Parece que já fazem meses — e de fato fazem — que eu escrevo sobre Hitman. Agora com o fim da primeira temporada, a tentativa da IO-Interactive de criar um modelo episódico para o game de Stealth deu certo, em partes. O pacote completo está disponível a partir de R$129,99 no PC, Xbox One e PlayStation 4.
Por um lado, temos um jogo polido com mecânicas sólidas que evoluíram ao longo de seu desenvolvimento. Por outro, parece que a IO-Interactive jogou tudo o que tinha ideia no quesito “desenvolvimento de cenário” para ver o que funcionava.
Estender-me em mais de um parágrafo no que tange a história de Hitman é transcrever a mesma trajetória de insanidade de “Nas Montanhas da Loucura” de H.P. Lovecraft. As tramas funcionam como mecanismo para mover a ambientação do ponto A ao B e não devem ser levadas em conta ou a sério em momento algum. Hitman é mais sobre como aproveitar espaços públicos para se aplicar um minucioso sistema de regras e objetivos do que levantar questões morais.
Para quem não acompanhou a trajetória da temporada e quer apenas aproveitar o pacote final, pode se sentir tremendamente desapontado. Afinal, jogar as seis missões principais — por mais variadas que sejam tematicamente — dão um tremendo ar de “este jogo deveria ter mais conteúdo”. E ele tem! Isto é, tem se você aproveitou os alvos elusivos e as coisas lançadas previamente por tempo limitado.
O ápice da temporada permanece em Sapienza, o segundo episódio da série, com sua recriação de uma cidade litorânea da Itália e inúmeras maneiras de completar os objetivos. Maneiras inteligentes, inusitadas, cuidadosamente planejadas.
Os próximos episódios viravam uma tentativa de criar algo “novo”, mas nunca conseguiam. Tome por exemplo o terceiro episódio, Marrakesh, onde o agente 47 deve se infiltrar em uma embaixada em meio a um protesto onde os ânimos estão um tanto quanto agitados.
Conceitualmente o mapa não deixa a desejar, mas sempre te dá uma estranha sensação de estar desconectado do conflito ali apresentado. Os personagens secundários não reagem tão intensamente as suas ações e o mapa é consideravelmente linear. As rotas se transformam em um alambrado de atividades confusas e extrema necessidade de usar os poderes de “instinto” para prosseguir.
Bangkok parece ser uma versão replicada do primeiro episódio de Paris, o resort luxuoso se supera em apresentação, mas mais uma vez cai nas mesmas armadilhas que Marrakesh. Muito bonito de se ver e nem tão interessante de se jogar.
Mesmo mais denso de personagens e rotas, a sensação de fadiga e de “fazer a mesma coisa” de maneiras ligeiramente diferentes começam a entrar em ação. Os alvos em si podem ser eliminados criativamente, mas tudo que se vê é “ah, mais um hotel em Hitman”. Não veja isso como algo necessariamente negativo, hotéis e locais privados são alguns dos melhores mapas da franquia, apenas que não vai ser Bangkok a provar isto.
Os episódios 5 e 6, Colorado e Hokkaido, são os que colocam à prova a estrutura e sistema implementados pela IO-Interactive. Colorado tira a coleira do jogador e não o dá uma zona de segurança, eleva o nível de dificuldade para quatro alvos e dá a maior área aberta vista até então. Na medida em que a missão progride é onde se vê o maior grau de “experimentação” que tem de ser feito. Não é fácil completa-la, tampouco encontrar rotas “seguras”.
Era este tipo de experiência que eu esperava a partir do segundo episódio, um aumento progressivo na dificuldade de maneiras não lineares. Ser recebido com um mapa linear e um segundo hotel luxuoso foi um pequeno tapa na cara e decepcionante.
Por ironia do destino Hokkaido, também é uma mistura de resort de luxo com um hospital de alta tecnologia. Mas ao contrário dos outros cenários providos, ele também reduz consideravelmente as zonas de segurança. A não ser que ele aprenda a usar as cartas na manga de maneira correta ou explorar, mas explorar muito, vencer vai ser como subir uma ladeira íngreme.
Esta ao menos é a experiência para quem jogar apenas uma vez as missões, pois o brilhantismo de Hitman ainda se esconde em meio aos desafios do mapa criados pelo sistema de “Masteries” e os da comunidade.
São dois elementos que ainda estão “crus” para serem aproveitados propriamente. As masteries, basicamente desafios delimitados pelo uso de certos itens ou eliminações específicas, dão pouco incentivo para olhá-los mais de uma vez.
Os desafios de comunidade, por outro lado, é questão de ser mal exibido e implementado. Uma função que está presente desde o primeiro episódio mas que pouco recebeu atenção da IO-Interactive em fazer com que a criação, publicação e exibição dos mesmos nos menus fossem bem aproveitadas. Muitas vezes sequer lembrava que podia fazer outras missões e eliminar outros alvos. Tendo em vista que até mesmo o terrível Hitman Absolution foi capaz de acertar nisto, vejo poucos motivos para ele ter sido tratado como algo tão secundário quanto os problemas técnicos.
Afinal, não seria um jogo da franquia Hitman sem problemas técnicos, né? Não sou daqueles que se prende tanto a gráficos, taxa de quadros ou faz uma análise técnica profunda. Mas após jogar a versão PC e PlayStation 4 de Hitman, aqueles que optarem por jogar no console terão de enfrentar tempos de loading de mais de dois minutos em certos mapas. Em um game cuja base se estabelece tanto na tentativa e erro, ver pouco avanço nesta área ao longo dos meses é outro sintoma que não queria ter de listar aqui.
Tortuosa o quanto pode parecer esta estrada, a IO-Interactive ao menos conseguiu um triunfo, sair das sombras de Hitman: Absolution e fazer um jogo que chegue o mais próximo possível de Hitman: Blood Money.
Não é perfeito, como qualquer jogo, mas é um passo na direção certa para que a IO-Interactive consiga aplicar mais sistemas experimentais e se solte das amarras que prendem Hitman a nostalgia de Blood Money. Que a segunda temporada venha com mais oportunidades, mais foco nos esforços da comunidade e em dar incentivos para que cada um desenvolva táticas inusitadas nas fases.
Hitman: Primeira temporada
Total - 7.5
7.5
Inconsistência de missões, fraco desempenho nos consoles e pouca ênfase no ótimo trabalho feito pela comunidade arrastam a primeira temporada de Hitman para baixo. Entretanto, quando colocado na balança, ainda é o mais próximo que teremos de Hitman: Blood Money.