Por onde começar com você, Warhammer 40K: Dawn of War III? Anos de espera, expectativa lá em cima. Aos trancos e barrancos a Relic já havia transformados algumas de suas franquias um game fraco para algo sensacional. Claramente Isso não ia se repetir, certo? Errado. O game está disponível para PC a partir de R$105,99.
Dawn of War III estabelece sua base a partir da maior ênfase em heróis de Dawn of War II e um pouco do sistema de construção de bases de Company of Heroes, mas nunca consegue juntar esses dois elementos de forma coesa. A ideia parece ser capturar a mesma sensação que o primeiro Dawn of War passava, a construção de bases, a estrutura épica e em parte ele consegue isso.
A campanha, dividida em 17 missões e alternada entre uma das três facções — Space Marines, Orks e Eldar — tem os ingredientes de jogabilidade para se tornarem épicas. Os mapas são interessantes, bem estruturados, alguns objetivos se sobressaem. Mecanicamente cada facção funciona de maneira consideravelmente diferente uma da outra. Os Space Marines são a típica “facção para iniciantes” com um considerável “crowd control”, uso de unidades tradicionais e mais próxima dos humanoides possível.
Quem rouba o show, ironicamente, são os Orks e os Eldar. Os Orks utilizam uma mecânica chamada Scrap para melhorar as armaduras dos seus personagens e as torres WAAAAGH para aumentar o poder de ataque e defesa. Já os Eldar possuem a capacidade de teleportar estruturas que dão bônus de ataque e velocidade em todo o mapa. No papel são facções incrivelmente interessantes onde os jogadores vão demorar para conhecer a granularidade das suas forças e fraquezas. Isto é, se não fossem por dois problemas gravíssimos, tanto na campanha como no modo online.
A constante alternância entre as facções na campanha, um modo de jogo que julgo crucial para o aprendizado, faz com que tudo pareça “apressado”. Uma hora você está aprendendo como jogar com os Eldar, no segundo seguinte, Orks, depois Space Marines. Nem a presença de Gabriel Angelos e Farseer Macha conseguem salvar o que pode ser considerada uma campanha não só fraca de narrativa, mas também na estrutura. Certas missões se sobressaem, infelizmente não o suficiente para dizer que vale a pena uma jogada. A história não vai a lugar algum, e nem mesmo os trejeitos e exageros do universo Warhammer 40k conseguem sustentar o que pode ser melhor explicado como “Vamos colocar os heróis favoritos do pessoal para eles irem à loucura. ” Ainda bem que Homeworld: Deserts of Kharak existe para saciar a vontade de uma campanha competente.
O jeito é bater de cara contra a parede e aprender a jogá-lo propriamente pelo multiplayer. Não é incomum, afinal, todo jogador de estratégia passou por isto, não é mesmo? Bem, no caso de Dawn of War III é um pouco mais complicado. O game dá a famosa “chupinhada” do sistema de doutrinas — funções passivas que aumentam a eficácia de unidades ou estruturas — baseado no sistema de Company of Heroes 2 com um pequeno adendo, as doutrinas liberadas estão atreladas ao nível de experiência dos personagens Elite. Cada facção tem três elites iniciais que incluem Gabriel Angelos, Kill Team Ironmaw, Imperial Knight Solaria, WarbossGorgutz, Beauty da Morkanaut, Stormboyz, Farseer Macha, Striking Scorpions, Wraithknight Taldeer, e outros 18 desbloqueáveis. São os níveis deles que definem quais doutrinas, compradas com “Skulls” — moedas obtidas ao subir de nível ou completar uma missão na campanha — que podem ser usadas nas partidas online.
Já começa com o pé esquerdo pelo simples fato de que a quantidade de experiência e skulls recebidas é tão ridiculamente baixo que a própria comunidade criou mapas personalizados puramente para realizar “grind” e subir de nível mais rápido. Duas partidas de uma campanha no modo normal equivalem a cerca de 400 a 500 skulls. Isto é o suficiente para comprar um elite de nível 1 (200 skulls) e meia dúzia de doutrinas (50 skulls por doutrina). É uma situação alarmante, pois não se trata de uma vala, mas sim de um abismo de disparidade entre alguém que investiu poucas horas e outro que optou por jogar a campanha. Habilidade torna-se um ponto secundário, jogado ao relento como se não importasse.
O próprio sistema de doutrinas aplicado em Dawn of War III é contra produtivo pelo fato ele quer que você faça uma escolha considerável antes mesmo de reconhecer o seu oponente e muitas doutrinas são deliberadamente mais forte do que outras. Na primeira semana do lançamento, a doutrina mais usada pelos Space Marines de acordo com a Relic foi a opção de curar as unidades com os Listening Posts — edificações construídas sobre victory points no mapa. A vantagem em early game é exorbitante por conta da não necessidade de recuar as tropas. Ao menos em Company of Heroes era possível escolher um de três generais e usar suas habilidades além das doutrinas pré-definidas antes da partida. Com isto, por mais desvantagem que se encontrava, existia uma chance grande de você virar a partida com o uso de habilidades específicas e o micro gerenciamento de unidades.
Dawn of War III torna o micro gerenciamento de unidades não somente mais irritante, como menos relevante. Unidades básicas como os Tactical Marines viram massa de manobra ao serem obliterados por unidades Elite, que somente com um enfoque completo nelas conseguem ser devidamente destruídas.
No topo disso tudo há o sistema de Escalation Phases, que alteram a cada dez minutos. Ao contrário do excelente sistema implementado pela Eugen em Steel Division: Normandy 44, onde elas determinam o posicionamento das unidades no mapa, as Escalation Phases mais parecem funcionar para evitar o rush de unidades poderosas. Com um total de quatro fases, cada uma delas aumenta a quantidade de pontos de vida de certas estruturas e retornam por volta de 25% ou mais do valor gasto em uma unidade. O sistema só reforça ainda mais o fato que a infantaria se torna quase inútil em mid para late game. Até faria sentido no caso de soldados como a Imperial Guard, que desde Dawn of War é Dawn of War, são a infantaria mais básica e dispensável da franquia. Mas, não. Assault Squads viram obsoletas, o foco se volta para unidades poderosas e, mais uma vez, as unidades Elite.
Nem tudo, porém, está perdido. As diferentes táticas dos Eldar e dos Orks conseguem se manter muito mais relevantes ao longo de uma partida de quarenta ou cinquenta minutos de Dawn of War III do que as dos defensores da humanidade e protetores do imperador. Por outro lado, dado a natureza da necessidade de destruir completamente a base do inimigo, gera-se um atrito desnecessário.
A adição de elementos superficiais de um MOBA, como torres de proteção para base não é uma ideia ruim no papel, apenas estende as partidas ao ponto da frustração. São dois ou mais exércitos que jogam todo o poderio bélico em cima de estruturas poderosíssimas para ter a mínima chance de vencer. Torna uma partida 1vs1 intragável, irritante, estressante.
Some o conceito mais tático aplicado tanto em Dawn of War II como em Company of Heroes. Flancos existem apenas para a captura de pontos de vitória — usados para obter matéria prima e energia para a construção de unidades. O caminho para a base é um só e é bom você estar preparado para isto.
De um ponto de vista macro, Dawn of War III tem seus melhores momentos em partidas entre quatro ou seis jogadores, justamente onde a quantidade anêmica de apenas oito mapas no lançamento faz as mecânicas serem menos irritantes. As doutrinas têm menos importância, a maior quantidade de unidades torna a dinâmica do mapa mais relevante, os Elites ganham menos enfoque devido as maiores oportunidades de eliminá-los e destruir a base do oponente, mais revigorante.
Para um jogo ter de mitigar as suas principais mecânicas e diferenciais em modos de jogo nem sempre abraçados pela comunidade é o testamento de que algo está bastante equivocado. Não nego que o espetáculo visual das partidas é algo impressionante, mas sob um olhar mais atento, é perceptível que tudo o que o jogador faz boa parte do tempo é construir unidades e jogá-las para o campo de batalha como pedaços de carne em um triturador.
Como a cereja no topo de um bolo de estrume, Dawn of War III não permite que os atalhos do teclado sejam alterados e ainda requer uma conexão online constante. Está no meio de uma missão e perdeu a conexão com a internet? Que pena, aquelas skulls e pontos de experiência que você supostamente ganharia acabaram de ir ralo abaixo.
Estamos em 2017 e isso é completamente inadmissível. Até mesmo Halo Wars 2, claramente feito para consoles, permite que os atalhos sejam alterados. Trata-se de uma questão de acessibilidade, algo que jogos de PC sempre se sobressaíram em relação ao resto. Isso sem contar a terrível interface para escolha de doutrinas, que tira qualquer um do sério de tantos cliques e menus que devem ser abertos para acessar um componente essencial para o jogo de maneira geral.
A franquia Dawn of War sempre foi um laboratório de experiências malucas da Relic. Do tradicional base-building do primeiro game, ao foco em elementos de RPG do segundo e agora essa mistura louca que é o terceiro. Visto aqui é o mesmo caminho tortuoso que também atravessou Company of Heroes 2 no lançamento, que depois de alguns anos — e expansões — transformou-se em algo agradável.
Dawn of War III é o equivalente de Supreme Commander 2, Rise of Nations: Rise of Legends, Act of Aggression e tantos outros. Aumente o espetáculo visual, a quantidade de unidades na tela, prometa batalhas “épicas”. Cedo ou tarde os gráficos vão embora e fica o jogo mecanicamente falho, com sistemas mal trabalhados e decisões de design confusas. Se mostrado ao Deus-Imperador da Humanidade, a sentença seria execução por heresia.
Warhammer 40K: Dawn of War III
Total - 5
5
Independente dos espetáculos visuais, Dawn of War III consegue ser o mais fraco da franquia. Demasiada ênfase em unidades Elite, um sistema de experiência que força o “grind” e aumenta a disparidade das partidas online. No topo disso tudo a campanha fraca e a necessidade de uma conexão online completa o pacote de um dos jogos mais decepcionantes de 2017.