Quando rejoguei Dead Rising Remastered em meados de setembro, vi um jogo com ideias boas, mas pouco polido. Dez anos depois do lançamento do original, Dead Rising 4 vem para trazer justamente o oposto. Ele está disponível para Xbox One e Windows 10 (a ser lançado posteriormente no Steam) a partir de R$199,90.
Não é de hoje que sou um convertido defensor do sistema de Timer de Dead Rising. Ele dava ao jogador a necessidade de escolhas. Salvar um novo sobrevivente ou iniciar um segundo caso? Fazia com que as decisões tivessem mais peso. O quarto game da série o remove completamente; entretanto, este é o menor dos problemas.
Dead Rising ainda teria alguma forma funcional se removido o timer e adicionado alguma maneira de escolha ou desafio no lugar. Remova-o do tema central, coloque-o em missões separadas ou imponha limites ao que o jogador pode fazer. Mas, não, vamos fazer justamente o contrário.
O jogo já começa na tentativa de trazer os fãs antigos da franquia para… algo. Frank West está de volta (de certa forma), Willamette é o palco central dos acontecimentos. Eba, nostalgia, certo? Não é bem assim….
Eu quero acreditar que todos os acontecimentos de Dead Rising 4 ocorreram em um universo paralelo onde Frank encheu a cara de cachaça uma bela sexta-feira após o trabalho e sonhou com isto tudo. O personagem não parece com nada do que ele é nos games anteriores, do físico — o que não é dos piores — ao estilo. Frank é o típico cara do grupo de amigos que tenta fazer aquelas piadas ruins que não funcionam. Nem mesmo é um humor proposital como em Shadow Warrior 2, é literalmente ruim.
Tudo parece forçado, até mesmo a tentativa de fazer o jogador se importar em algum momento com a história. “Meu deus, uma das alunas de Frank West foi investigar Willamette e agora Frank é chamado por um oficial do governo para ajudar a desmascarar outro órgão do governo de uma possível experimentação zumbi!”, ah, me poupe né? Cinco minutos após o prólogo eu já não tinha o menor interesse na trama, o jogo não te motiva a ter.
Os únicos momentos que ele tenta desastrosamente avança-la é por meio de cutscenes e o tão “aclamado” modo detetive usado em meia dúzia de jogos e já desgastado. A real utilidade para o retorno da câmera de Frank são nestas cenas, que basicamente “tiram” o controle do jogador e gritam “hora da história!”, enquanto ele procura em um cubículo por pistas de alguma coisa.
Antes a câmera de Frank tinha um propósito, dar pontos de PP (o equivalente a experiência em Dead Rising). Era uma ferramenta que dava suporte caso o jogador perdesse um caso ou falhasse em uma missão com tempo. Passava a ideia de que nem tudo estava perdido, você ainda pode andar pelo shopping, tirar fotos, eliminar os inimigos e ganhar experiência para que na próxima partida, volte mais preparado.
Agora em Dead Rising 4, basicamente tudo o que você faz dá experiência. Pegou um suco? Tirou uma foto? Chutou um zumbi? Experiência. Desligou o jogo? Experiência. Acho que se eu levantar da cadeira agora eu vou ganhar experiência por alguma coisa da próxima vez que Dead Rising 4 for iniciado.
O que era desafiante vira mundano. Não há motivos para você se arriscar, pois o risco não existe mais. Dead Rising 4 coloca tanto reforço positivo na mão do jogador que em poucas horas você fica com a sensação de que já viu tudo que ele tem a oferecer.
Nos primeiros vinte minutos, por exemplo, você já tem um bizarro combo de besta com fogos de artifício. Ok, confesso que é engraçadinho nos primeiros cinco disparos, depois você já ganha tanta experiência ao usá-lo que quando menos percebe, já está no nível cinco.
Então temos a segunda camada de reforços positivos, a árvore de habilidades, ou a maneira do jogo te falar “fique ainda mais forte!”. Literalmente você pode recuperar energia fora do combate, ganhar ainda mais pontos, ter a durabilidade das armas — que são praticamente inquebráveis desde o início — aumentadas e a lista só piora.
Parabéns, você é Frank West, o tanque humano, o ser mais poderoso da face da terra, nada pode te impedir. Nem mesmo os inimigos considerados chefões são páreo para tamanho poder. Chega a ser ridículo o quão fácil é Dead Rising 4. Em pontos eu pensava que jogava um Musou. Ao menos os Musou tem um grau de dificuldade a ser escolhido e um sistema de combos competente.
Com isto, toda a ideia de liberdade cai pelo chão. Qual é o motivo de eu procurar um equipamento melhor se o que eu tenho dá conta do trabalho? Combinar materiais para armas potentes tinha o propósito de fazer com que o jogador explorasse e ficasse ao menos no mesmo nível que um oponente. Aqui, você só faz pelo prazer de… destruir zumbis, eu acho? É violência gratuita a troco de nada.
E Dead Rising 4 é facilmente um dos mais violentos da franquia, com sangue que espirra pelas paredes, combos que exageram no foco a Frank cortando um zumbi ao meio com uma serra elétrica. Minha dificuldade em engolir é usar a violência como resultado e não como mecânica.
Um combo ultraviolento te dará marginalmente mais pontos do que um golpe normal e o retorno é puramente gráfico. Compare com as Glory Kills de Doom ou as execuções de Warhammer 40K: Space Marine, em ambos os casos a violência serve de um propósito na jogabilidade: Recuperar pontos de vida / armadura / munição.
Qualquer impacto visual se esvai ao ver a mesma animação repetidamente. “A troco de que? ” Eu me pergunto. Enfrentar barreiras de “dificuldade” vira um exercício de apertar o mesmo botão várias vezes até cansar.
Nem mesmo a navegação pelo mapa escapa de problemas resultantes da base falha. Não há desafio, portanto, andar pelo shopping e a cidade de Williamette é simples. Ele não consegue cativar o jogador para procurar rotas, para melhorar a si mesmo pois tudo o é dado de mão beijada.
O que fica ainda mais estranho quando se leva em conta que a série tinha um esqueleto que incentivava a busca por rotas mais eficientes. E mesmo que o timer fosse removido, ainda há mecânicas que podem ser colocadas no lugar para causar este impacto. Um ótimo exemplo é o do recente Dying Light, que subverte o conceito justamente ao fazer o topo dos prédios pela manhã serem os pontos mais seguros e o expande durante a noite com a inclusão de zumbis fortes e capazes de escalar edifícios.
Tanto o timer como o conceito aplicado por Dying Light convergem para um mesmo princípio: Fazer com que o jogador tome decisões táticas em um pequeno espaço de tempo e se sinta parte daquele ambiente. Aqui eu tenho o mesmo “passe livre” de jogar um Grand Theft Auto com invencibilidade. Ou seja, é só desligar a cabeça que está tudo bem.
Quando jogado em sessões de trinta minutos, Dead Rising 4 até que não é algo tão ruim quanto parece. Mais do que isso e eu já tinha vontade de largar e partir para outro jogo. O reforço positivo é tão forte, você se sente tão “especial” que a sua presença acaba por virar insignificante.
Para que eu vou me importar com a história, em coletar evidências ou buscar materiais? Dead Rising 4 é uma caixa cheia de coisas que não tem significância. Ele é tão variado quanto vazio. Um manual básico para homogeneizar uma franquia para que ela se adeque a todas as “demandas” do mercado. Péssimo como um Dead Rising, insignificante como um jogo de zumbis.
Dead Rising 4
Total - 5
5
Nem mesmo o apelo à “nostalgia” faz com que Dead Rising 4 se salve. Um dos melhores exemplos de mecânicas sem propósito. Falta desafio, significância às ações do jogador, um elemento que faça ele se importar com o que está a sua frente. Presentes para preencher um ambiente digital cujo contexto ainda está para ser revelado.