha bem de perto o seu modus operandi: Desenvolva títulos anuais como MotoGP e Monster Energy Supercross 6 (o qual eu escrevi uma crítica sobre) e depois inclua todas as suas melhorias em um jogo massivo e ambicioso. Afinal, não há forma melhor de descrever “RIDE 5”, com suas mais de 30 pistas e mais de 200 motocicletas de diferentes categorias.
Mas o que me atrai nele é justamente a sensação de realismo, algo que a Milestone vem trabalhando não só em seus outros jogos, como disse acima, mas cuja fundação ela já tinha começado a estabelecer em “RIDE 4”. Uma moto “básica” como uma Hornet não vai ter o mesmo controle de uma Yamaha top de linha. Pneus fazem diferença, alterações na suspensão e caixa de marcha são muitas vezes cruciais para obter o melhor tempo na pista.
A sequência expande esses aspectos com uma IA mais agressiva — que era uma das minhas maiores críticas sobre “RIDE 4” —, novo modelo de pneus e física e a adição de um sistema de clima dinâmico. O último, um componente que vem sendo abraçado por mais e mais desenvolvedoras com resultados diferentes. Em “RIDE 5”, ele dá um show à parte, isto é, quando ele aparece.
Tudo o que eu escrevi até agora faz um fã de motociclismo que busca um jogo mais “realista” falar “Nossa, é exatamente tudo o que eu quero!”. Eu mesmo disse isso pra mim mesmo quando fiz as corridas iniciais de “RIDE 5”, porém há um outro lado da moeda, uma pergunta para a qual a Milestone ainda não conseguiu encontrar uma resposta: como convencer as pessoas que preferem um jogo mais “relaxante” a investirem o seu tempo e dinheiro na franquia.
Cansei de ver ao longo dessa última década de cobertura de jogos esportivos fãs comentarem “Mas jogo ‘X’ é o meu preferido”, ou “Jogo ‘Y’ foi o melhor da franquia e desde então ela desandou”. Eu não costumo dar ouvidos a esse tipo de comentário, mas quando se trata da franquia “RIDE”, há um pequeno fundo de verdade nisso.
“RIDE 3”, que foi a porta de entrada para a maioria dos fãs, é muito, mas muito mais voltado para o estilo arcade, mais do que todos os outros jogos feitos pela Milestone desde então. O controle das motos é mais simplificado, há um indicador de quando um oponente está prestes a te ultrapassar e frenagens bruscas não fazem seu piloto sair voando.
Desde a mudança para uma pegada mais “realista”, a desenvolvedora tem se apoiado no seu sistema de “assistências” para tentar capturar esse público. Acontece que, as assistências tanto de “RIDE 4” quanto de “RIDE 5” mais prejudicam do que ajudam. Pegue a opção de “frenagem automática”, por exemplo. Ao invés do jogo te dar uma ajudinha, ele freia a sua moto bruscamente nas curvas e te deixa confuso sobre o porquê de tanta agressividade.
Eu tentei jogar com o sistema de assistências ativo nas suas três configurações — “amador”, Semi-pro” e “Pro”. Não houve uma corrida que terminei no quarto lugar sem usar a opção “Pro”. Eu não tinha controle algum da moto, eu não sentia como ela se comportava na pista e não compreendia os pontos de frenagem.
Eu já tinha sentido esses problemas em “RIDE 4”, mas a nova física de “RIDE 5” os torna exponencialmente piores. A maioria das motos agora fazem uma curva mais aberta, tal como “MotoGP 23”, o que requer um domínio sobre como ela se comporta e até onde você pode “forçar a barra” sem perder o equilíbrio. Com as assistências ligadas, a única pista que eu via era a grama, pois o sistema não foi adequado para isso. Qual o melhor jeito de jogar “RIDE 5” então? Isso mesmo, com tudo desligado.
Para mim, uma gigantesca bênção. O controle das motos está fantástico e a maioria dos erros que cometi nas corridas foram única e exclusivamente meus. A IA, mais agressiva, me fazia recomeçar a mesma corrida dezenas de vezes até eu de fato aprender a pista e conquistá-la. Eu estava no paraíso do motociclismo… até entrar em outro abismo, o modo carreira.
Este seja talvez o único ponto em que eu concorde com a comunidade de “RIDE”: “RIDE 3” ainda tem o melhor modo carreira da franquia. Ele não só é vasto, como conta a incrível história da evolução das motos, e permite que você escolha como prosseguir na carreira. O modo carreira de “RIDE 5” é sem sal, conservador, linear e monótono.
“Entre nessa categoria, vença quatro corridas e depois vá para a próxima categoria e repita o mesmo”. Para que isso? Com uma quantidade enorme de motos, por que não diversificar? Para piorar a situação, o modo carreira te força a jogar as corridas de resistência, que duram no mínimo 20 minutos. Eu não tenho problema em separar 20 minutos do meu dia para fazer uma corrida, mas e as outras pessoas — que ainda permanecem em “RIDE 3”, ou aquelas que buscam só se distrair dando três voltas na pista? A resposta da Milestone é “Bem, você pode salvar a corrida de resistência e voltar depois!”, uma resposta que não é tão agradável de se ouvir.
Por um lado mais “positivo”, você não precisa seguir ou sequer completar o modo carreira para acessar as suas pistas favoritas. “RIDE 5” mantém o incrível grau de personalização de “RIDE 4” com diferentes tipos de corridas, o retorno do modo split-screen e até um editor de competições. Quer ganhar dinheiro e comprar a sua moto favorita? Escolha uma corrida e vá em frente. Todavia, isso bate em outra questão que vem sendo explorada durante essa crítica: quem vai fazer uso disso? Sem dúvidas vão ser as mesmas pessoas que jogam com todas as assistências desligadas, como eu.
Uma vez eu comentei em uma rede social de como muitos jogos de corrida se limitam a três voltas por pista no modo carreira e como eu acho isso “chato”. Não que redes sociais sejam um território para diálogos com nuance, mas alguém prontamente me respondeu “Ué, por que não? Mais que três voltas vai ficar chato”. Por um lado, eu fiquei surpreso com a resposta, por outro a compreendi como vindo de alguém que não busca investir muito tempo em um jogo de corrida.
Agora que já cheguei nos “finalmentes” do modo carreira de “RIDE 5” e também explorei todos os modos possíveis dele, consigo mais do que nunca entender essa dualidade. As melhores funcionalidades dele — como o clima dinâmico e a física mais aguçada — só são realmente apreciados quando as corridas têm, no mínimo, 15 voltas. A Milestone se desdobrou para refinar um jogo com uma IA melhor que vai ser vista por uma pequena parcela da comunidade, e isto sou eu sendo bastante positivo. Para quem só quer “dar umas voltas e avançar no modo carreira”, “RIDE 5” não é a melhor escolha a não ser que essas pessoas decidam mudar seu posicionamento e cair de cabeça no mundo do automobilismo.
Eu me senti mais conectado com “RIDE 5” pelas melhorias, pela capacidade de personalização, pelo vasto conteúdo e por ter a oportunidade de jogar da maneira que eu bem entender. Entretanto, não vou negar que eu sou a exceção, e não a regra. O diálogo que “RIDE 5” tentava fazer comigo era: “Pode ativar as assistências, eu vou te ajudar a melhorar a sua pilotagem”, o que não é exatamente verdade.
Não tenho sombra de dúvidas que esses ainda são os meus passos iniciais em “RIDE 5”, e que eu ainda vou gastar muitas horas em suas tabelas de liderança, desbloqueando todas as motos ou simplesmente criando torneios para me divertir. Eu amo impor desafios a mim mesmo e ver se consigo conquistá-los. Mas essa posição “em cima do muro” da Milestone tem que mudar o quanto antes. Eu não tenho problemas em criar as minhas próprias corridas e meus próprios desafios, mas e o resto da comunidade? E aqueles deixados para trás com “RIDE 3”? Este não é, e nunca vai ser um jogo para eles.
“RIDE 5” é sim um salto de qualidade para a franquia, seja visualmente, mecanicamente ou em questão de sistemas. Pena que muitos desses aspectos vão passar despercebidos pela maioria. É uma recomendação mais do que certa para quem quer “apanhar” para aprender cada curva de uma pista, para aqueles que almejam ser os melhores da pista, e um prato cheio para quem gosta de personalizar. Para os outros, bem, quem sabe daqui a dois ou três anos com “RIDE 6”?
RIDE 5
Total - 8.5
8.5
“RIDE 5” não só é um jogo excelente para quem adora motociclismo, como um incrível salto de qualidade em comparação ao antecessor. Ao mesmo tempo, tal salto só vai ser visto por aqueles que estão mais do que dispostos a investirem o tempo necessário para se tornarem experts em motos. A franquia nunca esteve tão distante e inacessível para quem só quer curtir uma boa corrida e relaxar. Está mais do que na hora da Milestone rever esse posicionamento e decidir para quem, de fato, é a franquia “RIDE”.