Desde seu quarto game Resident Evil sofre de uma crise de identidade, que jogo após jogo se via de alguma forma alienando seus fãs. Resident Evil 7 me parecia, de início, seguir a mesma fórmula dos jogos de terror modernos. Felizmente esse não é o caso, e vemos um dos melhores retornos à forma da história dos jogos. Ele está disponível para PC, Xbox One e PlayStation 4, a partir de R$99,00.
RE7 conta a história de Ethan Winters, que três anos após o sumiço de sua esposa, Mia Winters, recebe um e-mail, supostamente dela. Ethan então vai à cidade fictícia Dulvey, em Louisiana, em busca de sua amada, e possivelmente de respostas.
De forma geral, Ethan é como um quadro em branco. Não sabemos muito sobre ele, fala pouco, e em várias cenas, silêncio é escolhido para que o jogador entre ainda mais no personagem. Quem realmente tem o holofote aqui é a família Baker, especialmente o patriarca, Jack Baker. Ao mesmo tempo em que é o responsável por boa parte dos sustos do jogo, também é um dos personagens mais carismáticos de toda a franquia.
A história não é nada em especial comparada ao restante da série, mas o foco mais pessoal a traz de volta as origens. Há um ar mais “realista” que a série havia deixado de lado desde que Chris Redfield começou a dar soco em pedras gigantes.
Similar ao que Doom fez em 2016, Resident Evil 7 olha para o passado para reconhecer o que era importante para a franquia, e com isto apresenta uma das melhores introduções que vimos recentemente. Talvez, até dentro de seu gênero.
A jogabilidade, apesar da mudança para perspectiva em primeira pessoa, (a não ser que você leve em conta a série Chronicles) mais do que nunca segue os aspectos que tornaram a série adorada por tantos, com a organização e combinação de itens no seu inventario, além do retorno de uma relação mais intima entre o jogador e o ambiente.
Apesar desse inventario resultar em diversas idas as salas de descanso, onde também é possível salvar, a sua total remoção ou acesso mais facilitado tornaria irrisório todo o processo de escolher o que levar para a próxima área, além do que, conforme o jogo progride, o acesso as caixas de itens se tornam cada vez mais próximas e abundantes. Inclusive, na maioria das vezes que me vi voltando, foi por sempre querer deixar tudo organizado e perfeito no meu inventario.
Gerenciar o inventário é ainda a base para o sucesso de Resident Evil 7. Com uma simples mecânica o jogo impõe constantes questões sobre o que se deve ou não levar para certos locais. É importante salientar como ele faz com que vejamos cada movimento como um quebra-cabeça dentro de outro. Seria uma chave mais importante do que um kit de cura?
É também uma lição para os jogos de survival lançados ultimamente, que tanto se vangloriam de terem um ótimo sistema de “gerenciamento de necessidades do jogador”. Resident Evil 7 mostra como um sistema minimalista, mas que faz as perguntas corretas, é dezenas de vezes mais impactante.
Outra lição que é devidamente aplicada em Resident Evil 7 é o aprendizado do ambiente. Nos últimos games foi dada importância a uma progressão mais linear. Aqui temos um sistema que dá recompensas para os curiosos tanto com itens com textos, expandindo aquele universo. Aquele ambiente que inicialmente é palco de terror, se torna a casa do próprio jogador.
Essa mesma intimidade ajuda também nas reações do jogador naquele mundo. Apesar de jumpscares ainda serem usados, o foco do terror em Resident Evil 7 é nos sons e no desconhecido. Não dá para contar as vezes que tomei sustos ao arrastar bancos e cadeiras no chão, mesmo que eu já tivesse eliminado os inimigos daquela sala. Naquele contexto, o silencio era meu amigo, e o barulho, meu inimigo.
Na pele de Ethan, em muitos momentos eu me sentia um peixe fora d’água quando envolto naquele mundo de mistério e terror. Isto apresentado que ele reage a certas situações ou manuseia armas. Há um certo tempo entre reajustar a mira após cada disparo, como se fosse a primeira vez de alguém. Uma pequena lembrança do jogo que armas não são garantia de sobrevivência.
Os quebra-cabeças clássicos da série voltam, mas em momento nenhum causam muita dificuldade ou são muito crípticos, e nesse caso, a visão em primeira pessoa adiciona várias novas possibilidades de interação com itens e o ambiente, tornando a exploração algo ainda mais envolvente de se praticar. Espero que a Capcom evolua via DLC, ou quem sabe em uma sequência, a interação do jogador com o ambiente de maneira ainda mais significativa
E por falar em interação, uma das mais interessantes adições à série, são as fitas VHS. Encontradas durante o jogo, elas apresentam, com personagens e contextos diferentes, áreas que estão por vir e perspectivas diferentes para a trama. Umas delas especialmente faz algo maravilhoso mecanicamente, e ainda sim entrelaçado com a história, sem ser de forma gratuita.
Se alguma crítica fosse feita ao jogo, seria uma das escolhas que o jogador deve fazer próximo ao final do jogo, que vejo como algo jogado no último segundo de desenvolvimento, somente para preencher um quadrado de múltiplos finais do jogo, que gera várias incoerências na história, e pune o jogador pela escolha logo de cara.
Se a Capcom errou um pouco no lançamento de Street Fighter 5, acertou em cheio com Resident Evil 7. Uma nova perspectiva com o gostinho do Resident Evil clássico. Após anos, nunca senti tanta expectativa para os seus próximos lançamentos, como me sinto após finaliza-lo.
Resident Evil 7 Biohazard
Total - 9.5
9.5
Tal qual Doom, Resident Evil 7 prova o quão é importante que séries já desgastadas parem para repensar o que realmente é importante para a série, gerando uma jogabilidade focada e um dos elencos mais carismáticos da série. Beijos pro Papa Jack <3