Se você tivesse me convencido no começo do período de acesso antecipado de “Achilles: Legend Untold” (Steam) que ele se tornaria um jogo competente, eu iria rir. União de elementos de Diablo com Souls-like, quando isso dá certo? Céus, eu tenho dificuldade de achar um souls-like que dê certo! Mas a equipe da Dark Point Games quase fez dar certo… quase.
O jogo começa com Aquiles durante uma invasão noturna a Troia, onde ele é emboscado e derrotado por Hector. Se você espera que a narrativa tenha alguma proximidade com a Ilíada, deixe essa esperança de lado. Grande parte da trama serve como um pano de fundo para levar Aquiles para um limbo entre os vivos e os mortos.
Neste limbo ele acorda 10 anos após a guerra de Tróia e sem memória alguma do que aconteceu. Por que os Gregos, que o adoravam, agora o atacam? Por que há escorpiões gigantes, esqueletos e ogros? Algumas dessas perguntas são respondidas ao longo da campanha que dura mais de 20h, outras eu posso apenas presumir que devem ser respondidas com “É um jogo e precisamos de mais variedade de inimigos”.
Ainda bem que a Dark Point Games notou que “Achilles: Legend Untold” precisava de mais inimigos; a versão de acesso antecipado era repetitiva até dizer chega. Eu entrava em uma área nova e lá vinha a mesma legião de esqueletos que eu eliminei três horas atrás. A versão final do game ao menos oferece esqueletos e soldados, ou outro misto de unidades que vão te enlouquecer com a dificuldade, os números ou a deficiência do sistema de combate.
Quando eu falo que “Achilles: Legends Untold” é um misto de Diablo com Souls-like, a desenvolvedora optou por abraçar mais a visão isométrica, uma quantidade absurda de inimigos e só uma leve pitada de loot. Não espere eliminar um chefão ou completar uma side-quest e receber uma chuva de novas armas. Pelo contrário, encontrar armas é esporádico – armas que de fato são úteis, ainda mais.
O que prejudica o sistema é que um souls-like, que tende a ter uma cadência de combate mais “lenta” do que outros tipos de action RPGs, não se integra muito bem com a proposta de “Achilles: Legend Untold”. Travar a mira nos inimigos é mais difícil do que deveria, e o jogo possui todas as mecânicas que você espera de um souls-like – como lentidão ao usar certos itens ou ataques lentos, mas devastadores. Agora imagine ter que lidar com essa lentidão quando você está sendo atacado por cinco lobos ao mesmo tempo e escapar dos seus ataques letais vai além de uma questão de precisão, eles são simplesmente rápidos demais para você desviar de todos a tempo.
Como se já não bastasse, o combate em si não dá muito “feedback” para o jogador. Às vezes não tinha certeza se consegui desviar do ataque de um inimigo por conta de uma esquiva precisa ou porque o ataque dele não conectou. Outras vezes, atacava inimigos e minha espada sequer tinha algum efeito.
Todos esses problemas são facilmente corrigidos em futuras atualizações, o que eu espero muito que a Dark Point Games faça. O que não é, no entanto, é como a desenvolvedora tentou distribuir o estilo “Diablo” e “Dark Souls” de “Achilles: Legends Untold”.
Se dependesse de mim, eu o chamaria de um souls-like isométrico acima de tudo, já que a densidade de inimigos e o uso de waypoints para pular de área em área pelo mapa são as únicas indicações de um “DNA” do jogo da Blizzard. Compare com, por exemplo, NioH 1 e 2 que deitam e rolam em diferentes tipos de atributos, um sistema de progressão denso e complexo. Em “Achilles: Legens Untold” o máximo que você vai fazer é desbloquear novas habilidades de que nem sempre são úteis e subir de nível para incrementos patéticos para seus atributos. Você gosta de eliminar dezenas de inimigos, receber um ponto de habilidade e usar para aumentar a sua força em… um ponto? Você consegue imaginar a diferença entre 649 de dano e 650 de dano? Pois é.
As próprias armas do jogo não se importam muito com esse quesito, com a maioria delas tendo atributos como “ataca melhor se você tem X pontos em vitalidade ou força”. Mas, a realidade é que, basta usar qualquer tipo de buff temporário (veneno, fogo) que você vai ter muito mais chances de sobreviver contra inimigos mais fortes.
Ao menos tenho que apontar a transparência da Dark Point Games, a própria desenvolvedora apontou no período de acesso antecipado que tinha praticamente refeito a história do jogo e muitas áreas foram mudadas de lugar, alteradas para um ritmo mais “sadio” em termos de progressão. Mas, que progressão é essa? Eu não sentia vontade de fazer as quests secundárias ou muito menos avançar na quest principal. Criar uma build para uma segunda partida? Nem em sonho, o jogo não oferece tantos elementos distintos para isso.
Eu acho uma pena que “Achilles: Legends Untold” tenha saído no estado lastimável que saiu. Há um esforço notável por parte da Dark Point Games em criar uma ambientação fantástica – e ela consegue isso com uma surpreendente qualidade. As dungeons, sejam templos ou catacumbas, possuem uma iluminação soberba e são de longe os pontos altos da minha partida.
Mas, é mais um caso de uma desenvolvedora que foi demais para um lado visual do que o lado de jogabilidade. Como um primeiro projeto de uma equipe tão pequena, eu consideraria um gigantesco sucesso. Mas, em um ano tão recheado de lançamentos como 2023, infelizmente não basta só ter visuais bonitos e um sistema de combate aceitável para ganhar destaque.
“Achilles: Legends Untold” precisava ter ficado muito mais tempo no forno, ter passado por testes mais rigorosos em relação ao combate o ao menos ter uma maior versatilidade em termos de builds. É inaceitável que um jogo que se diz um “souls-like” me ter uma distribuição de atributos mais próxima de “Elder Scrolls V: Skyrim” do que “Dark Souls”.
Eu tenho fé de que muitas das minhas críticas venham – como disse acima – cedo ou tarde serem corrigidas por uma atualização. Estou muito mais do que disposto a dar mais uma chance a “Achilles: Legends Untold”, ainda mais por não ter jogado o modo co-op dele.
Mas, por hora, eu prefiro que Aquiles fique apenas na história, e o jogo, engavetado na biblioteca. Há outros “souls-likes”, isométricos ou não, que merecem muito mais a sua atenção do que “Achilles: Legends Untold”. Se este cenário mudar, não tenha dúvidas que eu serei o primeiro a avisar.
Achilles: Legends Untold
Total - 5
5
“Achilles: Legends Untold” mostra o esforço de uma pequena equipe em criar um jogo muito além do escopo que ela própria é capaz. E, embora ela se sobressaia no departamento visual, a combinação “Diablo” com souls-like deixa bastante a desejar, tanto em termos de itemização quanto no combate. Torço para que atualizações melhorem isso, mas por ora, passe longe.