Eu gosto de pensar em como uma desenvolvedora planeja um DLC. Será que eles se focam em uma área específica, em melhorar pontos criticados pela comunidade? Para “Age of Wonders 4: Primal Fury” (Steam / PlayStation / Xbox) eu imagino que tenha sido “E se nós corrigíssemos alguns dos problemas cruciais do jogo, mas também tornássemos a natureza extremamente poderosa?”. Isso não é necessariamente uma crítica.
Dos DLCs lançados até agora, “Primal Fury” é o primeiro para o game de estratégia 4X da Triumph Studios que é um mero pacote de conteúdo. Ou seja, ele não adiciona mais nada do que duas novas raças (lupinos e bodes), novas unidades, uma cultura, e vem aliado a uma grande atualização. Todavia, dizer que é um mero pacote de conteúdo é desmerecer demais o trabalho da desenvolvedora.
O principal atrativo do DLC é a cultura “Primal”, que dá nome ao próprio. Embora já houvesse culturas com mais enfoque no aspecto “natureza” em “Age of Wonders”, a nova cultura vai muito além, não só com unidades bem delineadas sobre em que tipo de terreno elas são melhores no combate, mas também pela introdução das “primal beasts”.
As “Primal Beasts” são “divindades” que a sua cultura venera e que até certo ponto definem o seu estilo de jogo. De crocodilos a aranhas, cada uma dessas divindades possui características tão distintas que irão definir o seu estilo de jogo por praticamente o restante da partida.
Este é talvez o sistema mais “rígido” que a Triumph Studios já colocou em “Age of Wonders 4”. Se você quer ter melhor movimentação em pântanos ou em áreas com florestas densas, ter uma divindade crocodilo não é uma má ideia. Cultuar uma aranha te dá bônus imensos ao construir cidades no subterrâneo. Ainda que penalidades não sejam aplicadas a outros tipos de terrenos, é uma escolha que de início considerei peculiar.
A jogada de mestre da Triumph é aproveitar o sistema de quests que já está presente em “Age of Wonders 4” para fazer o jogador sair da sua zona de conforto. Em suma, ao escolher uma divindade você tem acesso a uma cadeia de quests que envolvem destruir áreas específicas do mapa e construir templos para as divindades — péssima notícia para quem gosta de jogar “Tall” no 4X.
Infelizmente, a ideia é mais interessante do que a implementação em si. As quests são praticamente idênticas, independente da divindade que você escolher. Eu não sei se fui eu que dei azar nos mais de cinco mapas que eu testei, mas o evento começa no primeiro turno com você recebendo o objetivo de “explorar uma caverna” ou algo similar e depois construir torres para as divindades. Se não fosse pelas excelentes recompensas, eu teria feito essa quest uma vez e nunca mais.
Agora, quando você as completa, você não só tem a chance de invocar essa divindade durante o combate (por um custo altíssimo de mana) como também pode equipar suas unidades com montarias temáticas que ganham ainda mais bônus de movimentação e ataque.
Se você achou que uma cultura com enfoque em natureza e muitos modificadores de movimento e ataque eram demais, você ainda não viu nada, caro leitor. “Primal Fury” adiciona um dos tomos de magia mais absurdos que já vi em “Age of Wonders 4”: Tome of Fey Mists.
O novo tomo de tier 2 vem com habilidades que criam névoas dentro e fora do campo de batalha que causam um debuff imenso nas unidades inimigas, mas um buff imenso para as suas unidades. Se você achava que usar tomos com o tema natureza já era “desbalanceado” — um ponto de tensão na comunidade de “Age of Wonders 4” — as coisas só pioram com “Primal Fury”.
Eu vejo como uma magia muito situacional, dado o seu alto custo de mana. O tomo pode ser tier 2, mas manter várias névoas no entorno de cidades tem um custo de manutenção tão alto que só os jogadores que possuem uma boa reserva e geração de mana irão conseguir. Isto é, se você não estiver jogando contra a IA.
Infelizmente a IA não entendeu muito bem como funciona a névoa, e ao invés de tentar enfrentá-la, ela passa turnos e mais turnos dando voltas nela para tentar te “emboscar”. O resultado que eu vi até então foram turnos longos criando uma força gigantesca para atacar o inimigo e acabar com ele de vez. De certa forma eu já fazia isso em “Age of Wonders 4”, mas “Primal Fury” destaca ainda mais as situações em que a IA deixa a desejar.
Se você está do outro lado da moeda, ao jogar como os Industrious — outra cultura que a comunidade considera desbalanceada — você pode muito bem segurar a barra dos debuffs da névoa e sair vitorioso. Uma coisa é certa: Adicione a possibilidade de uma cultura primal na sua partida e você terá algum tipo de dor de cabeça, mas aquela dor de cabeça que é gostosa de se ter.
A própria Triumph está ciente das dificuldades de equilibrar a IA quando tantas variáveis estão em jogos; a atualização (Wolf) que acompanha “Primal Fury” vem com um sistema de recompensa que faz com que a IA tente enfrentar não só as névoas, mas inimigos mais poderosos se for recompensada em ouro. O sistema me lembra bastante o de “Total War”, porém mais bem implementado. Foram pouquíssimas as vezes em que eu vi a IA não ser agressiva quando uma recompensa está em jogo.
E, como alguém com mais experiência em jogos de estratégia — sejam eles em tempo real, 4X ou em turnos — IA sempre vai ser um tema complicado, assim como balanceamento de unidades e culturas. Com isso dito, acredito que a Triumph Studios fez mais uma vez um trabalho fenomenal com “Primal Fury”.
O DLC é excelente em todas as frentes, das novas culturas às melhorias trazidas gratuitamente pela atualização Wolf. Ele mais do que atendeu às minhas expectativas em termos de novas estratégias, e não tenho dúvidas de que vai atender àqueles que preferem seguir uma linha mais voltada para o roleplay.
Até agora a desenvolvedora acertou em cheio em todos os DLCs, e é bizarro imaginar que o primeiro deles já permite você ser um dragão. Minhas expectativas para o último DLC, “Eldritch Realms”, estão altíssimas.
Age of Wonders 4: Primal Fury
Total - 9.5
9.5
Questões de IA e alguns eventos repetitivos à parte, “Primal Fury” é mais uma excepcional adição ao repertório de “Age of Wonders 4”, esteja você interessado de um ponto de vista de roleplay, ou em mais opções estratégicas para as suas partidas. A Triumph, mais uma vez, mostra que é uma desenvolvedora sem igual.