Há vários jogos que se se orgulham por oferecer uma “experiência” em que “perder é divertido”. “Rimworld”, “Dwarf Fortress”, “Starsector”, até “Mount & Blade” alcançam este quesito em diferentes graus. “Hearts of Iron IV” – o Grand Strategy da Paradox Interactive – está muito longe deste parâmetro. E, “Graveyard of Empires” (Steam), representa um curioso e precário marco na história do título – que não há mais como a desenvolvedora esconder isso.
Uma das maiores tentativas da desenvolvedora desde que “Hearts of Iron IV” foi lançado em 2016, é torná-lo um jogo em que não só as “grandes potências” da Segunda Guerra Mundial sejam jogáveis. Os primeiros DLCs – agora incorporados ao jogo base – como “Death or Dishonor” e “Together for Victory” atingiram um certo sucesso ao integrar mais eventos e situações históricas ou anistóricas para países menores envolvidos no conflito.
Romênia, um país do Eixo, permaneceu nos anos iniciais do título como um dos meus exemplos de como a Paradox podia integrar mecânicas e histórias e ainda sentir que você fizesse parte do conflito. Crises internas, “guerras civis” constantes, a necessidade de enviar as suas tropas para a Alemanha Nazista. Não era uma partida necessariamente divertia, mas era no mínimo intrigante.
Porém, quanto mais a Paradox se afastou dos países da Europa ou aqueles que, acabaram fazendo parte do conflito ao serem anexados por grandes poderes, mais a carência de mecânicas que os tornassem “interessantes” ou apontasse “caminhos anistóricos viáveis” começou a se tornar presente.
“Trials of Allegiance” se tornou um dos mais “bizarros” experimentos da Paradox. O que era para ser uma celebração de finalmente uma árvore de foco para o Brasil e outros países da América Latina virou um pesadelo. Um lançamento que mais parecia vir de uma empresa que sequer fez o seu dever de casa em entender a composição do exército brasileiro, ou as dificuldades logísticas da América Latina no geral.
Aliado a parcela de bugs, que alternavam entre uma terrível composição inicial – e irreal – dos exércitos até buffs que não eram ativados propriamente. De forma irônica para uns, esperada para outros, “Graveyard of Empires” segue uma tendência relativamente similar.

Embora eu adorei a ideia de “Trials of Allegiance”, o meu interesse pessoal é muito mais próximo dos países que são alterados por “Graveyard of Empires”. Novas Focus Trees para países como o Irã e Iraque, expansões consideráveis para o Raj Britânico e também para o Afeganistão. Era para ser uma daqueles DLCs para fazer muitas pessoas se interessarem em navegar pelas complexidades de países que, não necessariamente fizeram parte da Segunda guerra Mundial, mas que foram impactados de uma forma ou outra.
Mas, como disse antes, “Hearts of Iron IV” não necessariamente oferece um loop interessante para essa ideia. No caso de “Graveyard of Empires”, muito disso cai nas costas das novas Focus Trees.
Todo DLC de “Hearts of Iron IV” promete uma coisa: mais escolhas impactantes. A maioria deles consegue isso, e “Graveyard of Empires” não é diferente. Transformar o Irã de um país pressionado pelas forças do Reino Unido ou da União soviética em uma potência da região é uma partida interessantíssima.
É como pegar um dos “piores” países do jogo e tentar subir uma ladeira imensa, repleta de dificuldades e tensões com os grandes poderes. “Em que parte do meu país eu devo focar? Devo expandir a minha infraestrutura? Aumentar a estabilidade dele? Tentar proteger a minha frota marítima ou apostar quase que puramente em infantaria?”. São tantas as perguntas que me fiz na hora de decidir qual a próxima ambição seguir que eu me senti dentro do meu próprio microcosmo.
Navegava as turbulências dos anos que antecedem a Segunda Guerra Mundial até o avanço da Alemanha Nazista na Polônia, consegui estabelecer um país competente e começar o meu projeto de integrar nações como o Afeganistão. Foi dureza, mas no final dela, eu quase consegui.

Agora você me pergunta: “E o resto da Segunda Guerra?” .Bem, assim que eu segui o caminho de quase neutralidade, eu não fui “arrastado” para o conflito geral até 1944. Algo igualmente bom e péssimo para “Hearts of Iron IV”.
Não há como negar que o prato principal de “Hearts of Iron IV” é, inevitavelmente, o conflito em si. Todas as grandes mecânicas das expansões são voltadas em torná-lo mais complexo. Um sistema de logística mais robusto, espionagem, mercado internacional de armamentos, ataques a locais importantes do mapa. Pouquíssimos deles são de fato utilizados por grande parte dos países de “Graveyard of Empires”.
Claro, você pode aproveitar a nova Focus Tree do Raj Britânico, buscar independência, se aliar com o eixo ou quem você quiser e é o mais “longe” que você vai chegar no que diz respeito a interagir com essas mecânicas. Irã, Iraque e Afeganistão? Em raríssimas ocasiões.
O que é interessante não necessariamente é “divertido”. As novas Focus Trees se integrariam muito melhor em um jogo que houvesse “algo” para fazer além de pintar o mapa. A Paradox nunca trabalhou à fundo um sistema de eventos robusto como o de “Stellaris” e também não almejou tratar as diferenças regionais e populacionais em “Hearts of Iron IV”. Aliás, se tentasse, teria que refazer o jogo do zero, e depois de quase uma década, isso jamais vai acontecer.
Acaba que toda decisão vira interessante de seu microcosmo e se perde no seu contexto geral. Reformar o exército ou buscar mudar o governo não tem o mesmo impacto quando você está relativamente distante do que torna “Hearts of Iron IV” o jogo que é – a guerra.

A solução mais “fácil” seria reduzir a quantidade de nódulos redundantes nas Focus Trees ou criar nódulos que provêm múltiplas soluções de uma vez só. Céus, até um conjunto de eventos para que você não passe metade da partida tentando resolver os problemas do país é capaz de mudar o conceito de “interessante” para algo “ligeiramente divertido” para a comunidade no geral.
Mas nenhuma das opções acima é algo que Paradox não gosta de fazer. A culpa? Ela às vezes está nos olhos de quem compra um DLC desses, aparenta ter menos “conteúdo”. Não importa se o conteúdo presente é de fato bom ou não.
O microcosmo que eu descrevi antes só existe por breves períodos. Ainda há um conflito ocorrendo no resto do mundo e os países de “Graveyard of Empires” não estão nele. É como tentar jogar “PONG” dentro de um jogo de estratégia e esperar que a mecânica de ambos fale entre si. Se bem que, acredito ser mais fácil isso se tornar realidade do que o almejado pelo DLC.
A facada final são os bugs. Esses, que eventualmente – mais uma vez – vão ser corrigidos com o tempo. A Paradox já descreveu um plano de ação para os próximos meses que visa solucionar questões como: conquistas que não desbloqueiam, debuffs não aplicados ou aplicados em dobro, unidades que não aparecem no mapa. A primeira grande atualização deste plano já está no ar.
Mas não muda o fato de que entramos em um novo modus operandi doloroso para “Hearts of Iron IV”. Um DLC competente no ano, um pacote de países que ou destrói o balanceamento, ou que vem recheado de bugs. Não chega aos pés do que aconteceu em “Trials of Allegiance”, mas dado o histórico da Paradox, era para ser uma lição mais do que aprendida.

Quando “Trials of Allegiance” foi lançado, eu comentei que “Hearts of Iron IV” entrou em um modo de “manutenção”. Um que, surpreendentemente foi interrompido pelo competente “Götterdämmerung”. Agora voltamos para o ciclo.
Debaixo das camadas e camadas de problemas, há DLC para países que tem chance de brilhar, de ser interessante, de tornar a frase “perder é divertido” algo real em “Hearts of Iron IV”. Mas para que isso aconteça, a desenvolvedora precisa ter, no mínimo, o mesmo empenho de sacudir o jogo como faz com “Stellaris” ou ser muito mais proativa em evitar que lançamentos como esses ocorram.
Eu não quero reduzir aqui os esforços da equipe que trabalhou no DLC. Eu ainda acho as Focus Trees competentes dentro das limitações que o jogo já tem. Mas a ausência de algo que as sustente para além de “vou melhorar o meu país e não pintar o mapa” as prejudica imensamente.
Pode ser que “Graveyard of Empires” acabe sendo um bom pacote de países no futuro, um que a Paradox tome vergonha na cara e comece a levar mais a sério os seus projetos que não envolvam teasers do seu próximo Grand Strategy ou usar atalhos para publicar antes do final de um trimestre.
Eu não vejo esta empresa existir tão cedo. Aliás, eu não vejo mais a empresa que eu tanto gostei na última década existir mais. Apenas uma que lentamente sucumbe a ganância e o ganho material a curto prazo.
Se for para continuar a lançar DLCs como “Graveyard of Empires” no estado que estão e – por mais que haja potencial para eles brilharem no futuro – é melhor que não lance. Não quero ver “Hearts of Iron IV” destruído. O único cemitério que a desenvolvedora está criando é o dos seus jogos; e a sua própria cova.
Hearts of Iron IV: Graveyard of Empires
Total - 6.5
6.5
O conceito de transformar países como Iraque e Afeganistão em pequenas potências é interessante. Mas “Graveyard of Empires” entra em um grande conflito com os principais pilares de “Hearts of Iron IV” – focados na Segunda Guerra Mundial. Por mais que seja conceitualmente intrigante ter o seu próprio “microcosmo” dentro do período de 1936 a 1945, ele não consegue se sustentar. Junte com uma boa dose de bugs e, mais uma vez, temos um DLC que podia ter sido muito, mas muito mais.