Nostalgia é o mal da humanidade, não é mesmo? Talvez tenha exagerado nesta afirmação, mas certamente é o caso que tive com Cossacks 3, o novo game de estratégia da GSC Game World, disponível no Steam por R$ 36,99.
Não deixe o nome te enganar, Cossacks 3 na realidade é um remake do primeiro jogo da franquia, com todos os seus prós e uma montanha de novos contras. A jogabilidade se retém bem similar àquela que vi em 1999, onde ainda achava a série sensacional. Crie unidades, obtenha recursos e leve os soldados, muitos soldados para batalha. Doze nações, dezenas de possibilidades (para a época). Ah, as vezes a ignorância pode ser uma bênção mesmo.
Infelizmente não estamos mais em 1999 e parece que ninguém avisou a desenvolvedora. É um problema recorrente em jogos de estratégia, o qual já vi com 8-bit Armies (e consequentemente mitigado em 8-bit Hordes), ter a expectativa de que os sistemas aplicados em um jogo de 17 anos atrás ainda são relevantes atualmente.
De fato, o que faz Cossacks ser, bem, Cossacks, ainda está lá. No início de cada partida você deve criar construtores, designá-los a tarefas — como mineração, corte de árvores, obtenção de ouro, carvão, — enquanto começa a planejar o seu exército. Mas esta camada é profundamente insatisfatória atualmente. O loop de ter de cuidar das unidades é chato, cansativo e o jogo não oferece as ferramentas necessárias para fazer isso de uma maneira divertida. Quer descobrir quais minas ainda precisam de melhorias? Boa sorte tendo de clicar uma por uma e aplica-las. Micro gerenciamento de unidades onde não é preciso micro gerenciamento.
Dá a ideia de que todos os pilares que sustentam o design de Cossacks 3 são baseados em gerar micro gerenciamento para criar um senso de profundidade que não existe. O mesmo problema aparece na hora da criação das unidades em si. Com um sistema arbitrário, cada unidade só pode se tornar uma formação a partir do momento em que você ter (tem) 36 unidades da mesma categoria, um drummer e um oficial. Novamente o jogo não te dá ferramentas para facilitar o processo.
Em dado momento, enquanto me ocupava com uma unidade que, por algum motivo, não queria construir uma torre, percebi que um amontoado de soldados estava em frente das Barracks. Como escolheria o oficial dentre eles? Não sabia, não há um botão para transformar os soldados em uma unidade só a não ser que eu tenha de clicar no oficial e escolher tal opção.
Existe uma necessidade para isto? Tenho dificuldades de acreditar que não existe uma maneira mais rápida para isto, ou talvez uma notificação, qualquer coisa que me faça perder menos tempo em nuances e mais na batalha em sim. Se bem que, a batalha em si também não é nada merecedor de prêmios.
Dezesseis anos se passaram e o que eu vejo em Cossacks é algo tão arcaico, tão insubstancial que faz meu estomago revirar. Com as tropas feitas, as colocava em campo de batalha e via serem massacradas sem nenhum retorno que me oferecesse informações sobre como melhor estabelecer controle da zona de combate.
Jogos ambientados no século XVII/XVIII tem sérias dificuldades de estabelecer a metodologia de guerra usada no período, normalmente temos extremos como Scourge of War — que trabalha profundamente o aspecto de moral e realismo histórico — a Napoleon: Total War, que até então foi o que soube melhor lidar com a posição das unidades em batalha, moral e comprimir batalhas que duravam dias em algo palpável.
Cossacks 3 é como botar uma dezena de bonecos diante de um moedor de carne. Vence aquele que tem o melhor exército, a maior quantidade de unidades e nada mais. Não existe tática, não existe nuances que tornam a batalha interessante. Todo o micro gerenciamento da construção da cidade e do próprio recrutamento dos soldados resulta em batalhas tão automáticas que não dão o prazer de serem jogadas.
Como se já não bastasse essa enormidade de problemas, a inteligência artificial consegue ser pior do que eu — e olha que não sou um ótimo jogador de estratégia — no gerenciamento de unidades. Partida atrás de partida as vi tomarem decisões duvidosas, simplesmente pararem de construir soldados e edificações em um dado momento ou não me atacarem. Perdoável caso estivessem na dificuldade mais fácil, entretanto isto acontece mesmo nas dificuldades mais altas.
Nem mesmo os meus camponeses escapavam do problema, ou eles não decidiam coletar recursos, construir uma edificação ou davam voltas em árvores (sério), ao invés de enfiar um machado para obter madeira. Pelo menos serviu para dar algumas risadas do quão terrível é a navegação destas unidades pelo mapa.
Após sofrer o suficiente nas batalhas aleatórias contra a IA, por algum motivo ainda sobrava um resquício de esperança de que a campanha, tão mencionada pela GSC pré-lançamento, fosse ao menos passável. Mais uma vez, errado. Novamente Cossacks 3 segue a escola de “vamos criar batalhas aleatórias, tentar dar algum contexto a elas e fazer com que o jogador extraia alguma diversão dela. ”
A começar pela primeira missão dos Austríacos, que te lembra a cada dois minutos o quão importante é que uma unidade não morra. Perdão enquanto eu verifico meu calendário mais uma vez para me certificar de que estamos em 2016 e que o desgin de missões para jogos de estratégia evoluiu pelo menos um pouco do que “não deixe uma unidade morrer e ataque a estrutura Y”. Agora copie, cole esta metodologia em boa parte das outras missões e pronto. Você tem noção do quão “interessante” é o modo campanha de Cosscacks 3. O ponto alto dela foi tentar desembarcar uma unidade “heroica” e sem querer ao mover o barco ele foi “atropelado”. Não questione como isto aconteceu, apenas que é um fato.
Ei, pelo menos ainda tinha o multiplayer, né? Não, errado. Isto é, a não ser que você crie uma conta e dependa de um servidor proprietário da desenvolvedora para jogá-lo. Nada de suporte ao modo LAN ou conexão direta. A jogabilidade é de 1999, mas a ganância é de 2016. Do pouco que joguei — pois minha paciência já estava prestes a se esgotar a este ponto — o multiplayer varia de bom a terrível. Nos primeiros dias desde o lançamento a instabilidade reinava, reduzida posteriormente com atualizações. Confesso que ainda é um pouco divertido desligar o cérebro e ver unidades serem destroçadas no multiplayer, mas não é bem isso no que eu quero gastar meu tempo.
Cossacks 3 tinha uma oportunidade de voltar com uma jogabilidade refinada, céus, ao menos tentassem implementar algumas das melhorias — como o uso de moral dos exércitos de Cossacks 2 — na sequência. A decisão de manter o estilo idêntico ao primeiro só me traz decepção.
Este é o problema da nostalgia, e de muitos remakes ou homenagens. Tentar recriar um clássico sem entender direito bem o que o tornava um clássico. Não é apenas questão do ritmo, do design ou da jogabilidade, tem de levar em conta o período em que foi lançado. Estabelecer um jogo de estratégia com os moldes do passado atualmente ao menos me fez refletir uma coisa: O gênero definitivamente evoluiu consideravelmente de alguns anos para cá.
Cossacks 3
Total - 5
5
Inúmeras campanhas e países não são o suficiente para compensar a jogabilidade rasa, o sistema de construção desinteressante, exércitos fracos e qualquer semblante de “estratégia” jogado pela janela. Quer um jogo nos moldes de 1999? Vá em frente. Prefiro me manter em jogos que evoluiram destas mecânicas para algo mais atraente.