Já estamos em outubro, você já teve a sua quantidade de gore saciada pelo resto do ano? Pois se não, Butcher é uma boa solução para isto. O game da TransHuman Design (King Arthur’s Gold) está disponível no Steam por R$19,99.
Na primeira vez que eu conversei com o desenvolvedor sobre Butcher, ele me desejou para que eu tivesse muita paciência. Dei uma breve risada e pensei “não é possível que esse jogo seja tão difícil”. Bom, depois de ter ficado empacado no segundo estágio do segundo capítulo por exatos cinco dias, eu entendo a necessidade de paciência. A dificuldade, no entanto, nem sempre vem dos desafios que ele me entrega.
A maneira mais fácil de “vender” o jogo é chama-lo de uma mistura de Quake com Doom, mas eu não quero que fique apenas nisso. Há uma grande referência ao estilo dos dois clássicos da iD Software, mas Butcher toma a sua própria forma.
O mais próximo que eu posso defini-lo é como um Hotline Miami de uma perspectiva horizontal. Inimigos brutais, fases intensas do começo ao fim e muito, mas muito sangue. É literalmente o pacote de viagens para a terra do gore e da violência gratuita. Inimigos são despedaçados e agonizam, tripas voam, o pacote completo.
A mudança de um plano 3D (ou semi 3D no caso da Build Engine) para um 2D tem lá as suas vantagens e desvantagens. Há uma maior ênfase em posicionamento de defesas no mapa, mas ao mesmo tempo eu me sentia muito mais limitado do que imaginaria que ficaria.
Das Arenas do reboot de Doom aos mapas gerados aleatoriamente por Shadow Warrior 2, todos tem um traço em comum, a tentativa de controle de um espaço por parte do jogador. Tarefa muitas vezes considerada impossível. Este efeito ocorre com naturalidade a partir do momento em que se tem um grupo de inimigos e um jogador para eliminá-los. Ambos os jogos mencionados se sobressaem em demonstrar com clareza a necessidade de priorização dos inimigos. Butcher mostra traços disto, mas nunca vai a fundo.
Minha experiência era “Ok, estou em uma sala, tenho o inimigo A, B, C, e.… pera, cadê o D? Ah, ele não está na tela e não tenho a menor ideia de quando ele vai me atacar”. É a mesma falha cometida em Hotline Miami 2, não que o jogador precise ter controle da situação, mas ele necessita ter a imaginação de que tem uma chance.
Os problemas para tal ocorrência são imensos em Butcher, uma falha de comunicação por meio da palheta de cores que mescla cenário com os personagens, a movimentação da câmera que teima em balançar a cada disparo para dar uma sensação de “impacto”. A lista só aumenta à medida que os capítulos avançam.
Ele quer misturar ação e um combate frenético sem ter o devido polimento de cada. Para pular, por exemplo, você precisa usar o W ao invés da barra de espaço. Sim, é possível alterar as teclas, mas a confusão mental que isto traz já é algo problemático e a mudança não aprimora a experiência.
As armas também, como comentei, são outro problema. Existe esta noção de que quanto mais “intensa” a ação na tela, mais poderosa é a sensação de usar uma arma e isto não é necessariamente verdade. Butcher já estabelece o “diálogo”, a interação com o inimigo no momento em que você vê as tripas voarem pelo mapa e ensanguentarem tudo.
Eu quando peguei a espingarda e dei o primeiro tiro já pensei “uau, este negócio é potente”. Mas, não, vamos colocar a tela balançando com a tentativa de causar ainda mais a sensação de impacto. Agora temos um jogo que quer ser frenético, cobrar uma ótima mira do jogador e ainda que pareça ambientado em um veleiro em meio a uma tempestade.
A falha aqui está na falta de um ponto de referência confiável. Pegue Hotline Miami como mencionei antes, o personagem é sempre o ponto de referência da câmera, em Doom a mira é o ponto de referência que você tem para eliminar os inimigos. Aqui, são as salas. Não há como você prever para onde a câmera vai apontar no momento que alterar a trajetória. Creio que já esteja cansado de ver aqueles filmes com cenas de ação que parecem mais confusas do que deveriam ser, agora visualize isto transposto para um jogo.
É um componente frustrante, pois já temos uma vasta seleção de inimigos (para a duração do jogo), que dão variedade o suficiente para lidar com a interação jogador-ambiente de maneira eficaz. Personagens que te atacam com um taco, um homem que usa lança chamas, veículos, etc. Você já tem um funcionamento preestabelecido de condições para que o jogador se sinta em um local hostil. Se removêssemos esse elemento de “intensidade” teríamos um jogo mais polido.
A outra grande questão é o layout das fases em si. Curtas por natureza, me questiono da necessidade do uso de “arenas”. Neste caso eu sinto uma crise de identidade em Butcher, de estender a duração por meio de “arenas de combate” — tipicamente salas onde o jogador fica preso até eliminar todos os inimigos — e não aproveitar da mecânica base para ir além disso.
Fora destas áreas o jogo é severamente linear, com apenas alguns segredos por mapa. O máximo de interação que você tem é justamente abrir as portas para entrar nas tais arenas. Torna-se exaustivo já no segundo capítulo, pois, mais uma vez, ele não é capaz de enxergar o potencial que carrega.
Pegar a “ideia” ou a noção de o que é uma franquia e adaptar a sua visão nem sempre tem um bom resultado. Não é a primeira vez que eu vejo isto e certamente não será a última. Sem desmerecer os esforços da TransHuman Design, pois Butcher ainda acerta em muitas coisas, como a arte, animação, trilha sonora, só não consegue unir o restante das peças de forma que entregue uma experiência prazerosa.
Ainda é uma boa opção para quem quer explodir monstros, ver violência gratuita ou só quer ter a tela encharcada de sangue ao ponto de se questionar se você derrubou ketchup na mesa. Mas, em 2016, com tantos shooters que acertam o alvo que almejam, eu me vejo menos inclinado a jogar mais de Butcher.
Butcher
Total - 5.5
5.5
Estética e trilha sonora que estão presas a um jogo que não soube usar seu potencial por completo. Sangue aos montes, dificuldade artificial aos montes e um design de mapas que super-simplifica a navegação e se prende demais em arenas para criar tensão. Bom, ao menos ver o sangue espalhado na tela é satisfatório.