É bom preparar o terno, arrumar a gravata, escolher as ferramentas para o trabalho. O famoso agente 47 está de volta em Hitman, mas não exatamente da mesma maneira que o conhecíamos. O jogo está disponível separadamente a partir de R$ 32,50 ou no pacote completo a partir de R$ 129,99 para Xbox One, PlayStation 4 e PC.
Ao contrário dos outros games, Hitman é feito em uma estrutura episódica, com sete episódios programados para lançamento ao longo do ano. O primeiro episódio inclui o prólogo, com duas pequenas missões-tutorial e o cenário de Paris, com a missão Showstopper, onde o jogador tem de eliminar dois membros do alto escalão da moda.
História nunca foi um elemento relativamente importante para mim em Hitman, boa parte dela é contada por cinemáticas entre as missões. Cinemáticas que não são nem um pouco empolgantes. Os coadjuvantes até então servem apenas para criar um pano de fundo de alguma bizarra conspiração, mas que nunca sai do “e aí, o que acontece?”.
Por outro lado, ele foi sempre um dos melhores exemplos de uso do level design para criar uma poderosa caixa de ferramentas para o jogador brincar. Dessa vez não é diferente. Existem inúmeras maneiras de eliminar os alvos, porém alguns deles parecem ser mais “apropriados” ou “condizentes” com a trama do que outros. A minha primeira tentativa na missão foi me vestir como um dos guardas e tentar eliminar Viktor, um dos alvos. Não foi de uma maneira muito ortodoxa, já que o peguei desprevenido, atirei e tentei escapar da cena o quanto antes.
Eu também poderia tê-lo envenenado, causar distrações para separar o alvo do seu guarda costas. Cada peça no cenário é uma oportunidade nova, que pode ou não se encaixar com o seu estilo de jogo. No caso do segundo alvo a mesma coisa, eu poderia roubar o disfarce de um modelo e me aproximar dele ou usar outras distrações para alcançá-lo.
A habilidade Instinto — vista pela primeira vez em Absolution — retorna, mas dessa vez menos potente do que antes. Ela permite que o jogador veja pelas paredes, encontre o alvo e possíveis inimigos. O que deixava antes o jogo completamente desbalanceado agora serve mais como um guia para quem não tem muita experiência do que outra coisa.
Ainda assim, eu sempre me senti um pouco restrito demais na missão principal. O cenário impressiona à primeira vista, mas a partir do momento que você começa a perceber que ele te guia um pouco demais, fica chato.
Por ser o episódio de abertura, eu entendo essa aproximação da Io-Interactive de fazer com que o jogador entenda as mecânicas ao invés de jogá-los aos leões em uma fase extremamente complexa e cheia de sutilezas que podem fazer com que ela falhe. Os desafios ficaram por conta dos contratos, um dos pilares de sustentação para o sucesso, mas também arriscado, para Hitman.
Hitman é um jogo que quer que você jogue como também quer que você o use. Use como uma ferramenta para contar a sua própria história, se desafiar ou desafiar os outros. O modo contratos é justamente isso, você criar uma missão com novos alvos e objetivos.
É nessa área que o aspecto sandbox e as oportunidades ficam mais interessantes. Nada de missão fácil, alguns jogadores já criaram alguns contratos insanos. Falo de ter de manipular a inteligência artificial para que ela se mova para pontos específicos para conseguir avançar, de estudar, de entender como o cenário funciona e como usá-lo a seu favor ainda mais do que na missão principal.
Esse tipo de coisa é o que sempre me fez jogar Hitman, encontrar um problema, entender as variáveis, possíveis soluções e riscos. É brincar com a sorte a cada vez que você atacar um guarda, o deixar desacordado ou mata-lo. Ele quebra o ato do assassinato em planejamento, cautela e execução.
É uma pena que Hitman erra feito em dois aspectos técnicos moderadamente importantes, o tempo de carregamento e a necessidade de uma conexão online. Na versão de PlayStation 4, usada para a análise, o tempo de carregamento às vezes podia chegar a até quatro minutos na missão de Paris.
Tudo bem que os gráficos realmente impressionam, assim como a densidade de personagens em cada cena, mas basta um erro e você tem de aguentar esse carregamento mais uma vez. Cansa, tira o foco, desanima.O mesmo desânimo que vi quando meu jogo voltou para o menu principal no meio de uma missão.
O motivo? A conectividade com os servidores havia sido perdida. No modo off-line, Hitman tem uma estrutura inacabada, quase que esqueletal. É como ter um projeto inacabado e ter de fazer uma conexão constante para ver o resto. Os contratos precisam ser completados conectado a internet, alguns desafios não estão disponíveis, nem mesmo algumas opções de variação para as armas não podem ser utilizadas no modo off-line.
Quando tratamos de um MMO ou um jogo que necessita de uma conectividade online constante, o problema é reduzido. O fato é que Hitman não apresenta basicamente nenhuma desculpa para que esse método seja aplicado a não ser transformar o jogo como um serviço. A estrutura episódica não incomoda, afinal, a quantidade de variações que fiz da mesma missão sem enjoar são incontáveis.
Agora, forçar o jogador a estar conectado em rede sem nenhuma real vantagem, isso sim é incômodo. Por que os contratos não podem simplesmente serem baixados da internet? Por que não se conectar apenas no final da missão?
Após o confuso e estranho Absolution, Hitman é um novo começo para a série. Um começo que ainda está engatinhando, mas que já tem uma base sólida o suficiente para ser comparável aos games clássicos da franquia. Paris é um sandbox gigante que deve e merece ser explorado por quem gosta de resolver problemas ou criar missões. Apenas torça para que a internet não caia no meio da missão.
A análise foi feita com base em uma cópia para PlayStation 4 fornecida pela Square-Enix