Se arrependimento matasse, estaria debaixo de sete palmos por não ter jogado Momodora: Reverie Under the Moonlight na época de seu lançamento para PC, mas ao menos me redimi a tempo com a versão para consoles, disponível tanto para PlayStation 4 como para Xbox One a partir de R$19,00.
Ainda que não numerado, Momodora Under the Moonlight é o quarto game da franquia iniciada em 2002 por Rdein e funciona como um prelúdio, onde a Sacerdotisa Kaho viaja de seu vilarejo natal de Lun para uma audiência com a rainha na tentativa de impedir que suas terras sejam tomadas por um estranho mal que surgiu repentinamente. Mal sabe ela que o próprio reino sucumbiu a ele.
Assumo ter deixado passar em grande parte por preconceito, olhado para a estética e dito a mim mesmo “É, isto não me agrada”. De baixo do meu preconceito se escondia um tremendo metroidvania.
Tendo jogado horas de Hollow Knight no começo de 2017, a transição para uma abordagem mais direta e, de cara, mais desafiadora foi impactante, mas muito bem-vinda. Os brasileiros Bombservice tem um grau de conhecimento de equilibrar punição e aprendizado que raramente se encontra em jogos.
Ao invés de estabelecer uma série de golpes, ou habilidades especiais situacionais, Momodora consegue se carregar por boa parte do jogo com apenas o uso de uma folha (como espada) e um arco e flecha. O cenário e o desafio são moldados ao redor de estabelecer um uso inteligente destes equipamentos em conjunto com a esquiva.
A suposta “limitação” faz com que eu aprecie melhor o posicionamento dos inimigos, comece a decorar onde eles vão estar na hora de fazer algum backtracking (raramente necessário), e planeje uma aproximação para os mesmos. O sistema não necessariamente é inovador, entretanto, polido.
Se por um lado metroidvanias buscam surpreender o jogador a cada nova área, Momodora: Reverie Under the Moonlight almeja torna-las reconhecíveis ao ponto de você decorar o ritmo de como deve transpô-las. É impressionante a naturalidade que navegar por elas se tornavam. Pula, esquiva, ataca, esquiva quase como o rufo de tambores. Não é à toa que uma comunidade de Speedrun surgiu em volta dele, tudo é tão mecanicamente bem executado que é difícil não entrar em um estado de completa atenção misturado com uma certa paz interior quando se joga.
Como um animal se preparando para dar o bote em sua presa, Momodora então brinca com as expectativas do jogador com os chefões. Pouco existe o famoso “build-up”, aqueles momentos onde você percebe pelo cenário que uma luta de maior importância vai acontecer. Às vezes é ao entrar em uma sala comum, ou cair em um buraco, surpresa, um chefão.
Atenção transforma-se em desordem, paz vai diretamente para inquietação. Raros foram as situações onde eu estava de fato preparado para um desses encontros. Tentava fazer o que dava para evitar morrer da maneira mais humilhante — tipicamente falhando no processo — e voltava para aprender como propriamente derrota-lo.
A Bombservice foi astuta o suficiente para colocar chefões que requerem um grau de proficiência nas mecânicas na hora certa. Da centopeia-humanoide na primeira área à um estranho ser fantasma encontrado nas catacumbas desoladas, eles refletem o conceito de que a partir do momento que o jogador chegou naquela área, isto quer dizer que ele está preparado para tal desafio — seja ele desviar de projéteis ou acertar o timing de quando atacar.
Há espaço para dizer que isto nada mais é do que uma nova camada de tinta sobre um design sedimentado desde os anos 80, porém Momodora: Reverie Under the Moonlight o faz tão atual quanto. Esta é a grande questão, que já comentei em outros textos, sobre jogos que almejam, mesmo que superficialmente, prestar alguma homenagem ou buscar sua essência no passado. “Simples” é o trabalho de olhar para um jogo e entender como ele funciona, difícil é pegar os elementos dele e converte-los em uma proposta atraente para a atualidade. Junto com a Joymasher (Odallus, Oniken), a Bombservice parece ter pego a alma do negócio.
Para alguém que não costuma ser daqueles que buscam todos os segredos do mapa, perceber que eu explorei mais de 80% sem ao menos me sentir entediado vem como a melhor maneira de demonstrar o quão bem espaçado e ritmado é o conteúdo de Momodora. “Vou derrotar esse chefão, depois vou para essa área ver o que tem”, não pelo desejo de explorar ou da surpresa como comentei antes, mas apenas por poder aproveitar mais do que o jogo me oferecia. Creio que se ele se estendesse por mais algumas horas, talvez um pedaço dessa magia tivesse ido por água abaixo, mas, mais uma vez o timing foi crucial em saber a hora de parar.
Detesto gerar discussões sobre o custo de um jogo e o seu tempo, afinal, isto dilui a experiência para um mero produto que deve ser avaliado unicamente por suas características superficiais. Acredito que somos melhores do que isto, mas também não posso deixar de ressaltar que pelo valor que é cobrado, não há como não falar que Momodora: Reverie Under the Moonlight é um ótimo negócio. Ele também serviu para eu aprender a deixar o preconceito de lado e agora dar uma chance para os outros games da série.
Me pergunto quantas oportunidades deixei passar por conta disso.
Momodora: Reverie Under the Moonlight
Total - 9.5
9.5
Reverie Under the Moonlight é um excelente Metroidvania que sabe demarcar a quantidade de ferramentas para o jogador e fazer com que ele as use ao seu limite. Sabe que precisa respeitar o tempo e até que ponto a sua jogabilidade funciona sem cair em repetitividade. Mecanicamente impecável e extremamente prazeroso de se jogar.