“Lento”, “parado”, “chato”. Termos que facilmente se aplicariam ao ato de assistir uma partida de golfe. Não discordo, ver golfe pela TV é insalubre. O mesmo podia ser dito para jogos de golf, ao menos até o lançamento de The Golf Club em 2014, que adicionou uma nova camada de profundidade ao esporte. A sequência (PC, PlayStation 4, Xbox One), não só duplica a camada, como em grande parte é capaz de reter o legado de um dos melhores exemplos de como criar um jogo de esportes.
Antes de mais nada, deixa eu tirar os pontos críticos da frente: Golfe é um esporte de rico, provavelmente nem eu nem você entraremos em um campo na nossa vida e muito menos teremos dinheiro para comprar um taco, quiçá um set completo.
A impenetrabilidade do esporte no território nacional e global é causa de muita confusão sobre como ele funciona. Superficialmente é “coloque a bolinha no buraco”, mas bem, se for extrair todos os principais elementos de alguns esportes, o mesmo posso aplicar ao basquete. Entretanto, os jogos do gênero sempre souberam estabelecer as táticas e criar os nuances que formam o esporte. Isso raramente acontece com jogos de golfe.
Um botão para definir a força, outro botão para acertar a bolinha. É assim que você provavelmente ouviu falar ou jogou um jogo de golfe. Não tem como não ser monótono. São ações simples, que não evocam sensação por parte do jogador aliadas com um jogo basicamente estático. Desde o primeiro Golf Club a HB Studios optou por uma decisão arriscada, remover qualquer simplicidade das mecânicas. Conceito agora expandido com a sequência.
Não é só “acertar” uma bolinha em The Golf Club 2. É definir a altura onde o taco vai acertá-la, o ângulo, controlar a intensidade com o analógico. Acerte rápido demais e ela pode cair na grama, na areia. Acerte lento demais e o impacto não será o suficiente para que alcance o ponto desejado. Os campos deixam de ser campos, ganham um novo sentido. Um ajuste nas mecânicas que deságua para todo um universo de possibilidades.
Pare, pense, acerte. Pequenos montes agora são vantagens. Os centímetros percorridos pela bola, motivos de vitória. Os segundos após a tacada final dão frio na barriga, te enchem de esperança e as vezes resultam em uma pequena decepção. Quantas vezes não me arrependi de não ter posicionado o alvo um pouco mais para a direita ou para a esquerda.
The Golf Club faz ao mesmo tempo um ótimo e um péssimo trabalho de ensinar os detalhes do Golf. Antes de mais nada ele espera que você tenha no mínimo o prazer de entender como as coisas funcionam. Algumas mecânicas são demasiadamente obtusas e requerem prática contínua. A escolha de um dentre os inúmeros tipos de tacos (que não vou me dar ao trabalho de exemplificar), uma angulação um pouco mais alta é o que divide uma excelente tacada de uma bola no meio do mato. Amo como ele me impulsiona a aprender mais, como ele faz com que esse aprendizado, mesmo que não passe por horas de tutoriais, seja o mais direto possível ao ser — em sua essência — leve.
Já havia proclamado meu amor por jogos de golfe em meu artigo sobre Golf for Workgroups e como ele me ajuda a manter a minha interação com a realidade em dias mais sombrios. The Golf Club 2 não segue o mesmo viés, porém ele me completa de outra forma, pela competição amigável.
É irônico dizer isso vindo de alguém que, se possível, gasta horas em partidas competitivas de estratégia e já perdeu a sua vida em MOBAs, mas há semanas que não existe espaço para a pressão psicológica criada por estes modos. Me recaio para as tabelas de liderança, para definir o meu espaço e garantir a minha sanidade e habilidade. The Golf Club 2 é perfeito para isto com o modo Ghost.
Escolho um campo, adiciono o replay de outros jogadores, coloco uma música agradável, vejo onde posso melhorar, sigo a vida. Sem pressão, sem stress, sem me sentir péssimo por não conseguir acompanhar o ritmo daqueles que já se tornaram “experts” nas tacadas. É muito fácil que minutos se tornem horas. Evitava de inicia-lo na paradinha para o almoço pois sabia que ia me atrasar com qualquer compromisso.
De certa forma, The Golf Club larga pelo caminho toda a camada “extra” que vem inclusa com jogos de esportes na atual “geração”. O modo carreira não é grandes coisas, não tem modos adicionais para comprar “equipamentos com bônus” como MLB 17, e obviamente nada de um Ultimate Team da Electronic Arts. Ele vai direto ao ponto, crie um personagem em questão de minutos, dê um nome e vá aproveitar o seu tempo livre. “Quer um jogo de golfe? Quer uma partida, duas, três? Não tem problema, aqui estão os campos disponíveis”, é isso que eu espero que um jogo de esporte me fale, não me mostre vinte menus antes de sequer cogitar apertar o botão “iniciar”. Não enrole, não me desgaste.
The Golf Club 2 é um jogo aliado a um robusto editor com imensa liberdade e não um pacote que segura a mão do jogador a cada curva. Com todos os campos criados para o antecessor retro compatíveis, eu já tinha uma imensa, absurda seleção (incluindo alguns dos meus favoritos) para aproveitar diretamente no lançamento.
Como projetista de campos, eu certamente sou um ótimo redator, pois criei cada aberração que até me envergonho. A ferramenta criada pela HB Studios não poderia ser mais simples. Um botão para ajustar a dimensão, outro para adicionar obstáculos, refinar arestas, alguns cliques para realizar o upload e pronto. Conto nos dedos as interfaces de edição que são bem desenvolvidas para o uso de um controle, a da HB Studios é uma delas. Perdoem-me, no entanto, aqueles que jogarem os terríveis campos de minha autoria. Por favor, deixem uma nota baixa para que outros não repitam o mesmo erro.
The Golf Club 2 também não é um jogo infalível, e isto vem da pior forma possível, conectividade online. Muito longe de ser um fã dessas decisões de design, eu até entendo de certa forma a necessidade por conta da constante transmissão de dados e inclusão de tabelas de liderança. O que não entra na minha cabeça é deixarem o modo carreira — por mais simples que seja — atrelado a conectividade online e só colocar 18 campos ao jogar em offline. É pedir um prato e descobrir que o final está meio estragado (perdoe a analogias com comidas, um dia eu paro com elas).
É um preço que eu gosto de pagar para ter um excelente jogo de Golf? Não, definitivamente não. Uma necessidade assustadora que me deixa receoso se eu poderei o aproveitar daqui a um, dois ou cinco anos. Elemento contrário a todo o design de The Golf Club 2, que busca permanecer atemporal. Nada de licenciamento, nada de golfistas famosos. Um avatar que é criado pelo jogador e nada mais. Para que se dar ao trabalho de reforçar a noção de atemporalidade se ela se perde em meio a necessidade de um online?
Eu adorei o tempo que eu gastei em The Golf Club 2 e provavelmente vou adorar o tempo que eu ainda vou nos novos campos, em melhorar a minha habilidade e lentamente subir a tabela de liderança. É relaxante, o tipo de coisa que me pego jogando para tirar os pensamentos ruins da cabeça, que me fazem entender melhor um esporte e apreciá-lo. Uma pena que, dado a uma decisão esdrúxula, pode chegar ao fim mais cedo do que eu espero.
The Golf Club 2
Total - 8
8
Um excelente jogo de golfe que não tem medo de adicionar complexidade às tacadas para gerar uma resposta com mais emoção do jogador. Evita enrolação e se foca na jogabilidade acima de tudo. É triste ver que todo o esforço vai quase por água abaixo por uma ridícula necessidade de conexão online.