Eu não me lembro a última vez que eu salvei o replay de uma partida para analisá-lo. Faz anos que a minha lista de jogos não inclui algo tão competitivo a ponto disto. Não me esforço em jogos de luta o suficiente para fazer algo assim, e RTSs são cada dia mais raros. Eu já devo ter salvado no mínimo 20 desde que comecei a jogar a versão 1.0 de “Mechabellum” (Steam).
O título da Game River é o que eu imaginei por muitos anos ser o futuro dos “Auto Chess” — ou melhor, autobattlers — mas que até então nunca havia se concretizado da forma que eu queria. Quando eu jogava com mais afinco o próprio “Auto Chess” e suas variantes, ficava com a sensação de “não dá para ser mais complexo não”? Bem, Mechabellum é, e isso é tantouma bênção quanto uma maldição.
Mas eu estou me apressando demais. Se você pensar em “Mechabellum” como um autobattler tradicional, você pode se decepcionar. A Game River foge muito do sistema de “comprar múltiplas unidades para subir uma de nível”. Cada unidade no campo de batalha tem uma função específica, alcance, dano, e diferentes modificadores que podem ser aplicados temporariamente e permanentemente. Isto não é um exagero.
Uma das tropas iniciais, os crawlers — pequenos robôs com brocas — têm valores de movimentação que são alterados quando sobem de nível, ou por equipamentos especiais, quando estão próximos de uma unidade de apoio, ao desbloquearem uma habilidade passiva… e a lista só cresce. Expanda isso para cada robô na partida e você tem uma noção da quantidade de variáveis presentes em “Mechabellum”.
A melhor forma de descrevê-lo seria como ver uma partida de “Total War”, mas que você não tem um controle direto sobre as unidades. Você pode colocá-las no mapa e ajustar a posição delas, mas assim que elas estiverem no campo de batalha, não há como movê-las. Isto é, a não ser que você use uma carta especial para isto (mais sobre essas mecânicas mais tarde).
A melhor forma de descrevê-lo seria como ver uma partida de “Total War”, mas na qual você não tem controle direto sobre as unidades. Você pode colocá-las no mapa e ajustar a posição delas, mas assim que elas estiverem no campo de batalha, não há como movê-las. Isto é, a não ser que você use uma carta especial para isto (mais sobre essas mecânicas mais tarde).
Isto faz com que o seu posicionamento inicial de unidades, e o conhecimento das mesmas, seja mais do que crucial. Dependendo da partida, pode ser a diferença entre começar com uma vantagem incrível sob o seu oponente ou tentar compensar a derrota dos primeiros rounds com tropas que consigam contra-atacar a estratégia do oponente.
Há de se pensar que, com uma complexidade dessas, “Mechabellum” tem um tutorial exemplar, certo? Pelo contrário. O tutorial do jogo dá uma pincelada geral nas mecânicas, te oferece certos desafios para você treinar que tipo de unidade deve ser usada contra outra… e para por aí.
Ele não menciona a possibilidade de posicionar unidades atrás das linhas de combate, os diferentes tipos de especialistas ou as dezenas de cartas que o jogo possui. Quer aprender? Vai aprender a ferro e fogo.
O problema estava presente desde que “Mechabellum” entrou em acesso antecipado, e eu imaginei que ao longo dos meses a Game River viria a melhorar ou consertar a parte de aprendizado. Se algo, a adição de novas mecânicas — ainda mais durante a versão 1.0 — só piorou a situação. O que era antes uma ladeira muito íngreme se tornou uma montanha muito difícil de escalar. Porém, uma cujo processo é incrivelmente recompensador.
Fazia tempo em que eu não me sentia tão instigado em aprender mais sobre as mecânicas e os pequenos detalhes de cada unidade como em “Mechabellum”. O ano de 2023 e 2024 teve lá seus jogos de estratégia em que eu investi um tempo no modo online. Partidas frequentes de “Solium Infernum”, uma tentativa desastrada ou outra de “Company of Heroes 3” e partidas de “Gates to Hell: Ostfront”. Todos divertidos da sua maneira. “Mechabellum”, ah meu amigo, aí a coisa fica séria.
“Ah, quer dizer que você vai usar ‘crawlers’? Então eu vou colocar um robô anti-swarm para ver a sua reação”. No próximo turno, o meu oponente tentava combater a minha estratégia com uma nova que eu sequer tinha visto.
Às vezes ele se aproveitava da ausência de ataque contra unidades aéreas dos meus robôs para destruí-los com facilidade. O que me “forçava” a gastar pontos de logística (moeda usada para comprar, melhorar unidades ou desbloquear habilidades) na esperança de que fosse o suficiente. Outras vezes usava uma carta especial — que é aleatoriamente oferecida no começo de cada round — para ganhar mais pontos de logística ou obter um equipamento especial que aumentava o dano ou defesa em até 40%.
É um cabo de guerra intenso que só é amplificado pelo fato que é impossível de ver o que o oponente está fazendo durante a fase de planejamento. Dependendo da partida, você coloca uma unidade altamente ofensiva e torce pelo melhor. Na maioria das vezes, recebe o pior.
Para você ter uma noção do quão “estressante” é uma partida 1vs1 em “Mechabellum”. Você só tem 60 segundos para tomar a maioria das decisões que eu descrevi acima e, muitas vezes, só uma chance de posicionar as suas unidades.
Olhava para o contador, olhava para as minhas tropas, olhava de volta para o contador e de volta para as minhas tropas. “Será que está no momento certo de atacar? Será que eu devo deixar as aeronaves nessa posição? E se o meu oponente defender com uma bateria ou forçar que elas se foquem em outra unidade que irá destruí-las de qualquer jeito”? Caros leitores, esses segundos passam voando e valem ouro.
Ao mesmo tempo em que “Mechabellum” tem este incrível elemento estratégico de entender posicionamento de unidades, ele não consegue mantê-lo tão bem à medida que as partidas avançam.
Uma das decisões mais controversas da Game River mesmo durante o período de acesso antecipado é aumentar a quantidade de pontos de logística recebidos quanto mais tempo uma partida durar. Na teoria, isto dá aos jogadores que estão “perdendo” múltiplos rounds uma chance de virar o jogo e vencer. Na prática, joga parte do elemento que faz “Mechabellum” tão especial fora.
O que eu vejo a maioria dos jogadores fazer é “enfiar uma quantidade enorme de unidades na tela e esperar que elas cumpram o objetivo de derrotar o exército inimigo”. Que se dane estratégia, posicionamento, como ou quando usar as habilidades. Os rounds finais são tão desnecessariamente longos que muitos optam por acelerar a movimentação das unidades só para ver o resultado final. Não é mais um jogo de números, é um jogo de inchaço.
Ainda bem que o problema, por ora, é limitado ao modo 1vs1. Os modos 2vs2 ou 4vs4 não são afetados já que é mais fácil de vários jogadores dividirem tarefas e especialidades. Por consequência, os pontos de logística adicionais são uma benção nas etapas finais. Muitas partidas viraram de cabeça para baixo justo por conta de um dos jogadores pegar uma carta ou melhorar uma unidade bem especializada e detonar um flanco dos nossos oponentes.
Quando esses momentos fantásticos acontecem, eu salvo o replay para assistir depois. Para entender o que rolou de certo ou errado, onde eu posso melhorar no modo de jogo, e quais escolhas poderiam ter sido ainda mais importantes.
Eu não sabia, mas eu sentia falta disso; sentia falta de encontrar um jogo onde eu fosse capaz de “dedicar” o meu tempo em partidas online intensas, mas que não cobrasse toda a minha atenção com ranks ou um “meta” que muda a cada semana. (“Mechabellum” tem temporadas, mas até então a Game River só altera as mecânicas no começo das mesmas). Um jogo, também, onde eu não tenho que me preocupar em ficar preso por 60 minutos em uma partida como “Dota 2” ou “Counter Strike 2”.
“Mechabellum” entrega muito bem a complexidade que eu tanto sonhava em autobattlers. Ainda há muito que a Game River pode expandir nas próximas temporadas e atualizações. Um botão de confirmação opcional ao movimentar as unidades, por exemplo, seria ótimo. Reduzir os pontos de logística no modo 1vs1 também é outro que eu espero que a desenvolvedora pense a respeito. E, por favor, um modo tutorial competente.
Estou aqui na torcida para que ela continue a desenvolver e expandir o jogo com mais temporadas. Ao contrário de tantos outros jogos de estratégia dos últimos meses, “Mechabellum” está com uma comunidade bem saudável e só tende a crescer quanto mais pessoas aprenderem — digo, sofrerem para aprender — as suas mecânicas.
Quanto a mim? Tenho outros replays para assistir e partidas para jogar. Vejo vocês no campo de batalha com a minha tática quase infalível de robôs-tatus. Vou ser massacrado.
Mechabellum
Total - 8.5
8.5
“Mechabellum” é a realização que eu tinha de um autobattler mais complexo. Embora a Game River dê uma deslizada séria no que diz respeito a tutoriais e perca um pouco do elemento de estratégia em partidas longas, quem estiver disposto a aprender todas as suas mecânicas vai ter em mãos um jogo igualmente intenso e recompensador. Você vai ganhar, perder, se desesperar, mas vai voltar para mais um round.