Eu entendia a fascinação de algumas pessoas — incluindo eu — com jogos como “Powerwash Simulator” ou “Car Mechanic Simulator”. Não é todo dia que você tem a chance de consertar um carro ou manusear uma lavadora de alta pressão. Mas computadores? O que tem demais neles? Por conta desse pré-conceito que “PC Building Simulator” ficou tantos anos pegando poeira na minha biblioteca. Creio que tenha sido para o melhor, pois assim que comecei a jogar “PC Building Simulator 2” (Epic Games Store), eu finalmente comecei a entender o apelo dele, ou ao menos parte.
O que me convenceu a jogá-lo de início foi a promessa de um novo modo “carreira” mais robusto para a sequência. Apesar de não ter encostado no original, tudo que eu via dele eram computadores personalizados e nada mais. Eu não queria um sandbox; queria algo com estrutura e propósito. Neste aspecto, “PC Building Simulator 2” é fascinante.
A história aparentemente dá prosseguimento à “trama” (se é que posso chamar disso) do primeiro jogo, quando a loja de manutenção em que você trabalhava pegou fogo, mas misteriosamente o seu tio arranjou um novo local para você. Assumo que me senti meio que em um “Stardew Valley”, mas com PCs e sem ninguém em volta.
As primeiras horas de jogo são basicamente um gigantesco tutorial de como montar computadores – que em partes é mais útil do que muitos vídeos que vi circulando na internet. O jogo segura a sua mão do momento da instalação da placa mãe, parafusos, cabeamento, até aplicação de pasta térmica e inicialização. Óbvio que ele não suplanta ler o manual da sua placa mãe e ter o gabinete certo, e nem deve, mas já é uma ajuda e tanto para quem nunca montou um PC.
Há um grau de abstração no que diz respeito aos processos com mais nuance, como a instalação de Windows ou Linux. Mas, considerando que ambos os sistemas operacionais na atualidade são bem diretos de serem instalados em comparação com o terror que era 20 anos atrás, eu consigo conviver com essa decisão. Ao menos ele ensina como selecionar o drive de boot / instalação a partir do menu da sua placa mãe, e isso já diz muito sobre o jogo.
Ao mesmo tempo que ele faz isso, é inegável que “PC Building Simulator 2” é uma grande frente para que as marcas apresentem os seus produtos. Não é à toa que, antes mesmo de você chegar no menu principal, nomes como “NVIDIA”, “Kingston” e “NZXT” aparecem na tela. A loja de onde você compra as peças para manutenção dos computadores está recheada dos coolers mais poderosos que não vão caber no seu orçamento de início e placas de vídeo que ainda estão em falta no mercado ou são vendidas por preços exorbitantes no Brasil.
Você não vai ver, por exemplo, uma situação onde a placa de vídeo veio com defeito de fábrica, mas sim uma placa de vídeo que precisa ter pastilhas trocadas por conta de alto uso – o que é algo “relativamente” normal. Em outros momentos o jogo vai te dar uma missão onde você tem que trocar uma placa mãe que está com defeito, mas não descreve o defeito em si. Ninguém quer que seu produto seja visto com maus olhos, certo?
Dito isso, eu fiquei impressionado com o modo carreira e como ele consegue “replicar” as dores de cabeça da área de manutenção onde o cliente chega e fala “Então, eu não sei o que está acontecendo com o computador, ele só não liga”. Tudo isso para você abrir, ver que ele está cheio de poeira, o cooler do processador está desconectado, e ao iniciar ver que o computador está repleto de vírus.
Como alguém que, no começo da idade adulta, trabalhou em um ambiente de trabalho muito pior do que o apresentado em “PC Building Simulator 2”, foi uma horripilante e nostálgica viagem no tempo. Uma das anedotas daquela época foi a empresa para a qual eu trabalhava vender um computador que precisava de uma solução de resfriamento muito mais poderosa do que ele possuía. O cliente o colocou dentro de uma caixa de metal, no sol de 40ºc, e não entendia o motivo do computador desligar. Eu devo ter passado uma tarde para explicar por “A+B” que não tinha como o computador funcionar naquelas condições. Falo da época do Athlon 64, então vocês conseguem imaginar a temperatura de um processador com um cooler de fábrica dentro de uma caixa de metal no sol.
O loop de gameplay de “PC Building Simulator 2” não vai aos confins dessa complexidade – e nem precisa. A maioria das requisições dos clientes são a instalação de novas placas de vídeo, processadores, memória, watercooling ou outras partes do computador. Você tem o seu ocasional problema como o computador empoeirado citado antes. Mas a melhor maneira de ganhar dinheiro rápido é pegando PCs usados e com problemas, consertá-los e revendê-los.
“PC Building Simulator 2” te dá um empurrãozinho para ser mais “criativo”, vendendo computadores com overclock, memórias mais potentes ou um gabinete cheio de luzinha. Por mais que ele tente criar um equilíbrio em instigar criatividade para favorecer o lucro e mexer com partes mais “complexas” do computador, ele não funcionou para mim.
A questão em si é que os elementos de overclock são tão simplórios quanto o restante do jogo, o que cria um abismo em relação ao que é a realidade. O jogo até se esforça para mostrar conceitos básicos, mas a quantidade de variantes que existem no mundo real é muito maior e os resultados podem ser muito mais catastróficos.
Entendo muito bem a razão da “Spiral House” ter decidido por este caminho ao invés de algo mais complexo. Primeiro que, como disse, “PC Building Simulator 2″ é uma grande vitrine de marcas mais do que qualquer outra coisa; segundo, que seria sobrecarregar o jogador demais com informações. Às vezes o melhor caminho é simplesmente usar uma ferramenta de testes, mostrar que o overclock funcionou e vender.
Por conta disso, o próprio modo criativo — onde você tem liberdade de montar o computador dos seus sonhos e tem todas as peças liberadas de cara — me apeteceu muito pouco. Se você quer passar horas pintando, personalizando e ajustando o seu computador para ele ficar nos trinques, você vai amar, mas não é para mim. Ainda mais com a quantidade de personalização de luzes no computador. Se eu desligo as poucas que eu tenho no computador e no meu teclado, eu sequer quero vê-las em um jogo.
Eu preferi seguir a minha carreira de manutenção e ajudar as pessoas a resolverem problemas em seus computadores do que revender computadores usados. O único ponto “negativo” é que isto faz com que o modo carreira – que já é longo com as suas 30h ou mais – quase dobre de duração. Então pode se preparar para consertar muitos computadores.
Creio que este não era o intuito da “Spiral House”, pois quanto mais eu adentrei, mais missões apareciam com limitações relativamente bobas. Se um cliente me pedir para colocar uma placa de vídeo melhor que a atual dele e eu, por exemplo, colocar uma “top de linha”, o jogo não vai me permitir completar a missão já que eu vou ter prejuízo. Poxa, “PC Building Simulator 2”, deixa eu ajudar as pessoas se eu tenho renda extra!
Como tantos outros jogos no estilo, “PC Building Simulator 2” acabou virando mais um daqueles que é quase um ritual para mim. Estou cansado do dia ou da semana? Abro ele, conserto uns computadores, resolvo pendências, depois vou dormir ou fazer outra coisa. Eu gostaria que em certos aspectos o seu loop de gameplay tivesse um tiquinho mais de complexidade, mas sei que isso na atual estrutura é impossível.
Duvido muito que eu vá gastar o mesmo tempo nele do que em outros jogos como Car Mechanic Simulator ou até House Flipper. Mas, para quem quer personalizar um PC ou até aprender o básico do básico sem ter que depender de tutoriais que demoram 40h para chegar ao ponto, é uma boa pedida. Ou, bem, você sempre pode escolher o modo criativo e instalar aquela 4090 dos seus sonhos sem gastar o preço cobrado no Brasil.
PC Building Simulator 2
Total - 8.5
8.5
“PC Building Simulator 2” não esconde que é uma vitrine para as grandes marcas apresentarem os seus produtos. Mas, apesar disso, a sua campanha é cativante e possui um ritmo bem agradável. Eu gostaria que ele fosse mais complexo em certos aspectos e não tivesse algumas limitações em certas missões, mas não é nada que me impeça de continuar a jogá-lo. Relaxe, conserte computadores ou personalize-os. Sem dúvidas um desses aspectos irá te agradar.