Quando se joga uma versão beta de um jogo, tudo indica que a versão final tem tudo para ser melhor. Ao menos é isso que se espera. No caso de Mirage: Arcane Warfare, o novo título da Torn Banner Studios (Chivalry: Medieval Warfare), o completo inverso aconteceu.
Mirage é o resultado de uma empresa que apostou todos os ovos na mesma cesta. Tendo em vista o imenso sucesso de Chivalry em 2012, nada mais tradicional do que fazer um spin-off que trouxesse algumas novidades e manter a base da fórmula intocada. A nova temática não poderia ser mais distante do que qualquer fã de Chivalry desejava.
O sistema de classes recebe uma total modificação com a inclusão de habilidades ativas. Cada uma possui um total de seis de seis habilidades com três que podem ser levadas para o campo de batalha. Algumas podem puxar os inimigos para longe, outras são pequenas armadilhas espalhadas pelo mapa ou, no caso da classe Taurant, jogar pedras gigantes. Quando vi as habilidades sendo usadas pela primeira vez no beta, as considerei situacionais demais para o modo de jogo disponível no período — capture a bandeira, dominação e Team Deathmatch. A versão final apenas tornou as coisas piores ainda.
Antes tínhamos habilidades situacionais que pouco agregavam ao combate de maneira geral. Mudanças no tempo de cooldown para a versão final as transformaram em ferramentas corriqueiras no campo de batalha, o que acaba por criar uma segunda discrepância — um vale de diferença entre habilidades entre jogadores que abusam das habilidades e aqueles que preferem o combate corpo-a-corpo.
Grande parte das habilidades podem ser esquivadas ou defendidas ao usar o botão de bloqueio, designado para o botão direito do mouse. Uma solução eficiente para você impedir o “spam” de habilidades e ter uma vantagem contra o oponente. Entretanto, o Mirage: Arcane Warfare dá uma base de estudos tão terrível que um jogador novato não tem a menor oportunidade de aprender exatamente como você deve usar armas corpo-a-corpo, que salvo correção de bugs presentes no predecessor espiritual, não tiveram grandes modificações. O esquema continua o mesmo. Dois ataques principais, dois ataques alternativos e um botão para bloqueio. Não é um sistema que se pega em uma ou duas, ou dez partidas como é com For Honor.
Por isso metade das partidas se desenrolavam da seguinte forma: Uma parte era formada por recém-chegados ao game, não tinham a melhor noção de como usar o combate e viam as habilidades como um ponto de fuga dos oponentes. Os oponentes, por outro lado, já estavam calejados de saber em que momento defender e faziam a outra equipe picadinhas.
Na pressa de diminuir a barreira de entrada para seus games, um ponto que eu concordo que sempre foi complexo para Chivalry, a Torn Banner Studios acaba por aumentar ainda mais. Tanto Mirage quanto Chivalry não devem ser tratados como “shooters” em primeira pessoa. Há todo um processo de treinamento, de descobrir o timing, alcance de cada arma, magia e existem pouquíssimas ferramentas para resolver o problema. Tutoriais são banais, tentativa e erro é frustrante. Partidas contra bots seria ao menos uma solução tangível, caso existisse. Nem isso está presente.
O problema fica ainda mais aparente no modo arena, uma das novidades da versão final. Nele duas equipes formadas cada uma por três jogadores competem em um mapa severamente reduzido. O uso de habilidades acaba com qualquer equilíbrio. Pegue um Beserk, com a capacidade de invocar uma pedra gigante, e uma jogada certeira transforma o que era uma partida divertida em um três contra um sem sentido. Vale menos a habilidade de acertar o timing dos golpes e sim saber quando apertar o botão “vencer”.
É frustrante para ambos os lados, pois quem não tem conhecimento do jogo não vê espaço para crescer e aqueles que já possuem se sentem amarrados por sentirem que as partidas conspiram contra eles. Eu mesmo vi momentos em que uma vitória no modo capture a bandeira não aconteceu pela interação entre os jogadores da equipe, mas sim por conta de um ou outro que dominou a partida com o uso excessivos de habilidades. Equilíbrio, no entanto, é a ponta do iceberg de Mirage: Arcane Warfare.
A versão jogada para as minhas primeiras impressões era surpreendentemente mais estável do que que foi usada no lançamento. O número de mapas aumentou para um total de 27, agora é possível personalizar o personagem. Diria que são adições se ao menos conseguisse usá-las. Partidas que eram dadas como ganhas mostravam uma tela de derrota. Diversas vezes tive de reiniciar o jogo por conta das armas desaparecerem após reviver, meu personagem ficar incapaz de se movimentar, ressucitar e instantaneamente ser teleportado para fora do mapa. Estava ainda mais ferrado se não tivesse decorado o atalho das habilidades, já que tanto os ícones quanto o tempo de “cooldown” entre cada ativação não eram atualizados corretamente.
Para completar o pacote, os servidores uma semana após o lançamento continuam completamente instáveis. Travamentos constantes, partidas desconectadas, longos períodos de carregamento sem motivo aparente, não recebimento de pontos de experiência. O lag constante — até em servidores nacionais — era ironicamente o menor dos defeitos. Jogar Mirage: Arcane Warfare era uma luta constante contra os problemas e o design de classes.
E me entristece escrever tais palavras, pois há muito o que ser celebrado. A estética é um ponto fortíssimo da Torn Banner, que conseguiu sair do estilo meio “genérico” de Chivalry para um jogo com mais identidade. Os equipamentos desbloqueados não são exagerados, se adequam ao tema e os mapas em sua grande maioria são bem desenvolvidos com pontos de fuga, formas de flanquear e possibilidades de estabelecer uma zona de controle. Eu espero que em um momento, o dinamismo dos mapas e a estrutura, verticalidade aplicada neles consiga ter uma razão de serem explorados.
Mirage: Arcane Warfare é como nadar contra uma correnteza de problemas sem fim. No final do caminho há um esqueleto de um jogo que precisa de muito polimento, que por mais visualmente atraente que seja, decepciona imensamente.
Mirage: Arcane Warfare
Total - 4.5
4.5
Um adorável estilo visual não omite o fato de que Mirage: Arcane Warfare possui irregularidades demais de balanceamento, bugs e conectividades online para ser um game multiplayer competente. Vindo de uma empresa que fez Chivarly, não poderia estar mais decepcionado.