Se fosse para retraçar o meu interesse em veículos gigantes, acredito que eu teria dois grandes pontos de referência: Por algum motivo morar perto de alguma construção – algo que parece ser uma tendência no Brasil, este é um país de obras intermináveis, tanto públicas quanto privadas – e de vídeos de Monster Trucks na TV à cabo. O evento mais Norte Americano que já vi pode não ter a maior base de fãs no país, mas a sua ausência nos últimos 15 anos me fez buscá-lo em jogos. Minhas tentativas não foram muito bem-sucedidas. Ao menos até por as minhas mãos em “Monster Jam Showdown” da Milestone Srl (Steam, PlayStation 4/5, Xbox, Nintendo Switch).
A desenvolvedora italiana que vem em ascensão nos últimos anos com excelentes jogos de corrida licenciados como “Hot Wheels Unleashed” (crítica) não mostra sinais de desacelerar tão cedo. Após dar vida aos carrinhos da minha infância em dois jogos que posso definir como uma das melhores demonstrações de que ainda há um baita mercado para jogos arcade desde que eles tenham conteúdo, variedade de pistas e uma IA decente, ela faz o “impossível” com “Monster Jam Showdown” – produzir um jogo da franquia com controles decentes.
Embora a última tentativa de revitalizar a série – “Steel Titans 2” – da Rainbow Studios não tenha sido ruim, a atual desenvolvedora da franquia “MX vs ATV” ainda não sabia em 2021 como transferir para a tela o peso e a agressividade de um Monster Truck. São máquinas gigantes que pesam pouco mais de 5 toneladas. Imagine a potência que este veículo tem ao acelerar, frear, fazer uma curva. Sem falar em toda a suspensão que eles utilizam para se manterem estáveis e ainda realizar manobras. Em “Steel Titans 2” eles pareciam feitas de papel, já em “Monster Jam Showdown”, são verdadeiros monstros.
Antes que você pense que eu vou escrever um parágrafo e meio sobre o incrível grau de simulação que a Milestone atingiu em “Monster Jam Showdown”, já adianto que ele não é um simulador e nem almeja ser em ponto algum. Ele é o mais puro suco do arcade, mas que não se dá por contente apenas em criar situações em que o jogador precisa apertar o acelerador e chegar em primeiro lugar nas corridas. Quer esse feito? Então domine a fera.
O que o diferencia tanto de outras tentativas de múltiplas desenvolvedoras é a implementação de um controle “secundário” no analógico direito para estabilizar a traseira do caminhão. Para colocar da forma mais simples possível, todo e qualquer evento de “Monster Jam Showdown” requer que você tenha uma boa noção de como acelerar, frear e usar tanto o analógico esquerdo para controlar a frente do caminhão e o analógico direito para controlar a traseira.
Nas primeiras horas de jogo eu confesso que o método de controlar o Monster Truck não me agradou muito. “O que você estava pensando Milestone, é impossível de controlar isso!” e outras variantes mais agressivas foram pensamentos frequentes. A curva de aprendizado não é alta, mas certamente é inusitada. Porém, é incrivelmente recompensador assim que você pega o jeito. Não tardou muito para eu estar fazendo manobras insanas, drifts durante as corridas e obtendo a maior pontuação nos eventos de manobras radicais.
Por falar em manobras radicais, esse é um dos pontos mais fortes de “Monster Jam Showdown”. Apesar da pouca variedade de manobras, o sistema de combo é deliciosamente recompensante e os eventos que envolvem fazer manobras radicais em estádios, usar peças do cenário para destruição e continuar um combo.
Em anos buscando um jogo de Monster Trucks, eu não havia me sentido tão satisfeito com os eventos de manobras radicais de “Monster Jam Showdown”. “É disso que precisamos mais em jogos de corrida, modos bobos e divertidos”. Eu completei todos os eventos disponíveis para mim neste modo antes de encostar no restante do que o jogo tem a oferecer. Todavia, há um motivo para isto: A IA e os mapas voltados para corrida.
Eu não citei “Steel Titans 2” no começo da matéria à toa. A Rainbow Studios não tinha a melhor ideia de como traduzir o peso de um Monster Truck para um jogo, mas sem dúvidas tinha uma excelente noção de como criar pistas vastas com múltiplas rotas e que desafiavam o jogador em encontrar a melhor forma de chegar em primeiro lugar. As pistas de “Monster Jam Showdown” são, no mínimo, decepcionantes.
Levando em conta toda a ênfase que a Milestone colocou no período pré-lançamento sobre o “novo” modo offroad, ele é uma baita decepção. As pistas são claustrofóbicas ao ponto de um erro te colocar em último lugar sem chances sequer tentar buscar um pódio – mesmo um 3º lugar. Não há espaço para manobrar os gigantescos Monster Trucks. Cedo ou tarde você pode bater em um oponente, a resposta dele? Nenhuma. Aparentemente, o sistema de controle mais complexo de um Monster Truck se aplica apenas a você.
A questão da IA em jogos de corrida mais arcade da Milestone já tinha dado sinais possíveis problemas no futuro desde o segundo “Hot Wheels Unleashed” (crítica). Mas, ao menos as pistas do título tinham diferente formas de cortar o caminho e diferentes classes de veículos. Quando eu estava com dificuldade em completar uma corrida, simplesmente trocava para outro tipo e as chances de eu chegar ao menos em 3º lugar subiam consideravelmente. “Monster Jam Showdown” não tem esse luxo.
Há sim alguns eventos que se sobressaem mesmo com os problemas de IA. As corridas em estádios com cruzamentos caóticos onde eu vi uma série de Monster Trucks empilharem são hilárias e definitivamente o modo que eu mais gostei após os eventos de manobras radicais.
Mas, como comparações são inevitáveis, sinto que “Monster Jam Showdown” deixa muito a desejar em várias áreas, ainda mais comparado com os jogos da série “Hot Wheels Unleashed”. O mapa de campanha é pouco inspirado e segue uma linha “faça evento X e Y para liberar evento Z”. Um grande passo para trás. Ao menos ainda há liberdade de escolher quais eventos priorizar, melhor do que ser forçado a jogar 3 corridas offroad seguidas e rezar para que a IA não arruinasse elas.
Longe de mim especular quais foram os motivos pelas decisões por trás da IA de “Monster Jam Showdown” e o porquê da Milestone se focar em corridas offroad com pistas tão estreitas, mas é impossível não dizer que foi uma gigantesca oportunidade perdida.
A desenvolvedora italiana estava com a faca e o queijo na mão, mas ao invés de cortar um pedaço gigante, ela cortou pequenos pedacinhos e falou “Assim está bom, não precisa mais do que isso”. E, para um jogo que acertou tão bem nos controles e realmente transmitiu a ideia de que você está controlando uma máquina que, em teoria, devia ser incontrolável, a falta de ambição dói.
Em um mundo perfeito, onde empresas não tem que ficar lutando para obter licenças oficiais, a melhor combinação seria unir os mapas criados para “Steel Titans 2” com a jogabilidade de “Monster Jam Showdown”. Mas, como não moramos nesse mundo, tenho que me contentar em colocar o título da Milestone no banco de reservas até o lançamento de novas pistas e – com sorte – que a expansão prevista para a região do Havaí comece a consertar os problemas das corridas offroad.
Espero e muito que “Monster Jam Showdown” não seja mais um “ponto final” para a franquia. A Milestone já acertou na jogabilidade e – como descrevi antes – não há um jogo mais prazeroso de Monster Truck do que ele. Dedos cruzados para que ela tenha uma segunda chance com uma sequência e ao invés de dar um passo para frente, dois para trás, vá com os dois pés para a frente.
Monster Jam Showdown
Total - 6.5
6.5
"Monster Jam Showdown” supera todos os seus antecessores em termos de jogabilidade, mas a seleção de pistas offroad claustrofóbicas e problemas sérios na IA diminuem, e muito, o brilho dele. Eu esperava muito, mas muito mais de uma desenvolvedora que nos trouxe “Hot Wheels Unleashed”. Dedos cruzados para que ela tenha uma segunda chance com uma sequência ou, ao menos, conserte os erros com futuras atualizações.