Antes mesmo de eu começar o tutorial de Empire of Sin (Steam, Xbox One, PlayStation 4, Nintendo Switch), o jogo me pediu para eu “personalizar a minha partida” com “Quantos bairros, quantas facções inimigas e qual o grau de dificuldade você quer?”. Se eu já tivesse o conhecimento que obtive ao completar várias partidas, eu teria escolhido o menor número de regiões, a maior quantidade de facções inimigas, e colocado a dificuldade lá no topo. É a melhor maneira de jogar Empire of Sin? Não, mas é a maneira que o faz funcionar.
Empire of Sin me lembra bastante o processo de acompanhar o desenvolvimento de Frozen Synapse 2. O título da Mode 7 Games — que vinha com a promessa de abalar o mundo com a sua dinâmica de combate bem distinta de turnos simultâneos e uma cidade viva — é bem próxima do que a Romero Games almeja com o seu projeto. Infelizmente, ambos falham em várias frentes, mas não deixam de ser cativantes.
Minhas expectativas para Empire of Sin eram que a Romero Games pegasse a camada de gerenciamento de Gangsters (2001) e adicionasse um tanto da personalidade vista em Jagged Alliance 2 (1999). Aliás, Jagged Alliance 2 é um dos jogos em que Brenda Romero – a designer de Empire of Sin – trabalhou no passado; então, as expectativas estavam nas alturas. Parte dessa implementação acontece em ambas as camadas, mas falta algo muito importante entre elas: o diálogo.
Empire of Sin não é um jogo complexo em si; eu diria que, dentro do escopo dos jogos de estratégia que costumo cobrir, é um dos mais simples. Você assume o papel de um gângster em uma Chicago dos Anos 20 e tem de aumentar a sua fama, fazer “amizade” com outros gangsters, fechar negócios e, quando tudo der errado, eliminar a competição.
Embora haja dezenas de opções para os estilos de gangsters — todos muito caricatos e estereotipados como é de se esperar — o grosso do que acontece no dia a dia chega a ser irrisório de tão semelhante. Você pode começar uma partida com “A” e a maior diferença de “B” vai ser a forma pela qual você vai se apropriar das regiões. Entretanto, o problema em si não é essa semelhança, mas o tempo que demora para que estas semelhanças comecem a aparecer.
Empire of Sin é muito bom em te dar a ilusão de que você está no “controle” ou fazendo algo “totalmente inédito” durante as primeiras horas de cada partida. Não vou dizer que isto é necessariamente mentira, já que a “quest principal” de cada gangster-chefe é única. Mas, depois que você a completa — o que por acaso não demora muito tempo, pois ela serve mais como mais uma camada de tutorial do que outra coisa — você tem poucas opções para o que fazer.
O sistema de gerenciamento, por exemplo, é muito atraente de se ver — em tese. Diferentes regiões do mapa têm demandas específicas para o tipo de bebida que consomem, a qualidade das acomodações e até a ambientação do restaurante ou bar que você controla. Na prática este resultado só é notável quando a partida está na sétima ou oitava hora. Até lá? Bem, boa sorte fazendo o mesmo ciclo de ações que envolve atacar áreas tomadas por capangas sem afiliação com nenhuma gangue, tratar de acordos diplomáticos com outras gangues e – se você tiver muita sorte – entrar em um confronto armado com elas. Não é só um sistema entediante de utilizar, é um sistema que não consegue entender quais são as necessidades exatas de Empire of Sin, e os problemas só aumentam na medida em que você aumenta o tamanho da partida.
Para minha primeira partida eu selecionei a maior quantidade de distritos (10) e um número um pouco maior de facções inimigas (12). Por motivos que ainda desconheço eu comecei sozinho no meu distrito. Teria sido um bug? Eu não sei bem ao certo. O que eu sei é que não demorei muito para tomar os principais locais da região, transformá-los em destilarias, bordéis, bares e restaurantes. O fluxo de caixa pulou do negativo para o positivo em um piscar de olhos. Eu já estava mais do que pronto para contratar mais capangas, aumentar a proteção e a atratividade dos meus estabelecimentos. Mas é claro que cedo ou tarde isso iria começar a incomodar outros.
Isto veio quando eu decidi expandir os meus negócios para outras vizinhanças. Quase que imediatamente fui parado por Goldie Garneaut da gangue Fortune Tellers. Como eu não queria um confronto direto – ao menos não naquele momento – eu decidi realizar um “sitdown”, que não é nada mais do que uma conversa entre dois líderes de facções.
O contrato que ela me ofereceu era tentador; meus bordéis custariam menos enquanto eu repassava parte da minha renda dos cassinos para ela. Só que havia um problema nesta história toda: eu já era o rei do pedaço, eu tinha mais capangas, mais proteção, mais dinheiro do que ela. Era ela que devia pagar proteção para mim e não pedir para entrar em algum acordo. E assim o fiz, mandei ela se danar e comecei a atacar os estabelecimentos dela e tomá-los para mim.
Foi neste exato momento em que Empire of Sin pareceu dar algum sinal de vida. As batalhas começaram a ficar mais variadas; eu não só atacava prédios aleatórios para expandir meu império, eu tinha que planejar como atacar os meus oponentes. Tomar um bordel equivale a uma boa dose de planejamento, escolher a equipe certa e o equipamento certo. Afinal, eu poderia acabar entrando em dois confrontos – um na parte externa do edifício e outro na parte interna.
Antes mesmo de chegar na área eu fui pego em uma emboscada armada por Goldie Garneaut, que pelo azar do destino calhou de acontecer ao lado de uma patrulha da polícia. As monótonas batalhas táticas tiveram sua intensidade aumentada em 100%. Era a minha gangue, os capangas de Goldie e uma patrulha da polícia, tiro e fogo cruzado para tudo quanto é lado. Dois policiais foram mortos e apesar de eu ter vencido, agora a polícia estava na minha cola por atividades ilícitas. Mas, pera aí… não é para a polícia estar na minha cola desde o começo?
Pois é, esta é mais uma das dezenas de perguntas que tenho sobre Empire of Sin. Eu tomei conta de um bairro inteiro, produzia bebida ao ponto de botar litrão na mesa do bar se necessário, mas eu tive que matar alguém na luz do dia para a polícia começar a bisbilhotar meus empreendimentos? Nesta altura isto nem chegava a incomodar. O cofrinho estava tão cheio que policiais corruptos que faziam vista grossa para as minhas atividades recebiam o seu pagamento em dia. Enquanto isso meus estabelecimentos só aumentavam de escopo.
E, depois de tomar conta de todas as atividades de Goldie Garneaut até mesmo o maldito sistema de gerenciamento – que apontei o quão raso era – chegou a melhorar. Agora eu precisava prestar atenção redobrada com o tipo de clientela que visitava os meus estabelecimentos. O resto do dinheiro, como de costume, ia para melhorar minha gangue com itens comprado do mercado negro, para garantir que nenhuma facção inimiga tivesse a ousadia de me atacar.
Porém, nesta altura do campeonato eu – seja pelo destino ou não – já estava no topo da cadeia alimentar dos gangsters. Eu era o rei de Chicago, rico e intocável. Foi aí que Empire of Sin caiu em descompasso mais uma vez, um descompasso ainda pior do que o visto no começo. Agora o jogo era sobre segurar as minhas localidades.
Por que demorou tanto tempo para a IA notar que alguém estava abocanhando cada pedaço de Chicago eu não sei, mas a partir do momento que notaram, os ataques foram constantes. Empire of Sin, mais uma vez, mostrou-se incapaz de lidar com esse tipo de situação. Os alvos eram aleatórios e na maioria do tempo eu era jogado em um mapa tático semelhante a outro que eu batalhei minutos atrás e usar as mesmas táticas. A cereja no topo do bolo? Não há como auto solucionar esses combates.
Da minha campanha principal, que deve ter durado por volta de 14 horas, só duas ou três delas foram um real indicador do que Empire of Sin almeja ser. O resto foi um mar de tédio imensurável. Não é à toa que quando eu decidi recomeçar o jogo com um número menor de vizinhanças e uma maior quantidade de gangsters e em uma dificuldade mais alta, muito contra a vontade mas sabendo da necessidade, que o jogo começou a fazer sentido.
Empire of Sin está no seu melhor quando todos os sistemas — gerenciamento, conflito entre gangues, polícia, conflitos internos entre os próprios gangsters e o constante gerenciamento de dinheiro em caixa — estão em jogo. Isto só ocorre em um ritmo proveitoso quando as partidas estão configuradas para a intensidade máxima. O que não tem como descrever a não ser como um absurdo.
Imagine você pegar algo como XCOM e falar “ok, esse jogo funciona, mas o sistema de pesquisa e gerenciamento só é útil se você jogar na dificuldade mais alta e pular o tutorial”. Alguém iria gostar disso? Bom, salvo a meia dúzia de leitores masoquistas — e eu sei que vocês estão por aí jogando suas campanhas de Long War ou Battle Brothers — a maioria dos jogadores vai falar “obrigado, mas não”.
O que faz a ferida que Empire of Sin deixou em mim ser mais profunda ainda é que, quando olho para os conceitos propostos por ele de forma isolada – seja o gerenciamento do império, a relação com as facções ou o combate tático, eu respondo: “Olha, isto soa muitíssimo interessante!”. Mas a lenta implementação deles ao longo de cada partida nota o que eu já apontei desde o começo, a falta de diálogo, de interligação entre os sistemas. Ele funciona quando tudo está em perfeita harmonia; e essa tal harmonia pode nem aparecer durante a sua partida.
Como falei no começo do texto, Empire of Sin continua a ser cativante para mim, mas pela promessa que ele traz, e não pelo resultado que ele atinge. Ele, muito como Frozen Synapse 2, está dentro de um imenso caldeirão de possibilidades que pode muito bem borbulhar e criar algo fantástico se a Romero Games – ao contrário da Mode 7, que deixou de atualizar Frozen Synapse 2 por uma série de decisões internas – continuar a trabalhar nele. Com duas expansões a caminho, digo que isto é mais do que provável que aconteça.
Todavia, o caldeirão de ideias está tombado e todos os ingredientes estão espalhados pelo chão. Vou tomar o meu tempo, torcer para que a desenvolvedora os coloque de volta no seu devido lugar e faça uma sopa deliciosa. Até lá, vou voltar para o meu infalível Jagged Alliance 2.
Empire of Sin
Total - 5.5
5.5
Os conceitos oferecidos por Empire of Sin são cativantes, mas não passam de uma grande base teórica no momento. A não ser que você seja um dos poucos sortudos e que todas as mecânicas — sejam elas da camada estratégica ou tática — colidam na hora certa para criar uma perfeita harmonia, a única coisa que terá em mãos é um jogo decepcionante. Há grandes chances da Romero Games virar este barco, mas só o tempo irá dizer se isso vai se tornar uma realidade.