Eu não sei o porquê de eu ainda ficar surpreso quando um jogo do qual eu não esperava nada acaba se tornando o meu “favorito” de um mês específico. Aposto as minhas fichas em um lançamento e, quando chega a data, lá estou eu jogando algo completamente diferente. Me imaginei gastando horas em “Yakuza: Infinite Wealth” ou “Tekken 8”, mas esse tempo foi redirecionado para “Granblue Fantasy: Relink” (Steam / PlayStation 4 e 5). Isso vem de alguém que tem pouco conhecimento da franquia em si.
Embora eu já tivesse ouvido falar de “Granblue Fantasy: Relink”, eu não tinha muita esperança de algo excepcional. Sete anos em desenvolvimento, várias equipes – incluindo a Platinum Games, que deu o pontapé inicial e depois passou para a CyGames. Nada disso inspira confiança. “Mais uma bomba no meu colo”, disse poucos minutos antes de começar. Estava comendo todas as minhas palavras após largar o jogo sete horas depois – é só larguei por pura exaustão.
Essa não é a primeira vez que a CyGames tenta expandir o universo Granblue – “Granblue Fantasy Versus”, e “Granblue: Fantasy Versus Rising” são ótimos exemplos de como criar um jogo de luta acessível – mas é com “Relink” que a desenvolvedora criou uma história que me deu vontade de conhecer mais sobre os personagens. E, ao menos no que tange à equipe inicial do jogo (mais sobre isso em breve), “Relink” faz um trabalho formidável.
Seja começando como Gran ou Djeeta, “Relink” estabelece já nos primeiros minutos a sua conexão com Lyria, e como a personagem é capaz de “domar” seres “primais” que compõem o universo Granblue. Nada melhor para exemplificar isso do que um desses seres atacando a sua aeronave e forçando você e sua equipe a aterrissar em território desconhecido.
O parágrafo acima é um ótimo exemplo do que esperar da trama de “Granblue Fantasy: Relink”. Ela não vai ganhar nenhum prêmio e a maioria dos capítulos se desenrola da seguinte forma: o jogador descobre uma nova ameaça, viaja até a região, é atacado e tem que fazer um pouso forçado e seguir a pé. Nesse meio tempo o jogo aproveita para explorar a conexão entre as personagens e como elas enxergam a situação em que estão.
Se fosse outro tipo de jogo, eu teria a minha parcela de críticas acerca desse formato. Mas, o que importa em “Relink” é a sua jogabilidade, e a forma que a trama se expande para acomodar e apresentar novas mecânicas é ótima. Além do que, eu confesso que cada capítulo da história terminava com aquele gostinho de “Tá bom, mas o que acontece agora?”. Sempre aquela “reviravolta” que você sente chegando, mas ainda te pega de jeito e fala para você: “Vem cá, senta aqui, vamos ver o que acontece a seguir!”. Não é à toa que eu investi sete horas na minha primeira sessão. Digo, se não tivesse sido pela história, certamente seria pelo combate.
Um dos pontos que mais me impressiona em “Granblue Fantasy: Relink” é a fluidez e complexidade do seu combate. Eu sabia que a Platinum Games tinha trabalhado no jogo, mas depois de tanto tempo, presumi que muito do que ela fez tivesse sido descartado. Embora não tenha como provar que parte é a Platinum e que parte é a CyGames, a influência que a desenvolvedora deixou no projeto é notável – especialmente no que tange a chefões e habilidades.
De início eu até tentei colocar cada personagem em um “arquétipo”, mas a realidade é que “Granblue Fantasy: Relink” os define muito bem como… personagens. Ou seja, eles podem ter uma função relativamente específica no campo de batalha, mas ao mesmo tempo, ter um estilo próprio de ativar habilidades, de tirar proveito das fraquezas dos seus oponentes ou de curar a equipe. Com mais de 15 personagens jogáveis – ainda que você jogue boa parte da campanha como Gran ou Djeeta – a variedade é assustadora.
Eu tive a minha primeira prova disso ao desbloquear Narmaya. A espadachim é uma das minhas personagens favoritas em “Granblue Fantasy Versus: Rising”, e muito do estilo de luta dela foi mantido em “Relink”. Ela é capaz de mudar o alcance dos golpes no apertar de um botão, seus combos podem priorizar um inimigo ou atacar em área e, para finalizar, ela tem uma mobilidade invejável.
“Pera, quer dizer então que vai ser assim para todo personagem? Eu vou ter que ‘aprender a jogar’ com eles?”. Reclinei na cadeira e ponderei o buraco em que eu tinha me enfiado. Me conhecendo, eu sabia que não ficaria satisfeito em me focar só em um personagem. Três, no mínimo, seria o meu objetivo. Se você está se perguntando “Mas onde esses personagens são usados”? No principal atrativo de “Granblue Fantasy: Relink”: as quests.
Terminar a campanha de “Relink” é como só ter comido as bordas de uma torta. A história está ali para dar gosto e mostrar o que é possível. Sua habilidade só vai de fato ser testada a partir do momento que você explorar o sistema de quests do jogo.
A CyGames aposta em dois pilares para tornar cada quest cativante: trabalho em equipe e eficiência. Se você já jogou “Monster Hunter”, “Relink” é o completo inverso. Nada de batalhas que duram mais de 30 minutos; aqui você tira o melhor rank se completar no menor tempo possível. A última vez que eu vi um jogo usar esse sistema foi em “God Eater 3”, e fico feliz que outra desenvolvedora tenha pegado algumas lições dele.
Poucas coisas me deixam tão contentes quanto um jogo colocar um chefão na minha frente e falar: “Ok, você tem dois minutos para derrotá-lo caso queira o rank ‘S’”. É o tipo de desafio que me faz me ajeitar na cadeira, pensar sobre o meu equipamento, a composição da minha equipe, como e quando atacar para causar o máximo de dano.
É aí que a coordenação de “sincronizar” ataques e usar habilidades especiais – chamadas de “Bursts” – na hora correta entra a todo vapor. As quests iniciais não requerem tanta coordenação, mas à medida que você progride para dificuldades mais altas, saber o padrão de ataque de um inimigo é mais do que essencial. Mas, por outro lado, mostra um dos maiores defeitos de “Granblue Fantasy: Relink”: a câmera.
Se eu gastei horas para atingir o rank S em uma quest específica, parte do motivo foi por conta da câmera inconsistente do jogo. A CyGames não hesita em transformar até a habilidade mais simples em um show de explosões e partículas, e por consequência, usar o sistema de “travar a mira” da câmera em uma parte do inimigo é frustrante.
Houve situações em que eu tentava acertar o ponto fraco de um chefão só para ter a minha tela bloqueada por efeitos, e quando eu tentava trocar para outra área, o jogo não “respondia” ao meu comando. Pode ser que o problema esteja nas minhas configurações de câmera – que ironicamente são os padrões que vem com o jogo – e uns ajustes aqui e acolá façam esse problema ir embora. Mas, quantas pessoas vão se dar ao trabalho de irem no menu de opções para verificar isso? Posicionar a câmera em um jogo que requer que você elimine um chefão no menor tempo possível é a última preocupação que eu quero ter na minha cabeça.
Dito isso, essa é a minha maior crítica do jogo. Até mesmo a IA – outro ponto que eu esperava me decepcionar – consegue ser surpreendentemente competente. Ela pode não priorizar o inimigo que você quer, mas ela dá buffs e debuffs na hora certa e algumas vezes até sincroniza o ataque junto com você. Infelizmente não há um sistema para definir condições e micro gerenciar quais tipos de ataque devem ser acionados como em “Final Fantasy XII” ou “Pillars of Eternity 2”, mas isso seria pedir demais de um jogo desse escopo. Se você quer completar as quests mais difíceis, pegue ao menos dois amigos e jogue em modo coop.
E, quem diria, um jogo que lançou com um modo online funcional! Ao menos na versão PlayStation 5, usada para essa crítica, eu não tive o menor problema em me conectar ou encontrar grupos via matchmaking. Para complementar, o vasto sistema de gestos e frases pré-definidas é mais do que o suficiente para coordenar batalhas e até mesmo quais quests o grupo quer fazer. Como alguém que evita ao máximo usar o microfone em grupos públicos, “Relink” atende a todas as minhas necessidades.
Pulava de grupo em grupo, completava quests e cada vez mais ficava fascinado com “Granblue Fantasy: Relink”. Mesmo com os problemas que citei da câmera, o jogo consegue transformar até a menor das batalhas em algo épico. Os efeitos trazem um “peso” para cada golpe que você dá nos inimigos, a espada rápida de Narmaya cria um gigantesco contraste quando colocada lado a lado com a tremenda força de Percival ou os punhos de aço de Ghandagoza. É impossível não parabenizar a CyGames por ter refinado a jogabilidade ao ponto de ser extremamente responsiva em questão de ataques e com tantos personagens distintos.
Agora que atingi a marca de 35 horas, e não me vejo parando tão cedo, noto o quanto “Granblue Fantasy: Relink” é uma anormalidade no atual cenário de jogos. Ele tem todas as peças para se transformar em mais um “Game as a Service” como foi “Babylon’s Fall” – outro projeto que teve as mãos da Platinum Games e eu nunca vou aceitar que ele foi fechado sem um modo offline. A CyGames podia ter apostado pesado na monetização dos personagens, mas não, todos podem ser desbloqueados ao longo da campanha.
Mas, ele não é um “Game as a Service”. É um tremendo jogo que traz uma história competente e um ótimo sistema de quests que só brilha ainda mais graças a sua excelente jogabilidade e diferentes estilos de combate. Se os 7 anos de desenvolvimento tiveram altos e baixos, os baixos sequer aparecem na versão final.
Sei que ainda é muito cedo para falar sobre “melhores do ano”, mas “Granblue Fantasy: Relink” ao menos já ganhou um local na minha lista de “surpresas de 2024”. Se essa for a menor das surpresas, sinto que teremos mais um ano excelente. Isso é, se eu conseguir me focar em algo mais além de “Relink” pelos próximos meses. “Rank S” em todas as quests? Quem sabe um dia!
Granblue Fantasy: Relink
Total - 9
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Total
O maior problema de “Granblue Fantasy: Relink” é a sua câmera que nem sempre é precisa. Para mim é uma gota d’água em um oceano que é um jogo recheado de personagens distintos, quests que requerem extrema coordenação e uma história competente amarrando tudo. Como alguém que tem pouco investimento em “Granblue”, “Relink” é um deleite em termos visuais e em jogabilidade. Já estou na marca das 35h e espero gastar muito mais nele.