“Os jogos estão simples demais”, “Ocorre uma homogeneização de mecânicas”, tantas frases que ouço por aí quando o assunto é complexidade. Nem todas elas são verdadeiras, porém. Complexidade e profundidade devem ser tratadas de maneiras diferentes e não há um jogo em 2016 para mostrar isto melhor do que Mark McMorris Infinite Air, desenvolvido pela HB Studios e disponível no Steam por R$149,99.
Infinite Air é o equivalente de um soco na barriga, um tapa na cara e uma noite mal dormida. É construído da base ao topo da ideia que vence aquele que investir paciência e aprendizado nele. Uma, duas horas de jogo não são o suficiente para você sequer fazer uma manobra direito.
Medonho de início, ele pega como inspiração a mecânica base de Skate e as transforma em um bizarro e intricado sistema de regras e aplicações. Talvez o mais próximo que iremos chegar de um “simulador” de Snowboard na melhor maneira da palavra.
O mais simples movimento requer timing e precisão absurda. Um Ollie, por exemplo, deve ser feito com o stick direito do controle em um movimento não tão rápido, mas nem tão curto. Pulos em 360 graus são feitos ao pressionar o gatilho esquerdo ou direito em um tempo entre um ou dois segundos. Aperte demais e você dá de cara no chão, aperte pouco e você também dá de cara no chão. Tem-se a imagem das primeiras horas de jogo, não é mesmo?
Eu tenho um grande histórico em me frustrar com jogos extremamente complexos ou com sistemas pouco intuitivos. DCS World, Flight Simulator, inúmeros simuladores de corrida onde gastei 20 horas para aprender a não bater na primeira volta, então a curva de aprendizado com Infinite Air foi definitivamente menos assustadora do que eu esperava.
Não é o sistema mais intuitivo que já vi e a explicação dada no tutorial é fraca demais para você se lembrar cinco segundos depois. E não é por falta de atenção, o jogo apenas te diz “Se você segurar o botão de tal forma, ele faz tal coisa”, mas não deixa explícito o tempo que se deve fazer isto. Uma dificuldade de transpor informação para o jogador de forma similar com o que acontece em Absolute Drift, não é o sistema em si, é como ele se apresenta.
Quando esta espessa camada de complexidade é perfurada, temos então um dos jogos mais abertos e criativos de snowboard dos últimos anos. Cada jogador pode seguir cursos predefinidos ou “esculpir” a sua própria montanha. A HB Studios segue a mesma filosofia aplicada em The Golf Club — dê uma base, as ferramentas, e o jogador fará a sua própria diversão. Um conceito que não sempre se paga, já que vivemos em uma geração onde a gratificação instantânea é maximizada para fazer o jogador se sentir bem.
Dito isso, as ferramentas providas por Infinite Air não poderiam ser melhores. Ao contrário do ato de jogar em si, navegar, esculpir, remover ou adicionar árvores, half pipes, canos, outros inúmeros desafios são intuitivos. Em questão de minutos você tem uma pista bem produzida que atende à uma determinada necessidade.
Novamente, o problema é que as minhas primeiras pistas foram criadas puramente para eu entender as mecânicas do jogo e não para diversão. Os cursos predeterminados já esperam que você tenha uma boa autonomia nos controles, a curva de aprendizado está toda embaraçada e eu não vejo um caminho para tirar os nós a não ser refazer o sistema de tutorial do zero.
Por conta disso você fica com dois pedaços que querem se unir, mas não podem. Uma hora o jogo me fala “vai se divertir com a sua pista” e eu respondo “mas eu ainda não posso porque eu não sei jogar direito!”. Ele dá de costas e vai embora sem querer assumir a culpa.
Fico então de mãos abanando na tentativa de decifrar o que Infinite Air quer que eu faça com ele. Claro, a quantidade de conteúdo é impressionante, nem mesmo no segundo dia após o lançamento e já tinha uma enormidade de montanhas com mapas e pistas bem desenvolvidas. O problema voltava a ser navegar nas pistas com o mínimo de apreciação por elas.
Entenda que, quando eu gosto de complexidade eu também tenho de pôr na balança o quão alguém vai investir o tempo em aprender as coisas e a resposta é “muito menos do que você, seu doente que imprimiu 400 páginas de um manual de um simulador para aprender a como soltar uma bomba”.
Vamos partir da ideia que a falha é uma ocorrência natural ou oriunda de fatores externos e internos. Infinite Air não é capaz de trata-la como uma ferramenta de aprendizado ou como uma forma de reforçar um conceito mostrado anteriormente. A falha existe como uma pedra que te arrasta para baixo e deixa toda a experiência menos apaziguável. Tentativa e erro atingem o limite da paciência e a HB Studios parece não ter completa noção do que esperar da base de usuários.
As montanhas cheias de neve e a ferramentas de escultura perdem o propósito quando a crosta é tão grossa que eu prevejo uma parcela gigantesca da comunidade ter de se agarrar a guias e outros métodos de ensinamento para progredir. E quando um jogo não consegue prover por si só este processo de ensino, é uma grande falha nos meus olhos.
Por mais que eu tenha gostado, e ainda goste, de Mark McMorris Infinite Air, ele tem um ar (sem trocadilhos) de elitismo e meritocracia desnecessário. “Aqui só vence quem for bom”, é o que ele se apresenta, mas você que se vire para ficar bom. Menos sobre facilitar ou simplificar conceitos, mais uma vez, sobre entrega-los de forma tangível.
Enquanto a HB Studios não entender que nem todo mundo tem a paciência que eu, ou meia dúzia de pessoas tem, as montanhas de Infinite Air ficarão cada vez mais vazias. Um bom jogo, com ótimas mecânicas que são explicadas de uma das piores formas possíveis. Eu encontrei a minha solução para a falta de jogos de Snwoboarding nessa geração. Pena que daqui há alguns meses poucos continuarão a aproveitá-lo.
Mark McMorris Infinite Air
Total
Ótimas ideias executadas da maneira mais convulsa possível. Um tutorial que guia os jogadores sobre os conceitos base e o larga no mundo sem bem ter uma noção de qual propósito devem cumprir. Quem gosta de complexidade e tem espaço de sobra na agenda vai adorar. O resto? É bom esperar sentado.